29.2.08

RIO, 443 ANOS AMANHÃ!

Minha mui amada e leal cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro faz anos amanhã, completando 443 anos desde sua fundação, a primeiro de março de 1565. Durante todo o dia, em todos os cantos da cidade, festa pra todos os gostos, de todos os jeitos, reforçando a faceta da mais bonita cidade do mundo, a de abrigar e a de abraçar a todos, cariocas ou não, ainda que seja necessário, em prol de evitarmos uma mudança muito brusca de rumos dessa mesma faceta, estarmos sempre com o regador ao alcance da mão. Pra bom entendedor, meia palavra basta e vamos em frente.

Eu, e penso que seja desnecessário dizer - mas vou dizer, o blog é meu, pô! -, estarei desde cedo de papo com os amigos na livraria do meu coração, a Folha Seca, bebendo uma Brahma estalando de gelada na Toca do Baiacu, beliscando uma coisa ou outra no Casual do Santos ou no Antigamente do Carlinhos, comemorando a graça de ter nascido aqui, de ter crescido aqui e de aqui viver até hoje com intenções arraigadas de tombar por aqui mesmo, que não há melhor lugar pra se viver.

E estarei comemorando não apenas o aniversário da cidade, mas também o aniversário de um carioca maiúsculo que, quando me bateu o telefone ontem, me flagrou já debruçado sobre seu presente:

Gabriel Cavalcante, rua do Ouvidor, 08 de dezembro de 2007

- Meu aniversário no sábado, hein, Edu!

O malandro, que faz anos no dia 04 de março, terça-feira, como bom carioca que é, dribla as horas, faz uma bainha no tempo, manda um acorde dissonante nos sete dias da semana e vai na aba do Rio de Janeiro festejando o aniversário no primeiro de março, na rua que fica a um passo da Primeiro de Março (salve, Salgueiro!), no canto da Ouvidor onde se assenta o poderoso axé que não permite o dobrar de joelhos da aniversariante maior, a cidade-mulher.

A partir do meio-dia, todos, então, à rua do Ouvidor, que a dica é abraçar a cidade ao som do samba e da voz desse rubro-negro também maiúsculo, merecedor do abraço de todos nós por mais um ano de vida.

A festa é deles dois, o presente é nosso.

Até.

28.2.08

AS ELEGANTES ANDORINHAS

Eu não sei se já lhes contei que, quando me casei com a Sorriso Maracanã, passei um bom tempo - vez por outra é necessário um reforço! - fazendo comícios intramuros em prol da Tijuca, bairro onde nasci, cresci, fui criado, e de onde saí, apenas, depois de uma sucessão de escolhas equivocadas, por pouco mais de quatro anos - tempo em que vacas gordas tentaram, sem êxito, destruir meu pasto.

Dani nasceu em Volta Redonda, cidade que se distingue da Tijuca apenas por conta do ar siderúrgico e pesado. Mas quando veio morar no Rio ("na capital", como se diz na cidade do aço), morou em Copacabana, na segunda quadra da praia. Vivia, pois, das delícias que o litoral oferece. Passeios de bicicleta pela orla durante a madrugada, picolés chupados nos banquinhos de cimento no calçadão, luzes feéricas piscando em neon 24h por dia, esses chiquês que a princesinha do mar oferece, decadente há mais de meio século, sem perder a pose do alto de seu salto agulha.

Lembro-me do dia em que eu disse - e estávamos justamente tomando água de côco através de canudinhos no calçadão em frente à Santa Clara:

- Mas vamos morar na Tijuca, né?

Ela teve alta, no São Lucas, na travessa Frederico Pamplona, em Copacabana mesmo, umas cinco ou seis horas depois de submetida a uma bateria de exames que detectaram, pura e simplesmente, uma crise nervosa sem gravidade que o médico, uns noventa anos nas costas, chamou de fanico, receitando chá de camomila três vezes ao dia.

O fato é que em meados de 1999 desembarcávamos, fazendo juras de amor aterno, na gloriosa rua Hadock Lobo, no aprazível apartamento no qual moramos até hoje.

A Dani - preciso fazer a confissão pública -, se de fato não morre de amores seminais pela Tijuca, tem, hoje, extrema e aguda simpatia pelo bairro e pelas incontáveis vantagens (e não cabe, aqui, enumerá-las) que ele oferece.

Ela não se habituou, entretanto, aí sim, às constantes demonstrações de amor que a Tijuca me impele fazer, às constantes emoções que o bairro, seus personagens, suas ruas e travessas, seus morros e seus butecos, seus hábitos e seus cheiros, causam em mim.

Foi como naquele sábado, 12 de janeiro de 2008.

Saí de manhã, como sempre, para passear com nosso vira-latas, o atleta Pepperoni (não entendeu?, clique aqui e leia O PEPPERONI E O SZEGERI!).

Quando voltei, deparei-me com um caminhão de mudanças estacionado no pátio de nosso edifício, o melhor edifício de todo o bairro, indubitavelmente.

12 de janeiro de 2008

Diante da visão do caminhão, velhíssimo, caindos aos pedaços, de onde entravam e saíam, como andorinhas da gaiola, senhores entrados em anos carregando móveis e objetos embalados em caixas de papelão visivelmente reaproveitadas, me comovi.

Subi, fungando, diante de um atônito Pepperoni, peguei minha menina pelas mãos e apontei, do alto da janela, para o caminhão. Ela, mais atônita que o cachorro:

- O que foi?! Mas, o que foi? - tinha acabado de acordar.

- Você já ouviu falar na Fink, na Granero, na Metropolitan, na Transworld, na Speedy Moving, na Duquerne, na Brasil Link?

- Empresas de mudança? Já! Por que?

- Já as viu atuando na zona sul, certo?

- Não lembro, Edu! Por que?!

- Já ouviu falar n´As Elegantes Andorinhas?

- Não...

- Só na Tijuca, meu amor! Só na Tijuca! E desde 1914!

E fiquei, ali, na sala, diante de minha pobre menina, exaltando a beleza e a poesia do nome da empresa, elogiando o vigor físico e a disposição de seus funcionários, a segurança e a firmeza das embalagens fornecidas pela companhia, e jurei, de pés, juntos, que se um dia nos mudarmos, e para a Tijuca, evidentemente, contratarei, pelo preço que me for pedido, sem cotação de preços, As Elegantes Andorinhas.

Até.

