31.5.08

UM PASSEIO PELA TIJUCA - IV

Vou dar seguimento, hoje, sábado, dia em que nem é muito comum eu abrir as portas de ferro do estabelecimento, a essa brincadeira que - confesso - muito tem me divertido, de bolar roteiros para os neófitos em matéria de Tijuca, para os que torcem os narizes quando ouvem falar da Tijuca sem nem ao menos conhecê-la direito, para os tijucanos de quatro costados, como eu, que têm verdadeiro orgulho de sua terra, de seu bairro, de suas ruas, de suas esquinas, de seus bares, de suas meninas, de seu casario, desse privilégio que é viver no Rio e na zona norte - ô, sorte!, é o que diz o tijucano íntegro a cada manhã. Vamos a ele, então.

Mantendo a linha - e repetindo a feira! - saia caminhando pela feira livre da Vicente Licínio, num domingo - tem que ser domingo, é claro - por volta das 11h, um bocadinho mais tarde. Comece lááááá pela outra ponta, oposta à ponta da Campos Sales. Abra seu dia com um pastel de camarão com catupiry e um copão de caldo de cana. Feira é feira, meus poucos mas fiéis leitores, as barracas estão sempre nos mesmos lugares, e o que varia são os produtos, as safras, o humor dos pregoeiros, os peixes expostos, a qualidade dos frutos do mar, as folhas frescas ou secas que a rezadeira trouxe, portanto tenha olhos de ver, ouvidos de ouvir e um bom olfato à mão. Umas dicas?

Bem em frente à barraca do pastel começa a série de caminhões-peixarias. São, ao menos para mim, uma tentação. Quase todos têm um tablado de madeira que te deixa mais perto dos peixes, dos camarões, das lulas, das vieiras, então, sem cerimônia, abuse desse privilégio. Suba. Veja tudo. Converse com os peixeiros, são todos trabalhadores e honestíssimos. Peixeiro desonesto em feira livre dura menos que o jornal que embrulha seu próprio produto. Se gostar muito de alguma coisa, compre, é claro. Ali, entre os caminhões, há um florista. Flores na feira são incríveis, ficam em baldes coloridos, aos montes, e há também galhos de arruda, leve um!!! Siga pela feira, sem pressa, como deve ser, sempre. Prove de tudo o que lhe for oferecido e beba, durante o trajeto - há mais de uma barraquinha vendendo isso... - água de côco geladíssima. Chegando ao final, já na Campos Sales, compre outro pastel na pastelaria que há à sua esquerda, em frente a um outro florista, esse do lado direito. Compare os pastéis. Passe a ter o seu pastel de fé na feira. Isso é fabuloso e é fundamental para que se crie um amálgama definitivo entre você e o mercado de rua!

Resista à tentação e não vire à direita em direção à rua Pardal Mallet. Vire à esquerda. Passe pela rua Gonçalves Crespo (mais tarde você almoçará nessa rua!, aguarde), na contramão da Campos Sales, e observe a sede do América, do nosso querido Felipinho Cereal, tijucano agudo. Quando você chegar na esquina seguinte, à sua esquerda você verá a rua Marechal Marques Porto. Dê uma caminhada pra dentro dela apenas para babar, literalmente, diante de um prédio art-decò (alô, Helion!) belíssimo, escondido nessa rua mínima, peculiar, que a Tijuca abriga, do lado direito de quem entra por onde você entrou. Volte. Volte, atravesse a Campos Sales e pare na esquina. Você estará na esquina da rua Campos Sales com a rua Martins Pena, digamos que a continuação da Marechal Marques Porto. Diante de você, a Praça Afonso Pena (depois, vale uma voltinha).

Na Martins Pena, molhe seu bico com a primeira cerveja do dia. Peça uma Brahma estupidamente gelada no APERTADINHO, nome do buteco que fica ali, coladinho ao SALÃO AMÉRICA (que estará fechado, é domingo, lembre-se). Aquela calçada estará, sem dúvida, em festa. Beba uma, beba duas, puxe conversa - se for dia de jogo do Flamengo o APERTADINHO estará sediando mais um encontro da FLAMIGOS, uma torcida pacífica que reúne pais, avós, filhos, netos, todos na maior tranqüilidade do mundo. Depois dessas cervejas, obrigue-se a, na segunda-feira, ir lá, de novo, só que ao lado, pra puxar papo com o Seu Ernesto, um grande praça, maiúsculo, barbeiro do glorioso SALÃO AMÉRICA, ao lado do APERTADINHO, como eu já disse. Faça a barba, arrume uma desculpa qualquer, apare o pé do cabelo, qualquer troço, mas sente-se na cadeira FERRANTE do Seu Ernesto, a última do salão, junto à parede, à direita de quem entra. A conversa será das boas, o salão tem uma atmosfera absurdamente tijucana, porta de correr, a TV ou o rádio sempre ligados, escudo do América na parede, potes e bisnagas de creme de barbear, aquele cheiro único das barbearias, tudo o que é preciso para fazer o clientes feliz! Feito esse plano - cumpra-o! -, vá ao buteco do lado. Isso mesmo. A ordem é essa. Um buteco. Coladinho, o salão. E coladinho ao salão, outro buteco, esse de esquina. Acho que chama-se AMÉRICA também (a conferir... Cereal, faz isso pra mim? Um pulinho lá com a sua Caloi 10 e pronto!) (pedido feito, pedido atendido... o buteco chama-se AMÉRICA ESPORTIVO, como nos conta, o Cereal, nos comentários). Beba uma cerveja, uma água gasosa, vá à praça. Vá à praça pra ver gente. Como é domingo, é certo, a praça estará lotada de cabeças-brancas, de crianças, de vendedores de tudo o que se possa imaginar, e de árvores, muitas árvores, reforçando a verdade que aponta para essa incontestável conclusão: a Tijuca é um bairro verde, com céu amplo, arejado, salve, salve a Tijuca!

No entorno da praça, um açougue de primeira (atravesse a rua Doutor Satamini, pô!), fechado. Há, reparem nisso, cada vez menos açougues. Os supermercados estão esmagando esse comércio tão fundamental, estão acabando com a figura do açougueiro, o homem que sabe, de fato, manusear uma carne, cortar, pelas juntas, o rabo do boi pra fazer a rabada direitinho, limpar, sem um senão, uma peça inteira de contra-filé... Ao lado do açougue, outra raridade... uma sapataria de rua, chamada APENA (genial, não?). Também vai estar fechada. Mas seu destino será um pé-sujo na rua Afonso Pena, quase na esquina da Doutor Satamini, do lado esquerdo. Uma cerveja só, o bastante pra você curtir a assistência (sempre lotado!) e perceber que ali, ao lado, funciona mais que uma banca do bicho. Aquilo parece, de fato, um banco! E volte pra praça.

Passe pelo APERTADINHO de novo, lembre-se de voltar no dia seguinte para uma ida à barbearia!!!!!, e entre na Campos Sales no sentido do trânsito. Entre, à direita, na rua Gonçalves Crespo. Caminhe até o final dela. Você verá a feira sendo desfeita à sua esquerda, na Vicente Licínio. À sua direita, um portão enorme, portentoso, vermelho, sem letreiro algum. Entre.

Você estará no CENTRO CULTURAL DA CHINA, um prédio com muros altos, esse tal portão vermelho, duas estátuas de dragões brancos enormes, e à direita de quem entra, um restaurante, também sem letreiro, chamado HUAN LIAN. É seu destino.

