11.7.06

O OLHAR NATIVO

Quando voltei de Portugal, vejam vocês como são impensáveis determinados desejos, voltei com a nostalgia do pão de lá. O hábito de ter o pão à mesa em todas as refeições somado à delícia que são os pães que lá comemos - é horrível o pão que se encontra no Rio - deixou-me com uma ponta farinácea de tristeza. Eu disse que é horrível o pão que se encontra no Rio e é mesmo. Em São Paulo, por exemplo, terra do meu colossal amigo Pompa, o pão é o que há. Morasse eu em São Paulo e a tal nostalgia da qual falei não me vitimaria.

Feita a introdução, vamos aos fatos.

Tão logo chegamos ao Rio voltando de Lisboa convidamos Betinha e Flavinho para um jantar em nossa casa. Confessando à Betinha minha nostalgia de pão, ela deu-me uma dica para que comêssemos pães com vinho antes do jantar:

- Vá à Brasserie Rosário!

Eu fui.

Antes de entrar na beleza do que me move a escrever-lhes nessa manhã de sol, uma constatação: os pães na Brasserie Rosário são caríssimos, caríssimos, e não chegam à sola dos pés dos pães de Portugal e nem aos calcanhares dos pães da terra do Pompa. Fraquíssimos. O que há ali, na Brasserie Rosário, é pose e apenas pose. O sujeito sai de lá - eu vi - com a bisnaga debaixo do braço como se carregasse um cajado dourado cravejado de brilhantes. Dito isso, em frente.

Em frente, não. Mais uma da Brasserie.

Cheguei ao balcão e disse ao rapaz da padaria (dissesse eu a palavra "padaria" ali dentro referindo-me ao local e eu seria linchado pelos funcionários envenenados pelos proprietários):

- Por favor, eu vou levar duas bisnagas.

Tivesse eu chamado o rapaz de filhodaputa pra baixo e ele não se ofenderia tanto:

- Bisnaga? Bisnaga? - rosnava, o moço.

- Sim. Duas. - disse eu ainda sem perceber o crime que cometia.

- Isso é uma baguete, senhor! Uma baguete! - e dizia esse "baguete" com o "t" dito assim, "tezinho" mudo, sabe como? Um nojo!!!!!

Paguei uma fortuna pelas duas bisnagas e mais uns pães que me pareceram interessantes - tinham, percebi comendo, a textura de um paralelepípedo - e voltei pra Tijuca com uma saudade olímpica dos pães da Panificação Estudantil, mais conhecida como Fenômeno, na esquina da Hadock Lobo com a Almirante Gavião.

Eu ia lhes contar um troço totalmente diferente.

Fica pra amanhã.

Até.

13 comentários:

Anônimo disse...

Hahahaha!
Não acho os pães da Brasserie tão horrorosos assim, mas realmente não se comparam aos da Terrinha!
Aliás, se você descobrir um pão realmente bom no Rio de janeiro, me avise por favor!!!
Beijo grande!

Anônimo disse...

Pão gostoso? Cito o da Escola do Pão... Mas é carinho tbm.

Anônimo disse...

Como diria um refinadíssimo Jessé Gomes da Silva, alcunhado de "Zeca Pagodinho":

"Se você quiser comprar bisnaga/ leva três, mas duas só me paga"

Edu, São Paulo, na minha opinião, só leva vantagem sobre o Rio na culinária (aqui, se a pessoa quiser e for for exótica, pode achar comida neozelandeza de madrugada. Pão bom, então, é mato) e no chope (o Fernandão não concorda. Defende até a morte o chope do Rio. Eu, provavelmente por falta de conhecimento dos melhores butecos cariocas, prefiro o daqui).

Abraço,

Borgonovi

Eduardo Goldenberg disse...

Borgonovi, meu compadre, repara não que eu sou chato mesmo e marco em cima.

A letra do samba do Zeca, que é do Arlindo Cruz e do Beto Sem Braço, é:

"Se você quer comprar: bisnaga
Leva três mas duas só: que paga"


Quase igual ao trecho que você transcreveu. Mas faz diferença.

Feito o chope.

Eu também não tenho amplo conhecimento do chope em São Paulo, mas quer saber? Para decidir qual é o melhor eu nem preciso.

Confio cegamente no Pompa.

E acho que - puxando pela memória - chope mesmo em São Paulo eu só bebi no Pirajá, no Original e no Bar Léo. Não dão nem pra saída.

Daqui do Rio você conhece:

- Adonis?
- Bar Brasil?
- Bar Luiz?
- Estephanio´s?
- Paladino?
- Opus?
- Bar do Adão?

Não?

Então deixa estar. Agenda sua vinda. E você volta dando razão ao homem do qual ninguém ousa discordar: Fernando José Szegeri.

Abraço forte.

Szegeri disse...

Olha, vou meter a minha colher suja pra discutir o chope, que discutir pão não é coisa de butequeiro que se dê ao respeito (saravá, Seu Osório!).