27.2.08

O PSOL NO LUGAR ERRADO, DE NOVO

Papelão e tremenda bola fora, esse dos parlamentares do PSOL.

publicado no caderno RIO de O GLOBO de 27 de fevereiro de 2008

Boa parte deles freqüenta quinzenalmente a mais carioca das rodas de samba da cidade, na rua mais carioca da cidade, em frente à livraria mais carioca da cidade, e seguramente sabe que no sábado, primeiro de março, haverá festa pelo aniversário da cidade naquele pedaço sagrado da rua do Ouvidor.

Tsc. Como diria o saudoso Stanislaw, isso deixa para lá.

Com a palavra, se ele quiser, é evidente, o Pequeno Príncipe de Heloísa Helena.

Até.

REGANDO O JARDIM

O homúnculo, justiça seja feita, há muito tempo deixou de cumular de lisonjas os bares de grife que invadiram a cidade. Não por mérito seu, é evidente, mas - especulando - graças à perda de força da abjeta novidade, o que significa fora-da-moda, graças à invasão de novas pragas como, por exemplo, as temakerias (pausa para o vômito) ou graças a uma deliberada guinada voltada para, digamos, um público mais afetado.

publicado no SEGUNDO CADERNO de O GLOBO de 26 de fevereiro de 2008

Regador na mão, reguemos o jardim.

Pra bom entendedor, meia palavra basta.

Até.

26.2.08

DO DOSADOR

* Li todos os jornais de ontem, segunda-feira, um dia depois da eletrizante final da Taça Guanabara, entre Flamengo e Botafogo, uma final à altura da grandiosa história dos dois clubes e do próprio clássico, com direito à vitória na base da virada, gol nos acréscimos, bola na trave no último segundo de jogo no que seria o gol de empate do Botafogo que levaria a disputa para os pênaltis, expulsão de três jogadores, acusações de favorecimento por parte da arbitragem e chilique patético (e penso que inédito!) do time perdedor com renúncia ao vivo, depois do jogo, durante entrevista coletiva, do presidente do time de General Severiano. Nada do que li, nada, com a lucidez, a sobriedade e a coragem do texto RESPEITEM O BOTAFOGO, de meu mano Luiz Antonio Simas, que pode ser lido aqui. Notem vocês, lendo também o que comentou-se na FOTOTECA publicada ontem, aqui, que José Sergio Rocha, querido amigo de Niterói, em visível e acelerado processo de desequlíbrio emocional, urra (quem sabe ler ouvirá os gritos do velho) o slogan costurado na bandeira que ele próprio tremula e que manda, às favas, a lucidez. O querido Bruno Ribeiro, de Campinas, companheiro de calvário de José Sergio Rocha - torce para o Guarani e simpatiza agudamente com o Botafogo -, imediatamente adere à luta-contra-ninguém e esperneia da mesmíssima forma. Ora, ora, meus poucos mas fiéis leitores, permitam-me brevíssima digressão... Ninguém mais passional que eu. Ninguém mais apaixonado. E com relação ao episódio, ao contrário do que pensam os dois jornalistas, penso que a falta de lucidez deveria ter durado exatamente o tempo que durou a falta de lucidez que acometeu Luiz Antonio Simas no instante do apito final. Saiu do estádio, o calvíssimo Simas, esbravejando e dirigindo impropérios impublicáveis a mim e ao Mussa, já que assistimos ao jogo juntos. Anunciou que não iria ao Rio-Brasília, que não beberia conosco em nenhuma hipótese e outras mumunhas. Foi pra casa, reviu os melhores momentos da partida, envergonhou-se do papelão protagonizado pelo time, pela comissão técnica e pelos dirigentes, e juntou-se a nós, uma hora depois, passional como sempre, apaixonado como sempre, mas sem um mísero gesto insano e sem um sinal de inépcia capaz de envergonhá-lo mais à frente.

* Por falar em insanidade e em inépcia, vamos a um fato. Sábado passado, véspera da final de anteontem, houve mais um samba na rua do Ouvidor. A rua não fugia à regra que norteava a cidade e respirava, e transpirava, o clima do Flamengo e Botafogo do dia seguinte. Luiz Antonio Simas, que vestia uma camisa do Botafogo autografada pelo Nilton Santos, foi abordado por um camarada a quem jamais vira e que lhe estendeu a pata:

- Parabéns!

- Por que? - disse o Simão, não percebendo o sorriso de canto de boca que emoldura o focinho de quem não tem caráter (é uma característica indefectível).

- Por ocupar a vaga do Vasco amanhã. Eternos vices... - e deu as costas, a besta humana.

Essa mania insuportável de comemorar a desgraça do adversário ao invés do regozijo puro e simples pela vitória, esse hábito nocivo que planta vítimas fatais a cada jogo (pelo menos um torcedor do Botafogo foi assassinado com quatro tiros depois do jogo), esse troço nojento que é ficar entoando cânticos que se prestam mais ao achincalhe do adversário que à exaltação pela conquista, me fez pensar no seguinte enquanto discutia o tema, na saída do Maracanã, com o Mussa: isso é equivalente a você traçar, num lance em que se misturam talento e sorte, uma tremenda mulher, gostosíssima, casada, e bater o telefone pro corno, segundos depois do coito, a fim de sacanear o pobre-diabo em vez de ficar ali, no silêncio de depois, curtindo a glória do momento.

Até.

25.2.08

FOTOTECA

Eduardo Goldenberg e Henrique Blom, esquina das ruas Martins Pena e Campos Sales, 24 de fevereiro de 2008

Augusto Diniz, Leo Boechat, Alberto Mussa, Rodrigo Ferrari, Henrique Blom, Flavinho e Betinha, Rio-Brasília, 24 de fevereiro de 2008

Alberto Mussa, Leo Boechat e Henrique Blom, Rio-Brasília, 24 de fevereiro de 2008

Candinha e Luiz Antonio Simas, Rio-Brasília, 24 de fevereiro de 2008

21.2.08

A SOBRIEDADE QUE ME FALTA

Dia desses fiz a confissão pública: a ira santa que borbulha em mim não permite que a sobriedade seja a qualidade precípua de meus textos, de meus discursos da tribuna, de meus posicionamentos diante da coletividade. Quero, confessei também, um dia chegar lá.

Em agosto de 2006, diante da notícia do afastamento de Fidel Castro do poder por razões de saúde, escrevi o texto FIDEL CASTRO, que pode ser lido aqui, e que nada mais é do que um libelo de minha paixão, uma de minhas paixões, eis que sou por elas movido graças aos deuses que me permitem ter as condições para cultivá-las e expô-las na vitrine imaginária de mim mesmo.