Na entrada, pregado numa espécie de quadro móvel, o cardápio inteiramente escrito em chinês. Entre. Você estará num dos ambientes mais simples que já observou num restaurante. Sendo domingo, deverá estar bem cheio, e as mesas lotadas por chineses, apenas. Nada como se sentir estrangeiro em sua própria terra...

Peça ao garçom o cardápio (vem também em português). Daí, aproveite! As entradas, os pratos principais, tudo, rigorosamente tudo, é inacreditavelmente delicioso. Esqueça, se algum dia você caiu nessa armadilha, esses fast-food de comida chinesa em caixa. Esqueça. O troço, no HUAN LIAN, é infinitamente mais sério.

Até.

30.5.08

O MEU PAI E O HELION

Tá bonito de ver (de ler, na verdade...) o diálogo que vem sendo travado entre meu velho e amado pai, Isaac Goldenberg, e meu querido Helion Póvoa, a sabedoria em pessoa, nos comentários ao texto MAIS SOBRE A TIJUCA, que pode ser lido aqui e que foi publicado em 27 de maio de 2008. O troço começou com uma provocação do Helion sobre cinemas extintos no glorioso bairro da zona norte, resvalou sobre a arquitetura art-decò predominante numa escondida rua tijucana, num desafio feito pelo próprio Helion, e que eu matei!, e daí meu pai abriu o bico no balcão imaginário, tirou conhecimento de dentro de sua memória prodigiosa, e os dois estão num papo desses de admirar.

Vou - como já disse a eles - armar, assim que for possível, uma cerveja com os dois.

Sentar-me-ei diante dos dois, sorverei aquela cultura tijucana-zona-norte que há de pingar das bordas da mesa e estou pensando até - pode dar certo! - em chamar gente pra assistir ao espetáculo!

Acompanhem lá!

Até.

UM PASSEIO PELA TIJUCA - III

Se eu quisesse soar velho, velhíssimo, quase mumificado - o que não é nada difícil, eu sou assim mesmo! -, eu diria que os roteiros que tenho proposto para passeios a pé pela Tijuca estão virando - notem a idade da expressão! - uma coqueluche. Escrevi o primeiro (aqui), o segundo (aqui) e parto hoje, sexta-feira, para o terceiro roteiro que há de ser, é o que sinceramente espero, tão bem recebido quanto os dois primeiros.

Proponho que a partida seja dada, numa sexta-feira (é essencial que seja sexta-feira), da rua Garibaldi, a mesma que entrou no segundo roteiro, e de dentro do BAR DA DONA MARIA, o mesmíssimo bar que dele também constou. Com uma diferença: sexta-feira é dia de feira livre na Garibaldi, portanto, esbalde-se! De pé diante do balcão de mármore do buteco, não deixando de prestar atenção aos detalhes impagáveis (a caixa registradora, as geladeiras com portas de madeira, o pé-direito altíssimo, o menor banheiro masculino de que se tem notícia) e torcendo pra ser atendido pela Dona Maria em pessoa, esteja lá por volta das 10h30min. Sei - sei disso, sei disso! - que apenas os homens de sorte poderão estar lá, numa sexta-feira, dia útil, a essa hora. Mas há sempre a possibilidade de um feriado (quem sabe?), de um profissional liberal com agenda flexível, de uma febrinha de última hora, sacumé? Então... Dez e meia da manhã, você ali bicando sua primeira cervejinha da sexta-feira, curtindo esse pedaço fabuloso da Tijuca - a Muda, para os locais - e maravilhado com o casarão em frente (já falamos dele), com as árvores imensas e frondosas ao longo de toda a rua e com o movimento da feira, dos feirantes, dos ambulantes, das rezadeiras e suas folhas, dos pregoeiros, dos fregueses, das freguesas, dos floristas, com o movimento ali, inteiro, à sua frente. Beba uma, duas, três cervejas. Arremate com uma água com gás. Saindo do bar e dobrando à esquerda, já na feira, flanando entre a assistência, procure a barraca do pastel e mande um de queijo, tradicional, pra dentro, junto com um copão de meio litro de caldo de cana. Glicose, malandragem, troço fundamental pro êxito do passeio!

Siga em frente até o curso do Rio Maracanã. Pare diante dele. Olhe para seu curso, suas pedras, seu lixo, seu soro poluído, e saiba que o Rio Maracanã e a Tijuca foram feitos um para o outro, siameses que são. Dobre à direita, seguindo o curso do rio, pela avenida Maracanã (ela mesma, só que num trecho pacatíssimo). Babe com as árvores monumentais que vivem à margem do rio, com os flamboyants que colorem a caminhada, assombre-se diante daquela calma, daquela quietude, em plena cidade do Rio de Janeiro. Você ouvirá o canto dos pássaros, pouco barulho de automóvel, você passará, dessa vez pelo lado oposto, pela rua Guajaratuba, à sua esquerda, e caminhará até a rua Radmaker, na qual você deverá entrar à esquerda, andando pela calçada do lado esquerdo, até a esquina da rua Pinto Guedes. Você já está diante de um buteco pé-sujo. Não perca muito tempo ali. Mas veja as coisas, respire o ambiente, beba mais uma garrafa de água com gás (vá por mim!) e siga a Pinto Guedes na mão do trânsito. Em poucos segundos, poucos passos, você estará na Praça Xavier de Brito.

Aprecie, francamente, a beleza da praça que completa, em 2008, 80 anos de existência. Estaque após a primeira pisada na praça. Repare nas quadras de bocha onde os mais velhos passam os dias, pertinho da pista da Pinto Guedes. Vire de costas e perceba a beleza de construção que é a ESCOLA MUNICIPAL SOARES PEREIRA, em estilo neo-colonial luso-brasileiro. Construída em 1926, fica na esquina da rua Pinto Guedes com a avenida Maracanã. Volte-se novamente e caminhe até o chafariz, francês e de bronze, que foi construído e instalado, primeiramente, numa praça qualquer da Europa, trazida mais tarde para o Brasil. Para o Brasil. Para o Rio de Janeiro. Para a Tijuca, mais precisamente! Atravesse a praça em direção ao BAR DO PAVÃO, palco de encerramento do segundo roteiro que propus. Ali, quase diante do bar, preste atenção ao imóvel do número 110 da rua Otávio Kelly (você estará diante dela!), que acaba de ser tombado pela Prefeitura. Trata-se da antiga ELEVATÓRIA de água da Tijuca, construção imponente da década de 20, e que hoje funciona como prédio da CEDAE. Com a medida, diga-se, afasta-se dali o fantasma da especulação imobiliária.

Cumprimente o Pavão, a Dona Jô, babe diante da casa da Dona Olívia (na Otávio Kelly, coladinha ao BAR DO PAVÃO) e marche até a rua General Espírito Santo Cardoso. Do seu lado esquerdo, repare numa casa que é, hoje, uma loja expositora de tintas. Fenomenal! Dobre à direita e tome a direção do BAR DO MOMO, à esquerda, quase na esquina da rua Uruguai.

No MOMO - para os íntimos -, e você deve estar chegando por volta do meio-dia, você dará com o que posso chamar de "fauna tijucana", na melhor acepção da expressão. Muita cabeça branca, muita história boa pra se ouvir, e você pode dar a sorte de esbarrar com o Ceceu Rico, com o Paulo Amarelo, com o Mário, com o Seu Antônio, sendo certo que você encontrará cerveja gelada, petiscos imperdíveis (as sardinhas são inacreditáveis) e muito papo bom. Desses de fazer você perder a hora, literalmente.