O problema é que o chope é uma bebida viva, como o vinho, importando e influindo demais o chamado "serviço", que vai da chopeira ao formato do copo, passando pela forma correta de se lavar uma e outro. A maneira como se serve o chope sempre foi diferente no Rio e em São Paulo, até uns 5 ou 6 anos atrás, por isso sempre foi difícil comparar. E havia ainda uma difrença enorme: SP tinha uma meia dúzia de lugares pra se tomar um ótimo chope, e mais umas duas dúzias onde se tomava chopes de sofríveis a honestos. Mas sempre "choperias", onde você tem que entrar, sentar, pedir o garçom etc. Eram raríssimos por aqui os chopes "de balcão", acho que só mesmo no Léo. Os grandes bares paulistanos eram, em sua enorme maioria, bares de cerveja, que essa é a nossa maior vocação. No Rio, ao contrário, milhares de lugares pra se tomar chope, centenas de padarias, butiquins de esquina, chope "de balcão" a torto e a direito. E sempre um chope de bom para ótimo. Sem falar nos grandes e tradicionais redutos citados pelo Edu (embora, em minha opinião, desses, pra concorrer com o chope do Léo, pelo menos nos bons tempos, só o Adonis). Em alguns deles, aliás, o chope era mais parecido com o nosso, por força das antigas chopeiras do Luiz e do Bar Brasil, por exemplo. Os chopes do Estephanio's e do Adonis são mais do padrão carioca, mais leve, mais gasoso, mais refrescante. Então, Borgonovi, Edu, Favela, nos quesitos "facilidade", "regularidade", "nota média", o Rio sempre foi absolutamente insuperável, de longe.

Agora, tudo ficou diferente de alguns anos pra cá. Os bares de chope proliferaram em São Paulo. E seguindo um padrão aqui criado e firmado, que tem no Léo o seu expoente, com uma espuma muito mais cremosa. Hoje, abundam os chopes, com uma qualidade normalmente entre boa e muito boa (depois que a Brahma investiu violentamente na padronização do "serviço"), mas os bares também seguiram o padrãozinho chique-babaca-querendo-parecer-despojado que me irrita profundamente (os tais "drinking centers" tão comentados por aqui). Assim como no Rio, que adotam um padrão paulista tanto na apresentação como na maneira de tirar o chope.

A conclusão então é que o padrão paulista, o chope "cremoso", mais encorpado, passou a ser dominante (em boa teoria, o padrão mais capitalista sempre tende a dominar...) nesses bares fajutos da moda. Mas a qualidade do chope é boa, graças à Brahma. Mas ainda no Rio grassam os bons e democráticos chopes "espumantes", nos bares, nas padarias, nos subúrbios. Entre um ou outro "padrão", o gosto é pessoal, e fica difícil comparar, como os citados Adonis e Léo, campeões em suas respectivas categorias. Agora, entre um chope bem tirado e um mequetrefe, independentemente de padrão ou geografia, a escolha é induvidosa.

É o parecer, s.m.j.

Eduardo Goldenberg disse...

Durinho: eu tenho cara de livraria, malandro? No alto à direita, no menu do BUTECO, há um link para o SUBMARINO onde o livro está à venda, pô!

Pompa: como sempre, dando uma aula. É impressionante sua gama de conhecimentos que me achatam como se eu fosse uma formiga diante da maiúscula pata de um elefante. Mas ouso discordar. O chope do Adão anda estupendo. O chope do Bar Brasil não deve nada ao do Adonis. E pro caralho esses bares-de-bosta que passaram a invadir o Rio depois que inventaram que o chope com espuminha à parte é que é bom!

Szegeri disse...

Suspendo o juízo quanto ao Bar Brasil. Depois de uma "querela" lá que quase deu em delegacia, há muitos e muitos anos, nunca mais. Precisamos, aliás, quebrar esse tabu, em homenagem ao patrono de todos os fernandos, em companhia do bom Lobo.

Anônimo disse...

Falha inadmissível não citar o antológico chopp do Amendoeira, incomparável no calor do verão em Maria da Graça.

Eduardo Goldenberg disse...

Guerreira: eu, como você agora, sou da Tijuca. Nem considerei a dica e só por causa do nome. "Escola do Pão"? fora.

Szegeri: idéia mais-que-perfeita, mano. Vou, mesmo, agitar isso. O Fausto vai gostar do troço. Como nós.

Flávio: bela intervenção, é verdade. O que só prova que bar com chope bem tirado aqui no Rio é feito pão em SP, tem em todo canto!

Anônimo disse...

Edu, Fernandão: são 03h da matina, ou horário parecido, e cheguei um tanto bêbado de felicidade pelo atropelo que o timinho da mariginal sem número tomou. De maneira que amanhã (hoje mais tarde) tentarei explicitar minhas impressões(reparem que não são convicções. Aliás, não tenho nem a experiência nem a barriga de vocês para ser convicto de assunto tão fundamental).

Só pra constar: a maioria dos chopes que tomei no Rio pareciam cervejas de copo limpo, com mais espuma. Mas sei, reitero e por isso gosto de ser um franciscano, que pouco conheço dos bons lugares da melhor terra do Brasil.

Abraço.

Borgonovi

Anônimo disse...

Meu pitaco na querela sobre o chope não vale nada simplesmente porque, ao contrário da absoluta maioria dos cariocas, eu prefiro cerveja...

Anônimo disse...

Olha, como boa filha de mineiros que sou, não vivo sem pão! E no Rio de Janeiro quem sabe tudo sobre pães e Clécia Casagrande da Escola do Pão. Rua General Garzon no 1o Lagoa.
Além do café, tipo colonial que é servido aos sábados , domingos e feriados;os pães são vendidos todos os dias no local. Vale a pena conferir!

Eduardo Goldenberg disse...

Danielle: agradeço sua dica, mas pão bom, mesmo, é na padaria Milu na esquina da Hadock Lobo com a Matoso, na gloriosa Tijuca. Não há NENHUMA CHANCE - com a ênfase szegeriana - de eu me despencar para a Lagoa para tomar café colonial... francamente. Até porque pela manhã, geralmente, dedico-me a regar meu pequeno jardim de preconceitos.