Somos, agora, um ano e meio depois, surpreendidos pela renúncia do Comandante, gesto que o engrandece ainda mais e que vai na exata contramão da expectativa dos que, como calopsitas ensinadas, diziam, em tom de escárnio, deboche e desrespeito, que Fidel só deixaria o poder (ou largaria o osso, segundo os mais estúpidos) depois de morto.

Sua carta que anuncia a renúncia é mais uma prova de sua grandeza, de sua coragem e de seu desprendimento (os babadores de gravata jamais compreenderão o que é desprendimento), de sua lucidez, de seu carisma e de sua vigilância permanente.

O que se leu nos jornalões brasileiros e o que se leu nos blogs mantidos por pseudo-jornalistas foi de corar de vergonha. Eu lia, incrédulo, as carradas de merda publicada, lia os blogs infestados de bajuladores inábeis e ouvia a voz da minha consciência dizendo:

- Cora! Cora! Cora! Cora de vergonha!

Pois a nossa imprensa, salvo raríssimas exceções, é mesmo de corar de vergonha. Pigarro e vamos em frente.
Quem bem definiu e descobriu a provável razão para a desastrada cobertura da imprensa sobre a renúncia foi meu irmão, vigilante como sempre, Luiz Antonio Simas, que deixou o seguinte comentário no blog do Bruno Ribeiro:

"Brunão, não tinha comentado até agora porque preferi ler os jornais da "grande imprensa" antes de emitir alguma opinião. Reparei algo absolutamente patético: os jornais publicaram materiais que foram visivelmente preparados para a aguardada, e desejada, morte do Comandante. Pegaram o que já estava no forno e publicaram. Essa gente jamais esperaria o gesto de desprendimento e sabedoria do velho revolucionário. Beijo."

Eis então, já que falei no blog do Bruno Ribeiro, o que queria lhes contar e sugerir pra hoje: a leitura de dois textos, sóbrios que só, frios como não consigo ser, escritos justamente pelo Bruno Ribeiro e por meu irmão paulista, Fernando Szegeri.

GRACIAS, COMANDANTE!, que pode ser lido aqui, e JAMAIS ENTENDERÃO, que pode ser lido aqui.

Fernando Szegeri, Bruno Ribeiro, Eduardo Goldenberg e Luiz Antonio Simas, 22 de junho de 2007, São Paulo

Nós quatro, os da foto, erguemos juntos, diante do balcão imaginário, quatro copos longos com bastante gelo e Havana Club, dividindo um Cohiba Robusto, em homenagem a Fidel Castro e ao povo cubano!

Até.

20.2.08

OS METÓDICOS, DE NOVO

Em 20 de abril de 2005 eu publiquei O PIADISTA DE ELEVADOR, que pode ser lido aqui, sobre esse tipo insuportável, irritante, desagradável, repulsivo (leiam que vocês, neófitos no balcão do BUTECO, hão de entender). Em 25 de abril de 2005, cinco dias depois, portanto, publiquei OS METÓDICOS, que pode ser lido aqui, onde trato do detalhismo insuportável que acomete o freqüentador, praticamente um sócio-atleta, dos hortifrutis espalhados pela cidade.

Hoje, 20 de fevereiro de 2008, quase três anos depois, quero lhes contar sobre outros tipos nos quais esbarramos quase que diariamente e que são - é preciso deixar a cartilha do politicamente correto de lado - insuportáveis. Vamos a eles.

Vejam as velhas que vão sozinhas à padaria, ao supermercado, à quitanda. Alguém consegue me explicar a razão pela qual TODAS (com a ênfase szegeriana), ou QUASE TODAS, no instante de pagar a conta, tiram uma bocetinha (boceta - substantivo feminino - 1. caixinha redonda, oval ou oblonga, feita de materiais diversos e usada para guardar pequenos objetos) da bolsa e espalham CENTENAS de moedas sobre o caixa dizendo com aquela máscara comum em direção à pobre funcionária:

- Filha, me ajuda?

E os freqüentadores de padarias? Por que, meu Deus, por que, dizem as MESMAS frases todos os dias para os pobres balconistas, e sempre com o mesmo sorriso idiota na cara, como se fossem protagonistas e autores de frases e imagens geniais????? Na Padaria Milu ou na Panificação Estudantil, ambas pertinho de casa, a cena se repete diariamente:

- Me veja dois franceses... moreninhos, hein! - e guincha de rir, a velha.

- Pra mim, meia dúzia de queimadinhos de praia! - esse gargalha dando tapinhas no balcão.

A velha, a terceira da fila, diz:

- Muito boa essa!

Quando chega sua vez, diz altaneira:

- Os meus bem clarinhos, tá? - e quase toma uma vaia da fila diante da obviedade do pedido.

E a variedade dos pedidos é de causar náuseas:

- Bege!

- Cróque-cróque...

- Morninho...

- Mulatinho!

E os que não perdem por nada o cafezinho grátis oferecido nos supermercados? Cotoveladas, chutes, atropelos, vale tudo na fila de QUALQUER stand de QUALQUER café em QUALQUER supermercado. Dia desses eu estava no Mundial da rua do Matoso e testemunhei o seguinte diálogo enquanto tentava passar com o carrinho por uma dessas filas.

- Corcel, você não disse que detesta o Café Canaan?

- Cala a boca, Mercedes! De graça eu tomo qualquer merda!

Fina, como se vê, a Dona Corcel. E como ela, basta que se tenha olhos de ver, há milhares espalhadas por aí.

Dia desses volto ao tema, já que esses tipos, insuportáveis - repito - estão em toda a parte.

Na feira então, nem lhes conto!

Conto, sim.

Prometido. Minha próxima incursão na mesma temática será sobre os insuportáveis das feiras livres.

Até.

19.2.08

PRATINHA, O INTERNACIONAL

Vocês hão de me perdoar esse brevíssimo hiato - não escrevo desde sexta-feira passada, o que gerou uma meia dúzia de emails malcriados -, mas ando assoberbado como há muito! Razão pela qual apenas hoje atendo a um pedido patético, convenham, de meu filho mais novo, Tiago Prata. Vou lhes explicar.

Na quinta-feira passada, 14 de fevereiro, publiquei o texto BETINHA, A INTERNACIONAL, leiam aqui, fazendo menção à recente viagem da Betinha às Filipinas com escala em Dubai. Pra quê!?

Serei preciso, como sempre.