Mas resista. Fique ali, no máximo, umas duas horinhas. Minha proposta é pesada mas valerá a pena. Tome a esquina e dobre à esquerda. Caminhe pela rua Uruguai na contramão do trânsito. Ande até esbarrar com a JIV'S DELICATESSEN, no número 280. Faça ali, se quiser, umas compras pra mais tarde, no descanso do lar. Siga em frente e entre, à direita, na rua Barão de Mesquita (ali, pertinho, está um outro ponto que constará, em brevíssimo, de novo roteiro que prepararei, um restaurante de comida nordestina de deixar cearense com lágrimas nos olhos).

Já na Barão de Mesquita, também na contramão do trânsito, entre na primeira rua à esquerda, a Pontes Correia. Minha proposta é simples: atravesse com calma a Pontes Correia, um oásis encravado na Tijuca. Rua calmíssima, pouquíssimos edifícios, muitas casas, algumas vilas, muitas árvores, a Pontes Correia é sonho de consumo de muita gente que mora por essas bandas... Vá até a avenida Maxwell e dobre à direita. Você vai passar pela rua Amaral, pela rua Silva Teles (onde fica a quadra do SALGUEIRO), pela Agostinho Menezes, pela Araújo Lima e pela Gonzaga Bastos, não deixando de prestar atenção à fábrica de tecidos, cantada por Noel Rosa, que aparecerá, monstruosa, à sua esquerda durante a travessia da Maxwell. Você vai entrar na Gonzaga Bastos, à direita.

Entrando na Gonzaga Bastos, entre na primeira à esquerda, na rua dos Artistas. Preste atenção quando passar em frente ao número 257, casa - ali até hoje! - na qual passou grande parte de sua infância o compositor Aldir Blanc, ponto central de seu fabuloso livro VILA ISABEL, INVENTÁRIO DA INFÂNCIA, que virou curtametragem dirigido por Isabel Diegues. Curta a rua dos Artistas, uma rua também pacata, dotada de forte carga da alma tijuca, suburbana, zona norte. Atravesse a Pereira Nunes, a Ribeiro Guimarães, siga em frente e dobre à direita apenas na Almirante João Cândido Brasil. Resista ao SIRI, fabuloso restaurante na esquina. Não, não. Beba um chope, apenas, de pé mesmo. Lamba os beiços e siga pela Almirante João Cândido Brasil até a Praça Varnhagen, não parando em nenhum dos bares do caminho. Vá até o meio da praça e olhe, de leve, para a sua esquerda.

Mire a rua Jaceguai, palco do MAU (movimento artístico universitário), que teve origem nas reuniões feitas na casa do psiquiatra Aluízio Porto Carreiro de Miranda e de sua mulher Maria Ruth, na década de 60. Coincidência ou não, os famosos saraus musicais aconteciam, também, às sextas-feiras! Freqüentavam a casa, famosíssima à época, jovens como Taiguara, Gonzaguinha, Ivan Lins, Aldir Blanc, entre muitos outros, já mais conhecidos, como Cartola, Milton Nascimento e Ney Matogrosso.

Na esquina da rua Jaceguai está o ponto final deste terceiro roteiro: o BAR VARNHAGEN. Portentoso buteco, azulejos na parede, muitas plantas dentro, cerveja sempre estupidamente gelada, pataniscas de bacalhau (é obrigatório provar as pataniscas), termine ali a sua sexta-feira agradecendo aos deuses, todos, por seu dia, por seu passeio, por cada visão, por cada sensação, por cada descoberta.

Até.

29.5.08

INCRÍVEL...

... como as pessoas têm as memórias frescas... basta cutucá-las que as revelações vêm com fortíssima intensidade! Exemplo? Chega a ser comovente o relato da Cristiane Schuch, mãe do meu filho, o Prata, feito nos comentários ao texto UM PASSEIO PELA TIJUCA - II, que pode ser lido aqui.

Até.

UM PASSEIO PELA TIJUCA - II

Em razão do acerto que foi, na minha humílima opinião, o texto que publiquei ontem sugerindo um roteiro para um passeio pela minha Tijuca (leiam aqui), volto hoje ao mesmo tema, sugerindo, então, um segundo roteiro para um segundo passeio que há de ser, faço votos, tão gratificante quanto o primeiro.

O ponto de partida será, para mantermos uma espécie de tradição que pretendo imprimir aos tais passeios, na feira livre que acontece aos sábados na rua dos Artistas e na rua Ribeiro Guimarães, que se cruzam ali naquela meiúca que neguinho jura que é Vila Isabel, Aldeia Campista, Andaraí (trato desse furdunço no primeiro texto de meu livro, que - olha a propaganda! - pode ser comprado na livraria do meu coração, a FOLHA SECA (Rua do Ouvidor, 37, fone 21-2507-7175, email aqui), ou aqui, se você morar fora do Rio), mas que é - a bem da verdade - Tijuca!!!!!

Antes de começar a xeretar a feira, que é sempre uma grande pedida, como já lhes disse no texto com o primeiro roteiro, sente-se no buteco que atende pelo sugestivo nome de ESCADINHA, graças aos degraus que o separam da calçada, que fica exatamente na esquina da Artistas com a Ribeiro Guimarães. Uma curiosidade: ali, coladinho ao buteco, fica o prédio onde mora o Seu Osório, o Edifício Xana, de pastilhas amarelas na fachada da frente.

Beba uma, duas Brahmas no máximo e saia percorrendo a feira. Ali, naquele pedaço, viveu Nelson Rodrigues, no cruzamento da ruas Almirante João Cândido Brasil, Artistas e Dona Zulmira, que é na verdade a continuação da Artistas. Ali havia um coreto, e você pode imaginá-lo ali, se quiser. Andou pela feira? Volte ao ESCADINHA e peça mais uma cerveja.

Parta pela rua Ribeiro Guimarães em direção à avenida Maracanã. Repare na vila que há, quase no final da Ribeiro Guimarães, do lado direito. Um paraíso no meio do tumulto da cidade... Ignore completamente, é claro, o Shopping Tijuca. Siga a avenida Maracanã até a esquina com a rua Barão de Mesquita. Você estará na Praça Lamartine Babo, em frente ao quartel da PE. Atravesse a Maracanã em direção à rua Pinto de Figueiredo e entre à direita na rua Antônio Basílio, rua mais-que-arborizada mas que não tem, a bem da verdade, nada de muito interessante, salvo a sombra que te conduzirá até a José Higino (no final da Antônio Basílio) e uma ou outra casa bastante bonita de se ver.

Chegando na José Higino, siga - contra o fluxo do trânsito - pela avenida Maracanã. Você passará a rua João da Mata e deverá entrar, à esquerda, na Dona Delfina. Siga direto até a Conde de Bonfim e siga à direita na mão do trânsito. Você vai dar de cara com a rua Uruguai. Ótimo. Atravesse e sente-se no OTTO, numa mesinha do lado de fora, sem pressa. Peça uma porção de lingüiças alemãs com mostardas variadas e um chope Stella Artois, ou mesmo Brahma, se você preferir. Ambos são estupendamente bem tirados!

A Uruguai é uma rua feia, sabe? Grande, larga, mas aquele cruzamento com a Conde de Bonfim é justamente o ponto no qual ela fica mais bonita, com muitas árvores, muita gente passando, e esse tempo no OTTO tem tudo pra ser uma grande pedida. Não coma demais, minha sugestão de almoço é noutro lugar!

