26.2.08

DO DOSADOR

* Li todos os jornais de ontem, segunda-feira, um dia depois da eletrizante final da Taça Guanabara, entre Flamengo e Botafogo, uma final à altura da grandiosa história dos dois clubes e do próprio clássico, com direito à vitória na base da virada, gol nos acréscimos, bola na trave no último segundo de jogo no que seria o gol de empate do Botafogo que levaria a disputa para os pênaltis, expulsão de três jogadores, acusações de favorecimento por parte da arbitragem e chilique patético (e penso que inédito!) do time perdedor com renúncia ao vivo, depois do jogo, durante entrevista coletiva, do presidente do time de General Severiano. Nada do que li, nada, com a lucidez, a sobriedade e a coragem do texto RESPEITEM O BOTAFOGO, de meu mano Luiz Antonio Simas, que pode ser lido aqui. Notem vocês, lendo também o que comentou-se na FOTOTECA publicada ontem, aqui, que José Sergio Rocha, querido amigo de Niterói, em visível e acelerado processo de desequlíbrio emocional, urra (quem sabe ler ouvirá os gritos do velho) o slogan costurado na bandeira que ele próprio tremula e que manda, às favas, a lucidez. O querido Bruno Ribeiro, de Campinas, companheiro de calvário de José Sergio Rocha - torce para o Guarani e simpatiza agudamente com o Botafogo -, imediatamente adere à luta-contra-ninguém e esperneia da mesmíssima forma. Ora, ora, meus poucos mas fiéis leitores, permitam-me brevíssima digressão... Ninguém mais passional que eu. Ninguém mais apaixonado. E com relação ao episódio, ao contrário do que pensam os dois jornalistas, penso que a falta de lucidez deveria ter durado exatamente o tempo que durou a falta de lucidez que acometeu Luiz Antonio Simas no instante do apito final. Saiu do estádio, o calvíssimo Simas, esbravejando e dirigindo impropérios impublicáveis a mim e ao Mussa, já que assistimos ao jogo juntos. Anunciou que não iria ao Rio-Brasília, que não beberia conosco em nenhuma hipótese e outras mumunhas. Foi pra casa, reviu os melhores momentos da partida, envergonhou-se do papelão protagonizado pelo time, pela comissão técnica e pelos dirigentes, e juntou-se a nós, uma hora depois, passional como sempre, apaixonado como sempre, mas sem um mísero gesto insano e sem um sinal de inépcia capaz de envergonhá-lo mais à frente.

* Por falar em insanidade e em inépcia, vamos a um fato. Sábado passado, véspera da final de anteontem, houve mais um samba na rua do Ouvidor. A rua não fugia à regra que norteava a cidade e respirava, e transpirava, o clima do Flamengo e Botafogo do dia seguinte. Luiz Antonio Simas, que vestia uma camisa do Botafogo autografada pelo Nilton Santos, foi abordado por um camarada a quem jamais vira e que lhe estendeu a pata:

- Parabéns!

- Por que? - disse o Simão, não percebendo o sorriso de canto de boca que emoldura o focinho de quem não tem caráter (é uma característica indefectível).

- Por ocupar a vaga do Vasco amanhã. Eternos vices... - e deu as costas, a besta humana.

Essa mania insuportável de comemorar a desgraça do adversário ao invés do regozijo puro e simples pela vitória, esse hábito nocivo que planta vítimas fatais a cada jogo (pelo menos um torcedor do Botafogo foi assassinado com quatro tiros depois do jogo), esse troço nojento que é ficar entoando cânticos que se prestam mais ao achincalhe do adversário que à exaltação pela conquista, me fez pensar no seguinte enquanto discutia o tema, na saída do Maracanã, com o Mussa: isso é equivalente a você traçar, num lance em que se misturam talento e sorte, uma tremenda mulher, gostosíssima, casada, e bater o telefone pro corno, segundos depois do coito, a fim de sacanear o pobre-diabo em vez de ficar ali, no silêncio de depois, curtindo a glória do momento.

Até.

16 comentários:

Marcelo Moutinho disse...

De fato, o texto do Simas tem suas razões. Mas é uma pena que em praticamente todos os debates esportivos (assisti a dois deles ontem) não haja mais espaço para o contraditório. Assim como há gente que pensa como o Simas, há gente que pensa diferente, e essa posição não apareceu em nenhum dos debates. Debate sem contraditório? A busca de audiência e de leitores tem feito o jornalismo ficar cada vez mais chapa branca

Anônimo disse...

Edu, querido, não estou tão puto da vida quanto você imagina. Meu elogio à loucura deriva, veja que contradição!, do resto de lucidez que me resta. Concordo em relação ao créu. E meu desabafo nada tem a ver com o Flamengo. Quanto à brincadeirinha do vice, se fosse comigo, também ficaria puto. Mas não vejo dolo maior nisso. Porra, a graça do futebol é também a gozação. Se eu fosse o Simas, passado o momento de raiva com aquele idiota que o abordou, eu riria agora disso.