Publiquei o texto por volta de uma hora da madrugada daquela quinta-feira, e antes das nove da manhã estrilou meu celular piscando PRATA no visor do aparelho. Eu nem cheguei a dizer o alô protocolar:

- Por que apenas a Betinha é internacional?! Por que? - o tom era de choramingo.

O cérebro ainda fazia as necessárias sinapses para compreender o tom de mágoa do menino, quando ele emendou, fungando:

- Esqueceu que eu passei o reveillón em Buenos Aires? - e bateu com o telefone no gancho imaginário.

Eis que minutos depois eu recebo o email abaixo.

email

Notem, então, que atendo ao pedido - patético, devo repetir - do garoto, numa prova incontestável de que mimo, sem rodeios, minha cria.

E já que ele fez questão de anunciar sua viagem para Buenos Aires, já que ele fez questão de ser taxado, publicamente, de internacional, vou me permitir tecer brevíssimos comentários sobre o destino do menino na passagem do ano.

Antes, porém, brevíssima digressão.

Eu disse um pouco mais acima que o pedido do Prata foi patético. E foi mesmo. Mas trata-se de um meninote, de um garoto recém-chegado aos 21 anos, ainda gozando as delícias dos dez, doze, treze anos de idade.

Não fosse verdade isso, e não seria rotina uma cena como essa.

Tiago Prata dormindo na Folha Seca, 22 de dezembro de 2007

O sujeito entra na Folha Seca, a livraria do meu coração, em pleno sábado, samba armado pra começar às duas da tarde, e a Dani e o Digão, de dentro do balcão, pondo o indicador sobre os lábios, a ponta do dedo sobre a ponta do nariz:

- Shhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh! O Pratinha está dormindo...

Voltemos ao tema.

Tiago Prata foi, então, passar o reveillón em Buenos Aires. E não estava sozinho.

A classe média brasileira, que na década de 60, 70, gostava de arvorar suas viagens para Petrópolis, Teresópolis ou Friburgo como se fosse para os Alpes Suíços (que a Betinha também conhece!), a classe média que comprava casacos de pele, pantufas, gorros, luvas e botas para desfilar diante do Palácio de Cristal, do Dedo de Deus, ou das cachoeirinhas de Friburgo, agora faz de Buenos Aires sua mais nova meca.

Todo mundo - pergunte a quem está do seu lado AGORA! - tem a melhor dica do melhor bife de chorizo de Buenos Aires, todo mundo sabe de cor os endereços de Puerto Madero, todo mundo trata o estádio Bombonera com a intimidade de um Maracanã, de um Parque Antártica, todo mundo volta mastigando alfajores como se os biscoitos fossem testemunhas da infância de cada um, todo mundo volta falando "hola, que tal?", "buenos dias", com a facilidade de uma calopsita bem treinada, e por aí vai.

Resumo da ópera: não deixa de ser internacional, também, como queria, o Prata. Mas a Betinha tem, digamos, mais garbo.

Até.

14.2.08

BETINHA, A INTERNACIONAL

Vocês hão de me perdoar o que poderá lhes soar, a princípio, como adulação e bajulismo, embora seja apenas, a bem da verdade que me persegue da mesma forma que me acompanha a precisão, fruto do enternecimento que causou-me um comentário, feito há pouco, no BUTECO.

Foi feito há pouco, mais precisamente às 23h32min desta quarta-feira, o seguinte comentário no texto DO DOSADOR, escrito em 12 de fevereiro de 2008, que pode ser lido aqui:

"Não acho nada inverossímil a história do romance de domingo na Tijuca. Não é difícil imaginar um cara dizendo isso em um buteco nem uma mulher rindo. Não tenho dúvida que, apesar do susto (ou exatamente por isso) eu riria, mesmo não havendo, obviamente, qualquer chance de romance com um cara que diz uma coisa dessas..."

Referia-se, a comentarista, ao texto ROMANCE DE DOMINGO NA TIJUCA, que pode ser lido aqui, que gerou desconfiança em alguns - peço desculpas desde já pelo adjetivo - incautos.

A comentarista foi a Betinha.

Eu digo que foi a Betinha e me enterneço novamente, não pelo simples fato de que foi a Betinha, e vou tentar ser mais claro.

A Betinha mora no Flamengo, como vocês sabem, com o Flavinho, como já lhes contei em 16 de setembro de 2005, aqui e em 07 de novembro de 2007, aqui, para ficar apenas nestes dois exemplos bastante elucidativos (leiam, pô!).

Mas não me escreveu do Flamengo, a Betinha.

Antes, permitam-me breve digressão.

Quando lhes contei uma história passada no apartamento do casal, no Flamengo, em 16 de setembro de 2005, escrevi:

"(...) a Betinha chegou, há dias, da Suíça, e vejam que nisso, também, reside a escalada do Flavinho, cujas namoradas até então chegavam, no máximo, de Cabo Frio."

Pois bem.

A Betinha acessou o BUTECO, e comentou no BUTECO (!!!!!), diretamente das Filipinas.

Se cravou seu comentário às 23h32min da noite de quarta-feira, significa dizer que o fez às 9h32min da manhã de quinta-feira, 14 de novembro - vejam como ela está loooooooooonge, aqui.

É, indubitavelmente, uma internacional, minha mais-querida, a Betinha, que aparece na foto abaixo com minha Dani, no reveillón 2007/2008, pouco depois da meia-noite.

Dani e Betinha, 31 de dezembro de 2007, Santa Teresa

Convocada às pressas para uma reunião de emergência - vejam se ela não é muito importante -, a Betinha partiu no domingo passado. E, já no sábado, um dia depois de receber a notícia, o Flavinho era um homem em estado de graça.

Estávamos na rua do Ouvidor e ele, eufórico, contava sobre a viagem da mulher.

Eu provocava:

- Mas e aquela namorada sua dos tempos do Cachambi? Não fazia essas viagens?

E ele, erguendo o copo de cerveja:

- Nem pro Jacaré, Edu! Nem pro Jacaré!

Eu insistia:

- E aquela outra que você namorou quando morou em São Paulo?

Ele, vermelho de tanto que ria:

- Jamais atravessou o Tietê!

E brandia as passagens aéreas da Betinha, cheio de orgulho.

Um orgulho como o meu, confesso, por sabê-la com os cotovelos apoiados no balcão imaginário, mesmo de tão longe.

Ergo a caldeireta com quatro dedos de pressão em direção a ela, minha querida amiga de quem tenho, neste exato instante em que escrevo, aguda saudade, para um brinde que somente quem ama é capaz de realizar.