Saindo do OTTO, dê um pulinho na delicatessen NIGRI, na rua Uruguai mesmo, coladinho ao bar-restaurante. Há uma variedade infinita de cervejas, petiscos de comer de joelhos, e o Julio, um dos donos, extremamente simpático, vai adorar poder orientá-lo nas compras das coisinhas que podem transformar sua noite, já em casa, em algo bastante mais agradável.

Saiu dali, passe em frente ao OTTO novamente, não caia na tentação de mais-um, dobre à direita e siga pela Conde de Bonfim. Ande até a rua Garibaldi. Na esquina você já verá o lindíssimo casarão que hoje abriga o CENTRO DE REFERÊNCIA DA MÚSICA CARIOCA. Quem sabe você não dá sorte e dá de cara com uma programação de primeira praquela tarde?

Visite-o, apenas para conhecer os jardins, a casa por dentro, sua arquitetura, sem contar que há sempre uma exposição acontecendo! Saindo dali, entre na Garibaldi, rua onde reside o poeta-maior da Tijuca, Aldir Blanc. Dê uma parada, rápida, no legendário BAR DA DONA MARIA, que já teve dias mais felizes mas que ainda guarda interessantíssima atmosfera. Repare no pé-direito, no velho balcão de mármore, na caixa registradora, descanse enquanto bebe uma cerveja de pé, diante do balcão, olhando pra rua e pras moças que insistem em passar por ali provocando a gente...

Peça, no máximo, um pastel de bacalhau (absurdamente gostoso!) ou um croquete de carne para acompanhar as cervejas, sem abusar!

Parta dali pela Garibaldi, na mão do trânsito. Você passará pelo histórico rio Maracanã, meu rio, o que corre e me socorre, injentando em minhas veias seu soro poluído de pilha e folha morta, apud Aldir Blanc!!! Repare nas árvores imensas que dão aspecto de túnel à rua. Vai que você dá sorte e dá de cara com o Aldir passeando por ali com seu cachorro, ou mesmo na janela espiando o movimento?

Chegando na esquina da Pinto Guedes, dobre à direita. Você vai passar pela rua Guajaratuba (à sua direita), a que viu o poeta Paulo Emílio da Costa Leite, parceiro do Aldir em inúmeros sucessos, ficar enfeitiçado. Siga em frente, não entre na Guajaratuba, mas entre na primeira à esquerda, na rua João Alfredo, outro paraíso perdido na Tijuca. Rua de paralelepípedos, muitas casas, muitas árvores, e ande até o final, quando ela desemboca na Espírito Santo Cardoso. Ali, na esquina, beba uma - apenas uma! - cerveja num pé-sujo desses sem nome (eu não sei, confesso, o nome do buteco). Terminou? Siga pela Espírito Santo Cardoso na contramão do trânsito.

Daí você entrará na primeira à direita, rua Oliveira da Silva, novo oásis. Muitas casas, algumas enormes, e você vai cair na Praça Xavier de Brito. Dobre à esquerda, passe pelo REI DO BACALHAU (um chope e um bolinho!), depois pelo BAR DO MANEL (uma cerveja apenas!), e sente-se na esquina, no BAR DO PAVÃO.

Ali, diante do casal que comanda a casa, Dona Jô e o Pavão, caia dentro da feijoada, saborosíssima!!!!! Peça a ele uma mesinha diante da casa da Dona Olívia, figura querida na região, que mora numa casa dessas de dar inveja, e que simplesmente adora que sua porta de entrada fique lotada - literalmente lotada - de gente falando alto, bebendo e comendo bem, celebrando a vida que ela tanto colore!

Vai que você dá sorte de conhecer a dona Olívia? Peça autógrafo, diga que me conhece, e mande um beijo meu pra ela, do tamanho da Tijuca!

Até.

28.5.08

UM PASSEIO PELA TIJUCA

ESTE TEXTO, AGORA, PODE SER LIDO AQUI.

27.5.08

BOTEQUIM DO BRUNO

O camarada Bruno Ribeiro, parceiro e amigo querido de Campinas, editor do indispensável PÁTRIA FUTEBOL CLUBE, blog por mim tantas vezes exaltado, anunciou ontem - e eu daqui comi mosca! -, em caráter irrevogável, o fim do espaço que a tanta gente encantou desde julho de 2006.

Entretanto, para regozijo de seus leitores, fãs e amigos (e eu me enquadro nas três categorias!), o Bruno não apenas decidiu manter o PÁTRIA FUTEBOL CLUBE no ar com todos os arquivos lá publicados, como também inaugurou - salve!, salve!, salve! - o BOTEQUIM DO BRUNO, leitura obrigatória desde já e já indicada no seletíssimo grupo dos blogs que indico, no menu à direita.

Todo mundo lá! Aqui, ó!

Ergo daqui, diante do balcão imaginário, o copo cheio de chope com espessa espuma torcendo por vida longa para mais essa empreitada desse brasileiro máximo.

Até.

MAIS SOBRE A TIJUCA

Ontem escrevi um texto que pretendia dissertar mais sobre a banalização da violência (tema batidíssimo, confesso) mas que terminou por ser, ainda bem!, uma ode à Tijuca, bairro onde nasci, cresci e onde vivo hoje, depois de cinco anos de auto-exílio no bairro da Lagoa, bairro belíssimo, é verdade (o mais lindo do Rio na insuspeitada opinião de meu mano Szegeri), mas sem um décimo do calor (literalmente) da Tijuca. Muitos comentários depois - leiam aqui - me veio a idéia de falar, mais, sobre o aprazível bairro na zona norte da cidade.

Nos comentários ao tal texto, chamado TIJUCA, respondendo a um e a outro, falei sobre os clubes portugueses, certo? Que tal vocês conhecerem, então, o CASA DA VILA DA FEIRA E TERRAS DE SANTA MARIA? Vejam, aqui, o site do fabuloso clube, que tem como sede um prédio belíssimo, antiqüíssimo (recuso-me a deixar de usar o trema), na rua Haddock Lobo. Igualmente imperdível, também, é a CASA DOS AÇORES, cujo site pode ser visto aqui.

Falou, também, Luiz Antonio Simas, exaltando as qualidades dos restaurantes da Tijuca. Vamos a alguns deles... O melhor japonês do Brasil, sem exagero, fica na Tijuca, mais precisamente na rua São Francisco Xavier, o MITSUBA, vejam o site aqui. Aliás, a título de curiosidade, no MITSUBA, onde já estive com ele dezenas de vezes, o Simas é tratado como se fosse o Imperador do Japão, tamanha a moral do malandro no pedaço. A melhor pizzaria de toda a cidade, disparado, é a O FORNO RIO, na Doutor Satamini esquina com a Domício da Gama, vejam aqui. Há ainda o OTTO, na sagrada esquina da Conde de Bonfim com a Uruguai, com mesinhas do lado de fora, chope de primeiríssima e tira-gostos de tirar o fôlego, vejam o site, pesadíssimo, aqui.

Você não é do Rio? Não conhece a Tijuca? Não esquente. Venha e hospede-se no monumental HOTEL BARILOCHE, o que é bom até no preço, com site que pode ser visto aqui (com destaque para o bonequinho de gelo que anuncia as vantagens do hotel...). Se você for um bocadinho mais exigente, opte pelo RIO TIJUCA HOSTEL, um albergue sensacional, numa casa ainda mais sensacional, na rua Araújo Pena, quase esquina com a (olha ela de novo!) Haddock Lobo! Vejam o site aqui.