Anônimo disse...

Já que gozação faz parte do espetáculo...

Sou Vascaíno apaixonado e como "eterno vice", na final do estadual estarei na torcida do Flamengo. rs

Abraços,

Craudio disse...

Edu, acredito que há derrotas e derrotas. A do Botafogo nesse último domingo foi daquelas que permitiu ao Simas rever o jogo e constatar que, de fato, o Flamengo fez por merecer a vitória. E foi uma derrota em que o time perdedor não saiu desmoralizado porque lutou até o fim - vide a bola na trave nos últimos segundos.

Talvez a cena dos jogadores nos vestiários (também achei patética) foi resultado de uma série de bafafás criados pela diretoria botafoguense desde o ano passado. Ficar fazendo papel de coitado, aliás, até prejudica, porque vira desculpa para qualquer escorregão e esconde erros de administração.

Por outro lado, temos que dar conta de que algumas vezes percebemos uma real má-intenção dos larápios do apito. Ou então má-vontade dos jogadores. Aí sim é válida toda a indignação e falta de lucidez em caso de derrota, principalmente em uma decisão.

Independentemente disso, o que vale dizer é que se tratou de um grande jogo. O Rio tem o melhor regional, disparado. E só fórmulas como essa permitem grandes jogos assim, ao contrário dessa imbecilidade de pontos corridos, onde podemos nos deparar com um Atlético-PR campeão, por exemplo.

Anônimo disse...

Atlético PR campeão em pontos corridos? Quando?

Daniel A.

Craudio disse...

Daniel, é um caso hipotético... Sobre os pontos corridos, tenho uma lista embasada em muitos dados para ser contra essa fórmula. O que eu questionei é um clube como esse querer rivalizar em grandeza com Botafogo e Flamengo, por exemplo. Mas isso não é o foco da coisa toda.

Abraços!

Marcelo Moutinho disse...

Craudio: o Atlético-PR não foi campeão na era dos pontos corridos. Houve semifinais e finais naquele campeonato. Inclusive meu Fluminense perdeu nas semis para eles.

Szegeri disse...

Cada vez que entro aqui deparo uma insanidade (no mau sentido) maior. "Foi pra casa, assistiu na tv, e viu que o Flamengo MERECEU a vitória". MERECEU??????? FOOOOOOOODA-SE!!!!!! Torcedor quer saber de merecimento onde, ô Cráudio? Se meu time ganhou sem merecer, comemoro ainda mais! Torcedor não quer saber de merecimento, quer saber do time ganhar o campeonato roubado mesmo. Pelo menos torcedor como eu conheci, nos tempos idos.

E não pode tirar sarro, não???? Putaqueosparaus, desde que o mundo é mundo uma das graças do futebol é tirar sarro do perdedor e ninguém nunca matou ninguém por isso, pelamordedeus, Edu, não confunda galhos, com bugalhos. Tudo bem, evita-se cavocar a dor do outro na hora H, que os ânimos estão quentes, mas segunda-feira é o dia internacional da tiração de sarro, pô, desde o samba do Wilson Batista ("meu patrão é vascaíno e de mim irá zombar..."). Remo e Paysandu odeiam-se, tripudiam-se, digladiam-se há décadas, os dois estádios ficam a 200 metros um do outro, nunca vi ninguém matar ninguém, mas a gozação é monumental. Vamos parar de bom mocismo! Até aqui, porra?

E isso que ficam atribuindo ao mestre Simas, só posso por na conta dos exageros hábito, porque em nenhum momento ele assumiu essa posição, que seria absolutamente incompatível com sua magnânima condição de torcedor. O jogo visto pela televisão, senhores, simplesmente não existe. Não vale nada, não tem emoção, não tem erro, não tem porra nenhuma. JAMAIS na vida se pode reconsiderar UMA EMOÇÃO, não parecer óbvio? Agora, concordar que tenha sido ou não pênalti, discutir, concordar, discordar, voltar atrás, reconsiderar UMA OPINIÃO é uma coisa que se inventou para o prazer do futebol não morrer no domingo, seguir pela segunda, pela terça, até a próxima rodada começar a reacender os interesses. SÓ, porra. SÓ. Não tem nada a ver com o jogo em si, assim como contar para os amigos não tem nada a ver com a trepada dada.

Conclusão: vocês todos estão chatos para caralho!

Rodrigo disse...

Parabéns, Edu!

Disse tudo, e mais um pouco. Futebol tem disso mesmo. Futebol é acaso, nem sempre o melhor vence, como nem sempre o pior perde.

Sou corinthiano, na minha opinião o time mais odiado do país e nem por isso, eu fico arranjando encrenca com com os meus colegas são paulinos.