Até.

13.2.08

HOJE É DIA DE MARIA HELENA

Faz anos hoje, oito mais precisamente, essa coisa mais linda, Maria Helena, sobrinha querida, afilhada emprestada, chamego olímpico.

Publico hoje, como homenagem à pequena, o texto PEQUENAS MULHERES, publicado orginalmente em 24 de julho de 2000, quando ela só tinha pouco mais de cinco meses, na revista eletrônica SENTANDO O CACETE, que mantive no ar, durante alguns anos, ao lado de Aldir Blanc, Fernando Toledo, Mariana Blanc, Mauro Rebelo e Mello Menezes.

Maria Helena, 10 de novembro de 2007

"Sexta-feira, 18h, como combinado, estávamos Dani e eu a postos na casa de Magali e Ricardo pra cuidar da pequena Maria Helena até às 8 da manhã de sábado. Os dois, depois de meses de sufoco, iriam passar a noite fora, dormir num motel, algo do gênero, deixando Maria sob nossos cuidados.

O curso, proferido pelo pai, durou das 18h às 21h. Incluía apostilas do Delamare, uma boneca Barbie pra dar realismo ao treinamento, pequeno estojo de primeiros socorros pesando aproximadamente 16 quilos contendo umas 2 dúzias de fraldas de tecido, 5 pacotes de fraldas descartáveis, 2 conjuntos de camisetas pagão, 2 casaquinhos de lã, 4 pares de sapatinhos, 6 pares de meia, toucas, luvas, babadores, óleo Johnson, cotonetes, lenços umedecidos da Turma da Mônica, toalhas com capuz, termômetros, 12 mamadeiras de 240 ml, 12 mamadeiras de 150 ml, 6 mamadeiras de 80 ml, esterilizador de mamadeira, chupetas, prendedores de chupetas, pinça, bebê conforto, funchicória, band-aid, talquinho, diversas mantas, bisnagas de Hypoglós, potinhos coloridos com papinha, água de ameixa, água de laranjeira, água de melissa, chá de jamelão, chocalhos, babá eletrônica e pilhas de reserva, além de um pára-quedas e máscaras de oxigênio para um caso de emergência (eles moram no décimo terceiro andar, e nunca se sabe...). Eu e Dani assistíamos a tudo um tanto quanto horrorizados, e era tarde pra desistir da tarefa.

A mãe chegou somente às 21h15min e tomou, digamos, nosso ponto. Nos entregou duas pranchetas com perguntas básicas, todas acertadas, gabaritamos, tchau, tchau. Da porta do apartamento ao elevador levaram uns 15 minutos. Revisão dos tópicos mais importantes, gritos de "vê lá, heim!", "olha a mamadeira das onze!", "não esqueçam de trocar a fralda depois do cocô", "cuidado", "nada de pizza pra menina"... e pronto. Foram embora em estado de absoluto pânico, demonstrando extremíssima confiança em nosso talento.

Bem que estranhamos quando, menos de meia hora depois, a campainha tocou e uma voz do lado de fora disse "a pizza chegou". Não pedimos pizza nenhuma e acabamos reconhecendo Ricardo, o pai, pelo olho mágico, de capacete vermelho, óculos escuros, uma jaqueta de plástico estranhíssima e uma pizza gigante numa das mãos. Descoberto e denunciado, disse apenas "ela está bem, gente?" e saiu de volta deixando a pizza no corredor.

A apostila apontava: entre onze e onze e sete da noite, Maria Helena acordaria aos berros de fome. Deu onze. Onze e meia. Meia-noite. Nada. Fomos ao quarto e levantamos a tampa do moisés (esse foi o nome que aprendemos). Tampa, sim. De palha, com orifícios para respirar e camadas de filó para evitar ataques de mosquitos. Maria Helena dormia plácida.

Voltamos pra sala. Assitíamos TV com o zumbido da babá eletrônica ao fundo. Quando nos preparávamos para tornar a noite mais quente, o berro. Dani em disparada partiu pro quarto e me mandou pra cozinha preparar a mamadeira M-57, segundo a apostila. Vesti o macacão branco, uma espécie de escafandro asséptico, e iniciei a receita: 120ml de água Perrier, 3 colheres rasas de NAN, uma colher de sopa de água de ameixa, mexer bem com colher de pau virgem, deixar ferver por 48 segundos em fogo médio e pronto. Quando terminei as duas estavam na sala. Maria felicíssima. Um sorriso de doer de bonito. Mamou tudinho, eu orgulhoso. Dani fotografando. O único problema foi que, desrespeitando as regras, fui tocar violão pra menina assim que a mamadeira terminou. A menina fez cocô, arrotou, mamou de novo, fez outro cocô, espirrou e tossiu, e numa birra clássica dos bebês, me obrigou a ficar tocando até às 7h45min quando pai e mãe entraram em casa estarrecidos com a cena. Dani dormia exausta, havia pilhas de fralda no chão, a cozinha estava um pandemônio, e Maria sentada à minha frente, minha garrafa de uísque pela metade entre as suas perninhas, batendo palminha ao final de cada canção, armando um berreiro ao menor sinal de intervalo, meus olhos vermelhos de sono e desespero, feridas nos dedos, e um "que bom que você chegaram", foi tudo o que conseguimos dizer antes de saltar de pára-quedas para o playground do prédio.

Acabou? Não. Porque fomos então buscar Pimentinha, minha cocker spaniel, Milena, minha afilhada, Mariana, minha comadre, Maurício, namorado da Mariana, Igor, o pastor canadense deles, e Henrique, outro sobrinho da Dani, pra um passeio na Lagoa. Semana que vem conto a aventura, mas pra terminar, o acontecimento daquela tarde.

À certa altura, eu, Dani, Mariana e Maurício estávamos tomando um chope às margens da Lagoa, quando vimos Milena vir correndo de longe, braços abertos gritando em direção à Dani... "diiiiiiindaaa!!!!!!"...

Acordei em casa."

Até.

12.2.08

DO DOSADOR

* Escalar um time reserva para jogar um clássico como o Fla X Flu é uma temeridade, e explico. Ambos os times cometeram essa barbaridade, mas o Fluminense manteve Thiago Neves, o titular que acabou fazendo a diferença e três gols na vitória acachapante de 4 x 1. A temeridade, explicava-me Luiz Antonio Simas enquanto assistíamos à partida em meio a doses de maracujá no Rio-Brasília, são as estatísticas:

- Daqui a 100 anos ninguém vai querer saber quantos titulares havia em campo. O 4 x 1 do placar eletrônico brilhará como uma estrela para todo o sempre.