A fim de conhecer a maior floresta urbana do mundo? Vá conhecer a FLORESTA DA TIJUCA, paraíso a menos de 15 minutos de minha casa... Vejam aqui e aqui! Vocês não conhecem o MARACANÃ, o Maior do Mundo (será sempre!)????? Fica na Tijuca, meus poucos mas fiéis leitores, e vocês podem ver detalhes sobre como conhecê-lo - se você não puder ir a um jogo de futebol! - aqui. Ah! E o CENTRO DE REFERÊNCIA DA MÚSICA CARIOCA, na rua Garibaldi? Não conhecem? Vejam aqui!

E as escolas de samba daqui? Começando pela minha, a ACADÊMICOS DO SALGUEIRO, aqui. A IMPÉRIO DA TIJUCA fica aqui.

O melhor dentista do planeta Terra? Mora e atende na Tijuca, no coração da Tijuca, na Praça Saens Peña, e atende pelo nome de Marcelo Alves Vidal (se ele me autorizar, dou, depois, seus telefones, o cara tem até UNIMED DENTAL!). O melhor sapateiro dentre todos? O Crispim, na rua Almirante Gavião, mesma rua do RIO-BRASÍLIA, meu buteco de fé que vende a melhor carne assada com batatas coradas de todo o mundo. O melhor vidraceiro? Fica na esquina da Haddock Lobo com a mesma Almirante Gavião, chama-se Dimas, e foi o homem que emoldurou a nota que ganhei de presente do Simas, como lhes contei aqui.

Amanhã, havendo tempo, continuo na mesma trilha.

Até.

26.5.08

A TIJUCA

É comum você ouvir dizer, por aí:

- A Tijuca? A Tijuca já era! A Tijuca é violentíssima!!

Quietíssimo durante o feriado e o final de semana, dei de ler os jornais.

Uma reclamação por conta de um carro com som alto, tocando funk, em Volta Redonda, diante de um bar, resulta na morte de um rapaz e em ferimentos à bala em seu pai (eu conheço o pai). Um acontecimento besta, no trânsito, termina com um homem, o pedestre diante de seus dois filhos, com afundamento de crânio por conta de pancadas dadas com uma chave-de-roda pelo destemperado motorista, na Tijuca (diga-se). Um churrasco de estudantes, uns quarenta, no Cosme Velho, zona sul do Rio, é interrompido por quatro assaltantes armados que fazem uma limpa na casa e nos pertences dos garotos. Um grupo de bandidos invade, na pacatíssima Itaipava, na região serrana do Rio, uma pousada premiadíssima e destrói o repouso dos hóspedes que buscavam refúgio durante o feriadão. Outro imbroglio no trânsito, em São Paulo, tem um morto a tiros depois de uma discussão e bate-boca. E eu poderia esticar este parágrafo até o infinito, como dizem as crianças. A violência não cessa, a violência não cede, a violência se espalha e não vê fronteiras - há muito tempo.

Eis a razão, precípua, pela qual acho de extremo mau gosto a perseguição que sofre a minha Tijuca, a Tijuca do Felipinho Cereal, a Tijuca de Luiz Antonio Simas, a Tijuca de minha infância, de meus irmãos e de meus pais, a Tijuca de Aldir Blanc, a Tijuca do Salete, do Rio-Brasília, do Galeto Columbia, do Columbinha, do Fiorino, do Mitsuba, do Otto, do Bar do Chico, do Bode Cheiroso, do Aconchego Carioca, a Tijuca do Cesinha Tartaglia, do Gabriel Cavalcante, a Tijuca do Basile, grande figura da Muda, pedaço da minha Tijuca, a Tijuca do Bar do Momo, e eu poderia - como no parágrafo anterior - listar dezenas, centenas, milhares de motivos para que a Tijuca esteja sempre na mais alta conta no coração do carioca.

Eu poderia, numa tentativa tosca de imitar o poeta, dizer que a Tijuca tem o desenho do meu coração e da minha alma, e que a Conde de Bonfim é a veia por onde corre o sangue que me bombeia a vida e que deságua - numa geografia que só o tijucano domina - no Largo da Segunda-Feira, onde vira Hadock Lobo (descendo), depois de ser Doutor Satamini até a Praça Saens Peña (subindo) - onde volta a ser Conde de Bonfim até a subida do Alto da Boa Vista. Poderia enumerar as veias que cruzam a aorta da zona norte, e eu estaria falando das ruas que me viram crescer, Barão de Mesquita, São Francisco Xavier, Heitor Beltrão, Professor Gabizo, Hadock Lobo, Mariz e Barros, General Canabarro, Afonso Pena, Martins Pena, Pardal Mallet, Vicente Licínio, Ibituruna, Praça da Bandeira, e dos morros que dão à Tijuca esse aspecto de vale que somente encanta quem nele penetra com olhos de ver, Borel, Formiga, Turano, Casa Branca, São Carlos, Chacrinha, Salgueiro... E novamente, como nos dois parágrafos anteriores, poderia listar todas as ruas da Tijuca e todos os seus morros e suas colinas, dando um tom de infinito a tudo isso.

A Tijuca é o bairro-mãe, que acolhe o filho no berço cercado de morros e o vê crescer, ainda que longe, ainda que tendo optado por viver longe, esperando o dia da volta, ainda que pra uma visita, que sempre há de vir.

Salve a Tijuca!

25.5.08

O FUTEBOL E AS NOVAS GERAÇÕES

Desde a quinta-feira passada, dia seguinte ao fabuloso jogo entre Fluminense e São Paulo no Maracanã que decidiu uma das vagas para as semifinais da Libertadores (escrevi sobre o jogo aqui), que a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro é uma cidade cheia de crianças (crianças mesmo, não refiro-me aos adolescentes) trajando, orgulhosas, a camisa do tricolor das Laranjeiras. Refiro-me a bebês de colo, mesmo!, a crianças com - o quê? - dois, três, cinco anos de idade, estampando no peito e no sorriso a alegria de um vencedor, de um torcedor apaixonado literalmente em formação. Porque são crianças, invariavelmente um se dirige a elas:

- Dá-lhe, Flusão!

Eu mesmo, ontem, caminhando pela Tijuca, deparei-me com um molecote de mãos dadas com a mãe, vestindo a camisa do Fluminense, numa alegria dessas de transmitir euforia. Disse a ele:

- Parabéns, garoto! Você viu o jogo?!

E ele, quicando:

- Vi, vi, vi!

E seguiu gritando o nome do time, despedindo-se efusivamente com a mão solta dando adeus e olhando pra trás.

O que quero lhes contar - e abro o BUTECO neste domingo pra evitar poeira demais sobre o balcão - é que essa paixão pelos clubes é inoculada nas novíssimas gerações apenas por conta dos grandes feitos desses mesmos clubes, por conta das vitórias heróicas (como a de quarta-feira) desses clubes, por conta dos dramas e das tragédias dos jogadores, protagonistas do espetáculo que, aqui no Brasil, ganha cores e forma de liturgia.

