Lá em casa éramos três (somos, ainda, com a graças dos deuses, mas refiro-me à tenra infância, por isso o uso do pretérito imperfeito): eu, de 69, Fefê, de 71, e Cristiano, de 75.
Segunda-feira passada, mantendo uma tradição que começou em 1994, lá se vão quatorze anos, desde os tempos em que vacas obesas tentavam, sem êxito, prejudicar meu pasto, houve jantar de gala na casa de papai e mamãe (a Lina, minha cunhada preferida, há de observar, com sarcasmo, que falo "casa de papai e mamãe" e não "casa de mamãe e papai", eis que para ela mantenho doentia relação de idolatria com meu velho).
Lá estávamos eu, minha Sorriso Maracanã, Fefê, Lina, e - evidentemente - papai e mamãe. O jantar foi aquele tradicional deleite de todas as segundas-feiras... Bebericamos um uísque no salão branco, beliscamos uma coisa ou outra, abrimos um portentoso vinho, fizemos o costumeiro e franco brinde, até que fomos à mesa no salão de jantar, onde nos esperava um verdadeiro banquete, comme il faut.
Os jantares lá são - todos - rigorosamente imperdíveis. Digo e repito: a presença dos meus velhos são, para mim, combustível para manutenção dos alicerces tão bem fundados em mim.
Mas vamos ao que interessa, que estou enrolando vocês, confesso.
Após o jantar, enquanto todos decidiam entre as incontáveis opções de sobremesa postas à mesa (sorvete de creme, sorvete de flocos, sorvete napolitano, jujuba, goiabada com queijo e banana com canela) - é sempre assim -, escapei e voltei à prospecção das fotografias - são milhares, milhares! - com minha história pessoal.
E voltei com um tesouro nas mãos.
Antes, preparei o clima e passei a contar, numa espécie de performance improvisada, sobre uma interessante faceta de mamãe.
Crescemos ouvindo mamãe dizer, orgulhosa, principalmente diante das crescentes notícias sobre a violência no mundo:
- Filho meu JAMAIS - esse jamais era dito de maneira ritmada, as duas sílabas bem pronunciadas - pegou num revólver, numa metralhadora de brinquedo! Imagina! Imagina! - falava olhando para o teto da sala diante da TV como se falasse com Deus.
Bastava aparecer um sobrinho, um afilhado, um filho de uma amiga, que fosse, com um inocente revólver de plástico, desses que esguicham água, para mamãe estrilar:
- Mas onde é que vamos parar? Precisa dar uma arma dessas pra criança?!
Às vezes, lembro-me bem disso, mamãe exigia o testemunho de papai:
- Isaac, algum dia algum dos meninos pôs o dedo numa dessas escabrosas armas de brinquedo?
Hoje, tudo faz sentido. Papai nunca a respondeu. Como ele fumava, nessa época, e fumava muito (coisa de três, quatro maços de Shelton Lights por dia), a resposta sempre foi uma longa e demorada expelida de fumaça em anéis intermináveis.
Eis, meus poucos mas fiéis leitores, a foto em tamanho gigante que encontrei, datada de junho de 1972 (tinha eu, portanto, três anos de idade), obra da Companhia Fotográfica Euclydes, com sede na cidade de Lins, em São Paulo (isso devia ser um luxo!):
Peço a quem for do ramo - como meu querido Flavinho, por exemplo - que me diga o que é que tenho nas mãos, no instantâneo acima.Segunda-feira passada, mantendo uma tradição que começou em 1994, lá se vão quatorze anos, desde os tempos em que vacas obesas tentavam, sem êxito, prejudicar meu pasto, houve jantar de gala na casa de papai e mamãe (a Lina, minha cunhada preferida, há de observar, com sarcasmo, que falo "casa de papai e mamãe" e não "casa de mamãe e papai", eis que para ela mantenho doentia relação de idolatria com meu velho).
Lá estávamos eu, minha Sorriso Maracanã, Fefê, Lina, e - evidentemente - papai e mamãe. O jantar foi aquele tradicional deleite de todas as segundas-feiras... Bebericamos um uísque no salão branco, beliscamos uma coisa ou outra, abrimos um portentoso vinho, fizemos o costumeiro e franco brinde, até que fomos à mesa no salão de jantar, onde nos esperava um verdadeiro banquete, comme il faut.
Os jantares lá são - todos - rigorosamente imperdíveis. Digo e repito: a presença dos meus velhos são, para mim, combustível para manutenção dos alicerces tão bem fundados em mim.
Mas vamos ao que interessa, que estou enrolando vocês, confesso.
Após o jantar, enquanto todos decidiam entre as incontáveis opções de sobremesa postas à mesa (sorvete de creme, sorvete de flocos, sorvete napolitano, jujuba, goiabada com queijo e banana com canela) - é sempre assim -, escapei e voltei à prospecção das fotografias - são milhares, milhares! - com minha história pessoal.
E voltei com um tesouro nas mãos.
Antes, preparei o clima e passei a contar, numa espécie de performance improvisada, sobre uma interessante faceta de mamãe.
Crescemos ouvindo mamãe dizer, orgulhosa, principalmente diante das crescentes notícias sobre a violência no mundo:
- Filho meu JAMAIS - esse jamais era dito de maneira ritmada, as duas sílabas bem pronunciadas - pegou num revólver, numa metralhadora de brinquedo! Imagina! Imagina! - falava olhando para o teto da sala diante da TV como se falasse com Deus.