* Falei em Thiago Neves e quero lhes dizer que me pergunto o que pensam os torcedores e os jogadores do Botafogo diante da infeliz declaração do meia das Laranjeiras dando conta de que ele anseia logo pela final da Taça Guanabara, contra o Flamengo. Como assim, se Botafogo e Fluminense jogam no sábado e Flamengo e Vasco no domingo, justamente para decidirem quais serão os finalistas? Vai mal, o garoto.

* Escreveu-me um leitor que pediu anonimato - irei atendê-lo, é evidente - perguntando sobre a veracidade da história que lhes contei ontem, ROMANCE DE DOMINGO NA TIJUCA, aqui. E eu que pensei que já tinha deixado devidamente claro para todos que eu sou, agudamente, preciso do início ao fim.

* Eu ainda não havia comemorado, publicamente, a volta à ativa de meu mano Fernando Szegeri em seu blog SÓ DOI QUANDO EU RIO depois de mais de seis meses de afastamento voluntário. O faço hoje para lhes dizer que eu hei de um dia ter (e quero ter!) a sobriedade para escrever algo tão fundamental como seu texto, publicado ontem, chamado O PERIGO MORA ALÉM, que pode ser lido aqui. Diz tudo o que eu queria dizer, mas - repetindo - com uma sobriedade que eu ainda não conheço.

Até.

11.2.08

ROMANCE DE DOMINGO NA TIJUCA

Domingo, oito e meia da manhã, na esquina forte de Afonso Pena com Pardal Mallet, eu havia acabado de estacionar o carro para ir à feira, ali pertinho, na Vicente Licínio, quando decidi ir ao balcão do Bar do Chico beber uma água com gás para ajustar o pH e preparar a carcaça para o dia que viria. Estava eu de pé, no balcão, e um homem, na casa dos cinqüenta anos, sozinho à mesa, bebia uma dose de Domeq quando ajeitou-se no balcão, a meu lado, uma mulher entre os trinta e cinco e os quarenta anos. Linda, é preciso que se diga. Pediu uma água mineral sem gás, um envelope com dois comprimidos de Engov, e logo depois de tomar o santo remédio pediu uma Brahma e foi se sentar na mesa ao lado do camarada do Domeq. Disse ela, pra ninguém (troço típico em buteco):

- Tô com uma puta dor de cabeça...

E o cara, de primeira:

- Quer dar uma mamada aqui? - e pôs a mão em concha entre as pernas.

Olhei eu, olhou o Chico e olhou a mulher, diante da categoria da abordagem.

Ela disse:

- O quê?!

- É, querida, calma... É pra ver se a tua dor vai pro caralho.

Ela riu de chorar, sentou-se com ele e quando eu voltei da feira os dois não estavam mais lá.

8.2.08

DO DOSADOR

* Amanhã, sábado, 09 de fevereiro, a partir das 14h, a rua do Ouvidor será palco, mais uma vez, de uma roda de samba que já é, de longe, o melhor programa da cidade. Como disse, dia desses, uma mais velha que merece todo o respeito que os sabidos merecem, a quem meu mano Szegeri me apresentou, "festas populares, alegrias do povo, como as festas religiosas, o circo, o mercado, as conversas nas esquinas, as feiras livres, o escambo a céu aberto, as festas de rua, as praças cheias, as cadeiras nos portões, precisam ser constantemente retomadas". A cada roda de samba na Ouvidor, com a rua cheia, com os bares abertos, com os braços dos amigos abertos, com os copos erguidos brindando à graça daquele momento, a vida fica mais bonita. Podem crer nisso.

* Um dos grandes momentos do Carnaval foi, como já lhes contei aqui, a Feijoada da Apuração, na mansão da Manguassônia. Muitos amigos presentes, muita gente querida, mas nada que tenha superado a alegria de reencontrar o João Vitor, hoje com nove anos de idade, (falo dele aqui, quando conto sobre o lançamento de meu livro no Rio), a quem não via há muito tempo graças à vilania de gente que não merece menção.

* Poucos troços foram mais divertidos do que a concentração para o desfile da Boi da Ilha do Governador, que ficou em nono lugar entre as quatorze agremiações que disputaram o Grupo de Acesso B do Rio de Janeiro em 2008. Como lhes contei ontem, também aqui, minha Sorriso Maracanã e meu irmão mais novo, o Cristiano, conseguiram, em cima da hora, duas vagas no carro alegórico abre-alas da escola. E lá fomos nós três para a Presidente Vargas, altura do prédio dos Correios, às duas e meia da manhã. Cristiano para o carnavalesco, assim que chegamos:

- Oi. Eu sou o Cristiano e essa é a Dani. Nossas fantasias?

- Ihhhhh! Ainda não estão prontas, mas estão chegando, já, já.

Faltam duas horas pra escola desfilar. Diante da ausência de notícias, volta o Cristiano:

- E aí? Alguma notícia?

O gênio:

- Olha, meu querido... ficar sem desfilar vocês não vão, tá? Nem que seja com a roupa que vocês estão!

Falta uma hora e meia pro desfile e vem galopando, em nossa direção, o carnavalesco com um saco preto nas mãos:

- As calças chegaram, as calças!

Dani, pela primeira vez se dirigindo ao cara:

- Só as calças? E o resto?

- Paciência, meu amoreco, a gente dá um jeito.

Uma hora pra entrarem na avenida e volta o cara:

- Olha, melhor vocês vestirem mesmo o chapéu da bateria, e... hum... coloca essa camisa, ó! - e estende uma camisa visivelmente de outra fantasia.

A Dani:

- E o sapato? Estou de chinelo!

Ele olhou em volta, correu duas pistas adiante na Presidente Vargas, abaixou-se, meteu a mão numa poça abjeta e voltou com duas alpargatas brancas, imundas e molhadas:

- Veste isso, ó! Melhor que ir de chinelo!

E meu irmão:

- E eu?

- Seu chinelo pelo menos é preto. Combina!

E assim desfilaram os dois no carro abre-alas. Foram descobrir, a menos de dez metros da boca da avenida, que havia uma coreografia para os destaques do carro, que foram aprender somente na Praça da Apoteose.

Como me disse o Simas, que a tudo assistia das frisas, na companhia do Mussa:

- Avante, Boi!