De nada adiantam - e eis aí a beleza da coisa toda, a beleza da espontaneidade que rasga dossiês e cadernos de intenção - propagandas intensivas, campanhas milionárias e trilhas sonoras sem sentido se não houver, precipuamente, o herói de carne e osso desafiando a física e seu próprio físico durante a partida, se não houver vinte e dois corações pulsando entre as quatro linhas, se não houver o quadragésimo sexto minuto e se não houver o roteiro, por ninguém conhecido, prevendo o gol que ninguém imagina, o lance inacreditável que decidirá o destino do clube numa competição e o destino - eis a belezura - de uma geração que ali, naquele instante, naquele momento, naquele segundo, talvez sem sentir, celebra um pacto de paixão que durará por toda a vida.

Até.

22.5.08

UM SENHOR JOGO

Assisti, ontem, confortavelmente e em casa, ao jogo entre o Fluminense e o São Paulo, no Maracanã, na disputa por uma vaga nas semifinais da Libertadores.

Eu, em casa, confortavelmente, e com uma ponta de inveja - eis a confissão pública que faço pouco menos de 24 horas depois - dos mais de 80 mil torcedores que davam ao Maracanã, na noite de quarta-feira, véspera de feriado de Corpus Christi, cara, jeito, cheiro, cores e dores de um domingo.

Não vou, eis que me falta técnica para tal, comentar o jogo, lance por lance, atuações individuais, eventuais nós táticos, o acerto dessa ou daquela substituição, nada disso. Vou - como é rotina no BUTECO desde que ele foi aberto, já se vão mais de quatro anos - tentar lhes dizer o que se passou no meu peito sob o ângulo, a ótica, a vibração da paixão que vi, a cores, pela TV.

foto de Marcelo Theobald publicada no GLOBO ON LINE de 22 de maio de 2008

Vi um Fluminense rodrigueano, ontem, definitivamente. Um Fluminense trágico, um Fluminense mágico, um Fluminense com compromisso com a tragédia que eterniza uma partida de futebol e que faz daqueles 90 minutos página de leitura obrigatória para as futuras gerações, um Fluminense fadado à vitória mais doída, condenado à vitória que mata, um Fluminense de véspera de Corpus Christi, eis que ali, diante de 80 mil fiéis, aos 46 minutos do segundo tempo (como sói acontecer nas partidas fatais que viram História maiúscula), fez-se presente o corpo do Cristo (e ai daquele que me apontar o dedo acusando-me de heresia ou desrespeito).

Vencendo por um a zero, o Fluminense, com gol de Washington (nome que um rubro-negro não esquece nem à fórceps!!!) chegou-se ao intervalo. Veio o segundo tempo e o empate do São Paulo (gol de Adriano), que eliminava o tricolor das Laranjeiras. Chegou o vigésimo-sexto minuto de jogo e Dodô, um esteta, fez um gol feiíssimo (o que é raríssimo) que ainda não garantia a classificação do Fluminense.

Eu disse a vocês, quando comecei a escrever essas mal-traçadas, que assistia à partida, em casa, e confortavelmente.

Ocorre que a partir desse segundo gol do Fluminense, meus poucos mas fiéis leitores, fui um homem em estado agudo de tensão.

Disse, à certa altura, pra mim mesmo (o que enfraquece o que vou dizer, eis que a única testemunha sou eu e apenas eu):

- O Fluminense fará o terceiro gol.

E disse isso mesmo, assim, no futuro do presente, dando à fala sem testemunha alguma, um tom de predição infalível.

E houve um escanteio marcado aos 45, 46 minutos do segundo tempo, tempo marcado - quem acompanha futebol sabe disso - para os grandes acontecimentos.

Thiago Neves ajeitava a bola, os mais de 80 mil torcedores em comovente e contagiante ebulição acreditavam no milagre de Corpus Christi, fiéis ou não, crédulos ou céticos, todos irmanados nas três cores que traduzem tradição, e eu, em casa, contraído, crispado, e de olhos atentos aos homens na grande área em busca do salvador.

E eu vi - juro que vi! - o lance em câmera lenta. Vi quando o mesmo Washington do primeiro gol da partida subiu mais que todos, como o pão e o vinho nas mãos do bispo de olhos vermelhos na missa do Corpus Christi, e sacramentou (a remissão é proposital) a classificação do Fluminense às semifinais da Libertadores.

E eis o que eu queria lhes dizer desde o início: pode ser que me seja queimada a língua ou a ponta dos dedos que catam milho nesse teclado à minha frente, mas o campeão da Libertadores em 2008 será, qualquer que seja o resultado - se é que me faço entender -, o tricolor das Laranjeiras.

Até.

21.5.08

QUANTOS FREQÜENTADORES TEM O BUTECO?

(com um adendo, no final, por sugestão de um leitor assíduo)

Taí um troço que, a uns mais e a outros menos, acaba sempre ocupando a cabeça de quem escreve e mantém um blog: quantos me lêem? Eu, quero confessar a vocês, se não tivesse essa preocupação não manteria três contadores (GOSTATS, SITEMETER e EXTREME TRACKING) e um controlador de leitores online. Afinal de contas, a percepção de que a cada dia mais gente lê o que você escreve é o combustível para que a produção - digamos assim - não pare.

Há um ano, por exemplo, o BUTECO contava com 6.500 visitas por mês; hoje são em torno de 13.000, exatamente o dobro. De segunda a sexta-feira, 415 pessoas em média (e não visitas) batem ponto aqui no balcão. Aos sábados, domingos e feriados, a audiência cai para a casa dos 250, 300.

Acho muito. E acho muito porque as pessoas que aqui vêm - os contadores apontam isso - chegam ao balcão através de macanismos variados de pesquisa, sendo que as palavras "buteco", "edu", "rabada", "receita" e "boteco" são as cinco mais procuradas!!! Imagino que muita gente que chegue aqui através desses mecanismos de busca, dê uma xeretada no que vai nas prateleiras do estabelecimento, goste e vire um leitor constante.

Há, ainda, os que vêm por sugestão dos amigos que também mantêm blogs com links apontados para cá. O HISTÓRIAS DO BRASIL, de Luiz Antonio Simas (leiam aqui), arrasta pra cá, até o momento, 11,05% dos que chegam através desses links espalhados pela grande rede. Em segundo lugar, PÁTRIA FUTEBOL CLUBE, do Bruno Ribeiro (leiam aqui), com 9,58% das visitas. Em terceiro, o PENTIMENTO, do Marcelo Moutinho (leiam aqui), com 6,13%. Em quarto lugar, o ANHANGUERA, do Favela (leiam aqui), com 5,11%. Em quinto, de pertinho, SÓ DÓI QUANDO EU RIO, do Szegeri (leiam aqui), com 4,14%. Os outros dois que trazem pra cá mais de 1% dos visitantes, são o BOEMIA & NOSTALGIA, do Felipinho Cereal (leiam aqui) com 2,03% e o SAMBAS, BOEMIAS E VAGABUNDOS, mantido pelo Eduardo Carvalho e pelo Gabriel Cavalcante (leiam aqui) com 1,85%.

Assim, aos poucos, vai sendo tecida a teia que nos une a todos, ao vivo e a cores - como lhes disse ontem.

Até.

PS: e disse o Bruno Ribeiro, amigo querido, leitor assíduo do BUTECO...

"Sugiro, mano, que neste mesmo post você peça para que os leitores assíduos deixem um comentário. Qualquer comentário. Só para constar a presença. Porque a maioria nunca comenta e a gente, que escreve, fica com a sensação de estar falando só para os cinco amigos bebuns de sempre."

Portanto, se não lhes custar muito, meus poucos mas fiéis leitores, façam isso... Deixem um "alô", um "oba", um "olá", e isso bastará para que tenhamos, todos, noção do quanto de gente se acotovela, diariamente ou quase diariamente, aqui no balcão!