Ouvi muitas piadas bobas quando ele caiu, faz parte. Mais agora aturar brincadeira de quem eu nem conheço, ai já é demais.!

Parabéns Flamengo, e meus pensares para o Botafogo, que espero que volte com tudo na Taça Rio.

Anônimo disse...

Edu, essas provocações - ainda mais quando partem de desconhecidos - devem ser rebatidas com deboches ofensivos a honra do time. Como o próprio Simas fez com o engraçadinho tricolor, não acha?

Zé Sérgio, comparar SP com a Grande Rio foi um golaço.

Cláudio (Cráudio não, né?), concordo, pontos corridos é uma bosta! Mas acho que vc deve ter confundido o ano (se não me engano 2004) em que a Grande Rio do futebol atropelou no final e o Atlético ficou com o prêmio de consolação de ter o artilheiro da competição (Washington).

Marcelo, nosso Fluminense foi roubado, diga-se de passagem, nesta semi. Lembra do pênalti no F. Diniz no final do primeiro tempo, quando o jogo estava 1x0?

abs.,

Daniel A.

Craudio disse...

Fernandão, o que eu quiz dizer com "fez por merecer a vitória" é que, pela TV, se acaba de vez com qualquer argumento para choradeira com relação a roubo, aliado ao fato de que o Flamengo fez 2 gols e o Botafogo só 1.

Concordo em tudo com relação ao futebol pela TV. Não só abomino torcedor de sofá como também acredito que a opinião dele não deva ser considerada. Discuto só que domingo passado não foi caso para sair do estádio querendo matar árbitro. Acho que se algum botafoguense se sentiu assim, é porque foi influenciado desde o ano passado pelo choro de seus dirigentes.

Daniel, de novo, só quis dizer que Atlético-PR (assim como São Caetano, Paraná Clube, Juventude e essas merdas que inventam), para mim, está abaixo de muito time por aí. Mesmo ganhando títulos (coisa que não define, sozinha, se um clube é ou não grande). E o Craudio é em homenagem a minha vó, que jamais pronunciou a letra L na vida.

Anônimo disse...

Daniel: acho que essa comparação entre o São Paulo FC e a Grande Rio não fui eu que inventei. Acho que li em algum lugar e gostei tanto que repeti. Cráudio: nossos dirigentes podem ser chorões, mas acho (posso estar enganado) que o Botafogo teve poucos ladrões e filhos da puta em sua presidência. Um deles, claro, foi o Charles Borer. Outro, o Otávio Pinto Guimarães. Dois corruptos. Ou seja, prefiro o chorão honrado Bebeto de Freitas. O Szegeri, chorão corneteiro palmeirense, e o Edu, que oscila entre o Desejo de Matar IV e um pacote de manteiga derretida, hão de concordar comigo. Até!

Unknown disse...

Edu, com licença do intróito: FODA.

Foi FODA a analogia do corno. Perfeita, é disso que vive o bom texto, de imagens (eu não vou dizer imagética ,aqui, prá não levar uma escarrada perdida).

Forte abraço.

Marcio

Luiz Antonio Simas disse...

Szegeri, perfeito seu comentário. Eu NUNCA disse que o Flamengo mereceu a vitória. Jamais. Admiti que foi pênalti (mas não admiti que o mesmo devesse ser marcado - eu, por exemplo, não marcaria) - mas o que me fez ficar puto nas calças, e fiquei, foi com o chilique do time e da direção do Botafogo após o jogo. Se tivessem metido a porrada no juiz eu não veria nenhum problema. Mas aquele chororô de mocinhas foi foda.
Abraços

Anônimo disse...

Torcedores de times rivais discordam da interpretação de um lance mesmo revendo-o na tv milhões de vezes. A tv não tem o poder de eliminar a paixão, não é suficientemente forte para trazer lucidez ao ato de torcer. Lucidez implica imparcialidade, o que não existe na relação torcedor-time.
Claro que ir ao estádio é incomparavelmente melhor que assitir pela tv. O problema é que nenhum estádio do mundo comporta os 17 milhões de torcedores do Fla...

Pelamordedeus, gente! Reconhecer a derrota é uma coisa, achar que o outro time mereceu a vitória é outra completamente diferente! Merecer? Essa palavra nem mesmo faz parte do vocabulário do torcedor!

Daniel Gottlieb disse...

Como dizia Nelson Rodrigues, o VT é burro.

Fora isso, claro que grande parte da graça do futebol sempre foi e continua sendo sacanear os torcedores adversários. É isso que torna o campeonato carioca tão interessante. Do que me importa ganhar do Atlético Paranaense (mesmo quando ele estava com um bom time) ou da Ponte Preta? Eu quero é ganhar um clássico!

O problema da sociedade não é sacanear o adversário. O problema é não notar a distância abissal que existe entre brincar sobre a derrota adversária e sacar uma arma e matar.