Para que vocês tenham uma noção do espetáculo que foi o desfile do Boi da Ilha, o enredo era sobre o Apocalipse. O primeiro carro representava os Quatro Cavaleiros do Apocalipse. O segundo, um posto de gasolina. O terceiro, uma biblioteca. E o quarto, fechando o desfile, uma gaiola!

* Outra boa coisa desse Carnaval foi a derrocada da Viradouro e, conseqüentemente, dessa mentira forjada que atende pelo nome de Paulo Barros. Catapultado à categoria de gênio do Carnaval (não faz nem cócegas num Fernando Pamplona, num Júlio Matos, numa Maria Augusta, num Joãozinho Trinta), Paulo Barros criou uma comissão de frente formada por personagens de um desenho animado americano (Mr. Freeze, ou algo que o valha), um carro alegórico com Edward Mãos de Tesoura, outro personagem americano, esse do cinema, uma ala de Alien, mais bosta enlatada, e merecia uma sonora vaia da imprensa, se a imprensa fosse séria. Mas para Paulo Barros, só adulação. Com tantos elementos nada brasileiros na avenida, justo na mais famosa festa popular do mundo, ele deveria abandonar o Carnaval e tentar a carreira em Hollywood. Eu aposto que ele não arrumaria nem estágio.

Até.

7.2.08

DO DOSADOR

Chegou ao fim o Carnaval. Vamos, pois, aos devidos comentários, dose a dose, como de praxe.

* Eu e Dani, juntamente com Szegeri e Stê, depois de uma cerveja protocolar no Rio-Brasília, encontramos Simas e Candinha na Praça Afonso Pena pouco antes das oito da manhã, de onde seguimos de metrô para a Cinelândia. No Cordão da Bola Preta, que arrastou meio milhão de pessoas durante a travessia da avenida Rio Branco, e que ganhou de presente o céu azul de sempre que, este ano, aqui no Rio, deu as caras apenas na manhã do sábado, segui a lição de Nei Lopes e vivi a instabilidade que precede o equilíbrio, a transgressão a partir da qual se estabelece a ordem, fui o saber e fui também a estultice, a falta e a pena, o erro e o perdão, a culpa e a remissão, o céu e o inferno, o ir e o voltar, o mal e o bem inerentes a tudo. Por volta de uma tarde encerramos nossa participação no Bola Preta com alguns chopes no Casual, de onde seguimos para o Rio-Brasília, que foi mais restaurante que nunca, no sentido literal da palavra, neste Carnaval. Às cinco tomamos o rumo de uma cachoeira e depois descemos a Haddock Lobo atrás do Cordão Alegria da Tijuca. Em casa, à noite, assisti ao desfile das Escolas de Samba do Grupo de Acesso A - comentários mais adiante.

* Domingo, debaixo de uma chuva que só arrefeceu por volta do meio-dia, o Cordão do Boitatá fez seu tradicional baile na Praça XV, diante da Antiga Sé, do Paço Imperial, do Chafariz de Mestre Valentim, do Arco do Teles, sob as pedras pisadas do cais. Em 2008, duzentos anos depois da chegada da Família Real, o baile ganhou, dentro de mim, proporções indizíveis. Com 99,9% das pessoas fantasiadas, o Cordão do Boitatá é, ano após ano, a certeza de uma grande manhã de domingo. Partimos às 17h para o Rio-Brasília em busca da restauração necessária, fechamos a noite numa espelunca na própria Haddock Lobo, depois de expulsos pelo Joaquim, e mais à noite estava eu diante da TV para acompanhar o primeiro dia do desfile das Escolas de Samba do Grupo Especial, do Salgueiro especialmente.

* Segunda-feira o café da manhã foi prenúncio de mais um grande dia, à base de algumas garrafas de espumante, cerveja e umas doses de Red Label... Depois de derrubarmos uma garrafa de Gold Label oferecida pelo Prata e depois do almoço oferecido pela Lina e pelo Fefê, descemos Santa Teresa, debaixo de muita chuva, em direção à Copacabana para o baile do Rancho Flor do Sereno. A Almirante Gonçalves ficou pequena e em 2009 é preciso levar o Rancho de volta para a praia. Fim de noite no glorioso Galeto Columbia e depois, ó, TV para o segundo e último dia de desfile do Grupo Especial.

* Terça-feira pela manhã, dia em que partiram de volta meus irmãos Szegeri e Stê, partimos, eu e minha menina, de barca, para Niterói. Nosso destino foi o Se Melhorar Afunda, um cordão porreta de bom. Voltamos já quase no final do dia, demos um passeio pela Rio Branco, tomamos o metrô e o Galeto Columbia foi, mais uma vez, nosso destino. Às duas da madrugada fomos, de táxi, para a Marquês da Sapucaí, já que Dani e meu irmão sairiam no Boi da Ilha do Governador - dia desses conto detalhes épicos da concentração e do desfile. Fomos dormir às oito e meia da manhã e ao meio-dia estávamos de pé para a monumental e tradicional Feijoada da Apuração, na mansão da Manguassônia.

* A feijoada foi, como das outras vezes, o desfecho perfeito para mais um perfeito Carnaval, que nem a chuva inclemente conseguiu abalar. A casa cheia de amigos, os olhos grudados na TV para a apuração do Grupo Especial e do Grupo de Acesso A, e descemos a Conde de Bonfim em direção à quadra do Salgueiro, vice-campeão do Carnaval 2008, para brindarmos, eu e minha menina apenas, a nosso encontro, a mais um Carnaval juntos e à vitória (sim, vitória) da vemelho-e-branco da Tijuca.

Sobre os resultados...

* quando terminou o desfile da Beija-Flor eu cutuquei a Dani, que dormia a meu lado, e disse:

- Não tem pra ninguém!

E não deu outra. A escola de Nilópolis é bicampeã do Carnaval com todos os méritos e ponto final.

* A grande notícia do dia foi a vitória do Império Serrano no Grupo de Acesso A, que leva a escola de Madureira de volta ao Grupo Especial. Assisti a todo o desfile de sábado e - disse isso ao Simas, disse isso ao Moutinho - não achei que a verde-e-branco merecesse o campeonato. Mas nada disso importa, sinceramente. O que importa, mesmo, é que o Império Serrano ganhou o título.

Fecho, hoje, erguendo o copo em homenagem ao Império Serrano e a todos os imperianos de fé que foram incansáveis e responsáveis, cada um a seu modo, pela conquista incontestável da escola.

Até.

1.2.08

DO DOSADOR

O BUTECO DO EDU, é evidente, não poderia agir diferente: fechamos hoje e só voltamos a erguer a porta imaginária de ferro depois do Carnaval.