Bastava aparecer um sobrinho, um afilhado, um filho de uma amiga, que fosse, com um inocente revólver de plástico, desses que esguicham água, para mamãe estrilar:
- Mas onde é que vamos parar? Precisa dar uma arma dessas pra criança?!
Às vezes, lembro-me bem disso, mamãe exigia o testemunho de papai:
- Isaac, algum dia algum dos meninos pôs o dedo numa dessas escabrosas armas de brinquedo?
Hoje, tudo faz sentido. Papai nunca a respondeu. Como ele fumava, nessa época, e fumava muito (coisa de três, quatro maços de Shelton Lights por dia), a resposta sempre foi uma longa e demorada expelida de fumaça em anéis intermináveis.
Eis, meus poucos mas fiéis leitores, a foto em tamanho gigante que encontrei, datada de junho de 1972 (tinha eu, portanto, três anos de idade), obra da Companhia Fotográfica Euclydes, com sede na cidade de Lins, em São Paulo (isso devia ser um luxo!):
Ah, sim. Após a exibição da fotografia na segunda-feira, como não havia mais condições de sustentar seu discurso pacifista, mamãe retirou-se da mesa para dar uma ajeitadinha na cozinha e papai riu, de engasgar, durante dez, doze minutos.
Até.
15 comentários:
Porra Du , sacanagem com sua mãe...rsrsrsrsrs e ainda me compromete !!!
A sua cara de empolgação segurando a arma é o que mais impressiona... :-)
Beijos!
aahahahaha!!! amei!!! teu pai é o máximo! adoro as histórias dele.
bj
Edu,
Tive uma metralhadora dessas, tinha um pino em que a gente podia optar entre o som de sirene ou de rajada, ambos horríveis. Tive também um revólver que atirava com um papel impregnado de pólvora. Hoje é politicamente incorreto, e a molecada que não teve armas de brinquedo põe fogo em índio, empregada doméstica, bate em professor...
Um abraço
Coelho
Papai: eu fui (porque sou assim) preciso do início ao fim. Não creio que tenha sacaneado mamãe, não... Não contei da missa, a metade...
Betinha: lembro-me com exatidão do momento... Papai dizia:
- Sorria, Du! Atira! Atira!
E mamãe, com um patuá na mão, rezava e me pedia, em desespero, para largar a arma...
Gigi: acertou em cheio. Meu pai é, definitivamente, o máximo!
Verdade, Coelho, a mais pura verdade... Mamãe só contava essa história para manter a faceta da politicamente correta...
Eu tive uma parecida, era uma metralhadora se não me engano da Trol, mas foi bem antes dessa tua foto. Meus companheiros de brincadeira eram o Oscarzinho (Niemeyer) e o Barbosinha (Lima Sobrinho. Edu, acabei de ligar pro Szegeri e o assunto foram vacas obesas. Ambos ficamos em dúvida, pois até então, quando você se referia ao pasto, não mencionava isso. O que houve? As vacas estão indo muito ao Mc Donald´s?
Suas histórias são sempre muito divertidas e sua família é o máximo. Eu que já perdi pai e mãe sinto muita saudade deles quando leio seus "causos". Beijo.
Quem é você, anônimo, que acaba de ligar para esse portento que é Fernando José Szegeri? Diga-me e lhe respondo detalhadamente.
Perla: ninguém perde pai e mãe. Jamais.
Muitíssimo engraçado o texto. Que foto hilária! Eu também tinha uma "metralha" dessas nos anos 70Edu.Hoje em dia com esse papo de "politicamente correto" acabaram até com os cigarrinhos de chocolate. Vai entender! Um forte abraço!
O que você está segurando é uma cópia estilizada da famosa submetralhadora Thompson, também conhecida como Tommy Gun, ou Chopper, ou Chicago Typewriter.
Era a arma favorita dos mafiosos de Chicago, foi usada na Segunda Guerra Mundial e aparece em muitos filmes. É calibre 45, leva até 100 balas no tambor e dá de 600 a 1200 tiros por minuto. Uma tremenda arma, usada até hoje.
sou anônimo, mas sou limpinho. é que essa tecnologia nova do site não entendi ainda. zé sergio, porra!
Que comentário, Flavinho, que comentário! Finalmente descobri porque é que eu conheci, em Nova Iguaçu, o filho de um colecionador de armas que se chamava Thompson Chopper Typerwriter de Souza Alves. É sério!
beijo
Fraga Jr.: comentários como esse seu deixarão mamãe, tenho certeza, com a consciência infinitamente mais leve.
Flavinho: este talvez seja o mais elucidativo comentário já escrito no BUTECO, fundamental para a compreensão do texto e - mais - verdadeiro complemento indispensável. Troço de gênio.
Simas, meu irmão: dispense o "é sério" ao final de seus comentários. É evidente que é sério, porra! Ou você mente?
Zé Sergio: é bem verdade que sempre usei a expressão "vacas que tentavam, sem êxito (ou em vão), destruir meu pasto", sem fazer qualquer referência à anatomia das quadrúpedes. Mas o fato é que eram, as três, balofas, gordíssimas, obesas, machadianas, cobertas de varizes e com colares de brotoeja, como diria Ele, se é que você me entende. Sacou?
Excelente foto!
Flavinho já pode escrever um "vocêqueépuliça.blogspot.com". Beijo
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