20.5.08

CARA NOVA, AOS POUCOS

O balcão do BUTECO vai ganhando, aos poucos, muito aos poucos mesmo, em razão da aguda falta de tempo que me assola nas últimas semanas, cara nova. Se vocês, meus poucos mas fiéis leitores, tiverem olhos de ver, perceberão que sumiram das prateleiras expostas para a clientela, mais precisamente do menu à direita, os links para o que eu chamava "barbaridades" e "atentados" cometidos por jornalistas que, sincera e francamente, não me tomam mais tempo. Quero me ocupar, depois de reabrir à vera o comércio, do que gosto e do que me dá prazer, e não mais do que me incomoda. Está estranhando, você? Vejo, daqui, embaçado no monitor à minha frente, o rosto de um ou de outro - o rosto do Bemoreira, principalmente! - balançando um não-gestual em sinal de reprovação. Mas é preciso que seja assim. As críticas mais vorazes, é evidente, permanecerão arquivadas no blog como retratos de um momento, apenas, eis que seria ilógico e incoerente, depois de tanto tempo, apagar o que não mais me apraz. Mas não ocuparão mais uma linha sequer, não pautarão um trago que seja diante do balcão imaginário. Assim como não me ocuparei, mais, das miudezas da vida cotidiana de minha gente, evitando, dessa forma, o que meu querido Luiz Antonio Simas já chamou de "momento CARAS do BUTECO". O Prata viajou? Boa viagem. É aniversário de um amigo? Parabéns. Jantei maravilhosamente bem ontem? Sorte a minha. Peixe morre pela boca. Foi preciso chegar aos 39 anos pra aprender lição tão básica... Mas nunca é tarde. Já, já, como já havia lhes adiantado, o BUTECO reabre com potência máxima, cara nova e novo espírito, mas com as mesmas características que permitiram a reunião de tanta gente bacana, ao vivo e a cores.

Até.

19.5.08

O CURIÓ

Ontem, ao me dirigir à feira de todos os domingos na espetacular companhia do meu sogro, o Comandante, ambos a pé, passamos diante do Bar Estudantil, na Hadock Lobo, e demos de cara com as duas portas de ferro arriadas e um papel, pregado com fita adesiva, onde se lia num manuscrito: "EM RAZÃO DO FALECIMENTO DO MEU CURIÓ, NÃO ABRIREMOS HOJE".

Lamentei, na hora, não estar com a máquina fotográfica, e o lufa-lufa do dia me impediu de lá voltar para fazer o registro.

Mas foi de uma beleza passarinheira, o episódio.

Ficamos - engraçado, isso! - eu e o Comandante, nos passos seguintes, comentando sobre esse amor, sobre essa devoção, sobre essa ligação intensa que temos, alguns, com as coisas mais simples da vida (como um curió), e sobre o quanto de gente jamais compreenderia o gesto, lindíssimo, de cerrar portas em respeito a uma dor que o mundo de hoje cada vez menos compreende.

Salve a Tijuca e a zona norte, onde um curió ainda é capaz de abalar as estruturas de um homem e de uns passantes que testemunham, por escrito, esse abalo - repetindo - passarinheiro.

Até.

16.5.08

ROMANCE DE DOMINGO NA TIJUCA

Em 11 de fevereiro de 2008 escrevi o primeiro ROMANCE DE DOMINGO NA TIJUCA, leiam aqui e em 19 de março de 2008 escrevi o segundo ROMANCE DE DOMINGO NA TIJUCA, leiam aqui. Abril passou e eu não tive a oportunidade de seguir pela mesma linha, mantendo então a regularidade dessa série que eu, particularmente, eis a confissão pública que faço, gosto muito. Mas como no domingo, dia das mães, saindo da feira, passei de passagem pela mágica esquina da Pardal Mallet com a Afonso Pena e presenciei, in loco, fabulosa história, quero lhes contar hoje sobre ela, cravando, assim, o terceiro episódio da série.

Encostei-me no balcão, pousando as duas bolsas de palha cheias no chão, e pedi uma Brahma ao Chicão. Enquanto ele me servia, mandou a frase:

- Já viu o Ronaldinho ali? - e apontou para uma mesa bem na extremidade da esquina.

À mesa, um coroa na casa dos sessenta anos diante de uma mulher que não engana nem recém-nascido: traveca!

Disse eu, ao Chicão:

- Quem é o coroa?

- Mora ali em frente, quase na praça. A boneca chama-se Robério, trabalha na borracharia lá da Heitor Beltrão, sabe aquela encruzilhada depois do rio? Pois é lá. Quando se veste desse jeito quer ser chamada de Juliet, assim mesmo, com sotaque francês... Vê se pode!

- E o coroa? Tá de enganado ou sabe? - perguntou um camarada que já bebia no balcão quando eu cheguei.

- Sabe, sabe, sabe, sim! Mas conheceu Juliet hoje...

E ficamos ouvindo, dentro daquele silêncio que as manhãs tijucanas oferecem naquela esquina, o papo:

- Mas... - pigarro - ... quanto você cobra?

- Depende, amor...

- Diga, diga...

- Você quer que eu seja ativa ou passiva?

- Passiva, evidente. Eu te como.

- Cem reais.

- Hum. Fechado. Lá em casa?

- Pode ser.

O coroa fez sinal pro Chicão, disfarçamos todos, e ele pediu dois conhaques. Foi servido e continou:

- Qual sua idade?

- 28.

- Hum...

- Peludo?

- Lisa! Lisa! Não sou peluda!

Percebendo o erro do gênero, desculpou-se e continuou:

- Sei... Lisa naturalmente ou você se depila?

- Depilo, né amor?

- Hum.

Deu mais um golinho e disse, tímido, querendo impactar a moça com a engenhosidade de sua frase:

- Hoje é meu aniversário. Vou me dar você de presente...

- Obrigada.

- E escuta... Lisinha mesmo, né? Detesto pêlos!

- Lisinha.

- Hum. E me conta... Quando faz anos?

- Uma vez por semana! Eu garanto! Cu lisinho, cu lisinho!

Eu, Chicão e o companheiro de balcão não conseguimos mais disfarçar.
Até.

13.5.08

DA SÉRIE "CURIOSIDADES"

Foi em 18 de agosto de 2006, há menos de dois anos, portanto, que Luiz Antonio Simas, hoje meu querido amigo e parceiro de todas as horas, deu seu primeiro pitaco no balcão do BUTECO. Foi aqui, no texto FURANDO O BLOQUEIO, publicado no mesmo dia.

Em 18 de setembro de 2006 escrevi PRATA QUE VALE OURO (aqui), em 20 de setembro escrevi LENDAS E NOSSAS ESPERANÇAS (aqui) e em 21 de setembro LENDAS E NOSSAS ESPERANÇAS - PARTE II (aqui).

Nas três histórias, escritas menos de um mês depois de meu primeiro encontro ao vivo e a cores com o Simas, a presença do malandro que se tornaria - vocês que me lêem sabem! - mais-que-presente.

Até.

10.5.08

DA SÉRIE "CURIOSIDADES"

Como eu ando assim - como dizer? - com saudade de tudo e de todos, andei vasculhando, desde hoje cedo, o que expus, ao longo de mais de quatro anos, aqui no balcão. E deparei-me, há pouco, com um texto, de maio de 2005, contando sobre meu primeiro encontro com o Zé Sergio. Notem que o caboclo, que me foi apresentado pelo Augusto, - que havia estado em minha casa dias antes, leiam aqui - já mostrou-se uma figuraça impagável, tanto que a trago junto de mim até hoje e para sempre.