* Cora Rónai, a colunista de O GLOBO que mantém, freqüentemente, conversas absurdas com uma capivara de pelúcia (obrigou-nos a agüentar isso durante a Copa do Mundo da Alemanha, lembram-se?, vejam aqui), escreveu em sua coluna no lamentável SEGUNDO CADERNO do citado jornal, esta semana, sobre o Carnaval no Rio de Janeiro. Assim como não entende NADA (com a ênfase szegeriana) de futebol, o que fez com que sua cobertura direto da Alemanha soasse bizarra, não entende NADA de Carnaval. Vejam o que ela escreveu: "Finalmente, ainda que compreendendo a disparidade entre a quantidade de banheiros químicos disponibilizados pela prefeitura e a quantidade de cerveja vendida pelos ambulantes nos grandes ajuntamentos, não gosto de ver homens usando árvores ou pneus de automóveis como mictórios em plena via pública – e gosto menos ainda do cheiro com que amanhecem essas pobres áreas amaldiçoadas. Sempre me pergunto por quê os homens cariocas precisam ser tão grosseiros e indelicados. Afinal, ainda estou para ver as mulheres que os acompanham, na bebida inclusive, dando semelhante espetáculo de boçalidade.". E sabem por que ela está pra ver mulheres mijando no meio da rua durante, por exemplo, o monumental desfile do Cordão da Bola Preta, com mais de 400 mil pessoas? Simplesmente porque ela não vai, talvez nunca tenha ido. Simples. Ah, sim. Tem mais. Termina a dita coluna tirando "(...) o chapéu (metafórico) para Bruno Chateaubriand que, confesso, sempre me passou uma impressão de inconseqüência e futilidade, mas que, nas páginas amarelas da Veja dessa semana, com uma sensibilidade à toda prova, deu entrevista da maior dignidade e inteligência. Perdão, Bruno. Até aqui, ao ler sobre você, eu não sabia de quem estavam falando.". Que tal? Eu sei que meu irmão Luiz Antonio Simas lerá isso aqui e será tomado por uma vontade enorme de me dizer que cá estou acendendo cotoco de vela, o que é muito, pra pouco defunto. Mas eu não resisti.

* Eu sei que soará patético para a grande maioria de vocês... Mas eu também não resisto a fazer a confissão pública. Ano após ano, eu me divirto assistindo, pela TV, ao desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Eu gosto demais. É lamentável, é verdade, ter de ouvir Cléber Machado narrando o desfile, Ivo Meireles comentando sobre as baterias, Leci Brandão esbanjando intimidade com as comunidades, e as câmeras dispensando as mulatas em flor para exibir seus artistas, suas chamadas celebridades e o desfile patético dessa gente nos camarotes do Sambódromo. Ainda assim, sofá, cerveja gelada, o cafuné da minha menina e o desfile do Salgueiro (bastaria, o Salgueiro) fazem valer a pena.

* já há algo diferente dentro de mim, e até mesmo na cidade em que choveu durante os últimos quinze dias. Faz um sol tremendo, e um céu de um azul olímpico arromba minha vista e anuncia mais um desfile do Bola Preta para a manhã de sábado. Lá estarei, com minha Dani, ao lado de amigos queridos e de mais de 400 mil foliões que estão carecas de saber que lugar quente é na cama ou então no Bola Preta.

* A Grande Rio, essa escola detestável de Duque de Caxias, que não tem nada a ver com a Cartolinha de Caxias como alguns querem fazer crer, que não tem Velha Guarda mas tem A Velha, que atende pelo nome de Suzana Vieira, vai ganhar o título de Campeã do Grupo Especial graças a um arranjo entre sua subsidiária, a TV GLOBO, e a LIESA. Tomem nota. Se ganhar mesmo, ganho pontos. Se perder, eu arrumo uma desculpa em seguida.

* A Feijoada da Apuração, tradicionalíssimo evento do Carnaval na Tijuca que acontece na Quarta-Feira de Cinzas na mansão da Manguassônia, vai acontecer de novo em 2008. Lá estarão, como no ano passado, Luiz Antonio Simas e meu pai, imperianos de fé. Quero, muito, que brindemos, os três juntos, à vitória do Império Serrano, de volta ao Grupo Especial em 2009.

* Bom Carnaval a todos, e até a volta.

CARNAVAL NO CÉU - PARTE II

Clicando na imagem abaixo, vocês assistirão à continuação da matéria CARNAVAL NO CÉU, cuja primeira parte vocês viram aqui.

Até.

PROGRAMAÇOS OFF CARNAVAL

Meu irmão Luiz Antonio Simas, que acorda diariamente e vai regar seu pequeno jardim de preconceitos (passei a imitá-lo depois que soube de seu saudável hábito, como ele contou aqui), listou, recentemente, em seu fundamental HISTÓRIAS DO BRASIL, dez programas "off carnaval" (é evidente que a expressão é mais uma criação da Agência Globo de Jornalistas Idiotas) pra quem não gosta da missa campal do povo brasileiro, apud Aldir Blanc.

A leitura do texto PARA QUEM NÃO É DA FOLIA é de fazer chorar de rir. Colaboro, humílimo, com uma décima-primeira opção. Clicando na imagem abaixo, matéria publicada na revista RIOSHOW, de O GLOBO, que dá essa inacreditável dica para a Segunda-Feira de Carnaval (leiam, leiam, leiam e vejam que troço odioso), você vai parar direto no blog do Simas. E chorar de rir.

publicado na revista RIO SHOW, de O GLOBO, em primeiro de fevereiro de 2008

Até.

HOLOCAUSTO

O Goldenberg que orgulhosamente ostento em meu sobrenome me deixa à vontade para esculhambar (papai usa este verbo com impressionante freqüência) a atitude do presidente da Federação Israelita do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Niskier, que ingressou na justiça para proibir, por meio de liminar, a Unidos do Viradouro de levar à avenida um carro alegórico fazendo referência (referência, apenas) ao Holocausto. Para esculhambar, também o apoio dado pelo Centro Simon Wiesenthal, grupo internacional judaico ligado aos direitos humanos, e ainda a juíza Juliana Kalichszteim (judia?), que concedeu a liminar.

matéria publicada no jornal O GLOBO de primeiro de fevereiro de 2008

O que pensam os três (assim, só por curiosidade) sobre o vergonhoso holocausto perpetrado, dia após dia, contra os palestinos?

Até.