Foi NO CLUBE RENASCENÇA, em 30 de maio de 2005. Leiam aqui.

Até.

QUEM DIRIA!!!!!

É de se comemorar o que diz Moacyr Luz, hoje, na nota publicada na coluna GENTE BOA, do SEGUNDO CADERNO de O GLOBO.

Depois de ter dito, em entrevista à VEJA, sobre o Antônio e o Belmonte (criador e criatura), "Ficamos amigos. Ele faz sucesso porque descobriu a tempo que aquele boteco com banheiro sujo e croquete de anteontem já era" (vejam aqui), é significativa a guinada mais à esquerda, digamos assim, do Moacyr. Esse "a tempo", em vez de "há tempo" é erro da VEJA que mantenho por ser preciso do início ao fim. E é preciso, às vezes, expôr no balcão a qualidade dos revisores das redações de hoje em dia.

publicada no SEGUNDO CADERNO, de O GLOBO, em 10 de maio de 2008

Resta saber se o festival, os organizadores, os curadores e os patrocinadores irão resistir à pressão do GRUPO BELMONTE e seus congêneres.

Até.

7.5.08

EM REFORMA

Excesso de trabalho que gera agudíssima falta de tempo, agudíssima falta de tempo que exige que sejam priorizadas as tarefas mais urgentes e as mais imprescindíveis, imprescindibilidades que impedem, infelizmente, que esse humilde dono deste humílimo buteco - que lhes escreve hoje - continue batendo ponto diariamente, incansavelmente, como faço há anos, no balcão imaginário - ao menos por enquanto, até segunda ordem.

A audiência só faz aumentar, mês a mês (vejam aqui!!!), a cada dia novos fregueses pousam cotovelos no balcão de mármore, alguns deles viram (como de fato alguns viraram) fraternos amigos, e não é exatamente fácil, do ponto de vista afetivo mesmo!, decidir baixar as portas de ferro para uma ampla reforma no estabelecimento.

Mas é preciso.

Torço para que não parem de chegar curiosos e para que sejam curiosos os que já são leitores e que se habituaram a baixar por aqui em busca de humor, precipuamente de humor, escarafunchando, a fundo, os mais de 950 textos expostos nas paredes, nas estufas, nas geladeiras, nos painéis publicitários do buteco.

Pouca gente sabe, mas no alto, à esquerda, há uma janela, ao lado do símbolo BLOGGER, na qual se pode escrever qualquer palavra, qualquer frase, que pode ser procurada clicando em PESQUISAR BLOG. Façam isso. É um exercício, garanto, divertido.

Sempre que houver tempo - tenho certeza de que não resistirei a isso... - abrirei a portinhola no meio da porta de rolo de ferro pra dar um recado, mínimo que seja.

E, por fim, um recado e uma promessa...

O BUTECO não foi vendido para nenhuma rede de franquia de botequim! Não será descaracterizado. Não será reformado a ponto de perder suas características. Mas voltará, tenho certeza, ainda mais animado, ainda mais tumultuado, com ainda mais bate-boca, com a verdadeira cara do mais autêntico buteco brasileiro, carioca por excelência.

Até.

6.5.08

MEU PAI É O MAIOR

Vocês que me lêem estão carecas - mais que o Bemoreira, o Simas e o Zé Sergio juntos - de saber. Tenho verdadeira devoção por meu velho pai. Isaac Goldenberg é um homem capaz de gestos como o que teve ontem e que vou lhes contar agora. Um gesto que parecerá a muitos de vocês uma tremenda besteira, mas que no conjunto de gestos de meu pai desde antes de eu nascer tem um significado tão bonito, mas tão bonito, que eu, um homem dado a derrames emocionais, tive medo de morrer, ontem, de tão emocionado que fiquei quando ele me estendeu o presente - já lhes conto o que é! - e evitei pular em seu pescoço, dar-lhe um abraço forte e dizer, olho no olho, o quanto o amo - que foi o que tive aguda vontade de fazer.

Vou lhes contar.

Há coisa de uns dias, mais precisamente no dia 25 de abril, recebi a seguinte mensagem, pelo celular, do meu querido mano Szegeri. Dizia assim:

"Chorei ridiculamente no barbeiro hoje ao constatar, subitamente, que ele é parecido com a minha vó que já morreu. Quanto mais ele perguntava o que estava acontecendo, mais eu chorava..."

Tenho a mensagem arquivada em meu celular pra quem quiser ver! - já que parece, confesso, mentira.

Vejam vocês que beleza! O sujeito está lá, estacado e fincado na cadeira do barbeiro, aquele cheiro mentolado tomando conta do ambiente, os olhos cravados no espelho mofado à sua frente, o cabeça branca manuseando pincel e navalha, quando, subitamente (valendo-me da palavra usada pelo homem da barba amazônica), dá de cara com a avó afiando a navalha na tira grossa de couro que pende do encosto da cadeira e chora, efusivamente, misturando as lágrimas à espuma, as lágrimas ao sangue que brota do corte feito pelas mãos trêmulas do barbeiro, até que sente as mãos do homem, cheias de água de colônia, dando-lhe tapinhas na face lenhada e perguntando:

- O que está acontecendo?

O sujeito chora mais, paga o serviço e parte, nostálgico em alto grau. Vamos voltar à história de meu pai.

Mostrei, é evidente - eu sou uma espécie de outdoor da vida de meus amigos -, a mensagem pra meu velho pai.

Ele, como sempre:

- Grandes merdas... Você e o Fernando choram à toa... Por que é que ele te mandou isso?!

Foi quando eu contei.

- Pai... é que hoje, voltando de táxi pra casa, chorei ouvindo o...

- Sabia! Puta que os pariu! Vocês são doentes!

- Não quer saber?!

- Conta. - e serviu-se de uma dose tripla de Famous Grouse, que papai bebe uma garrafa de Famous Grouse e uma de Red Label por semana; sozinho!

- Não vai me servir? - provoquei.

Enquanto derramava uísque em meu copo, soprou (estou imitando, deslavadamente, meu ídolo):

- Desembucha, cara!!!

- Então... o motorista tava ouvindo Benito di Paula...

- Meu Deus... - gemeu mexendo o gelo com a ponta do dedo médio da mão direita.

- Daí ouvi a primeira, a segunda, e quando ele começou a terceira faixa eu danei de chorar... O motorista perguntou se eu queria que ele desligasse o rádio e eu disse que não, que eu adorava o Benito di Paula, que ninguém mais ouve o Benito di Paula, e ele disse que eu era o primeiro passageiro fã confesso do Benito, como ele, e eu perguntei onde ele comprara o CD e ele me disse que nas Lojas Americanas...

- Meu Deus... - gemeu servindo-se de mais uma dose.

- Daí mandei uma mensagem pro Szegeri, que por sua vez mandou-me essa em resposta... Eu escrevi o seguinte... - e estendi o celular com minha mensagem pro meu pai.

Ele leu em voz alta:

- "Não consigo parar de chorar. Estou ouvindo Benito di Paula no táxi.".

Meu pai, então, me disse:

- Leia de novo a mensagem do Szegeri.

Eu li.

- "Chorei ridiculamente no barbeiro hoje ao constatar, subitamente, que ele é parecido com a minha vó que já morreu. Quanto mais ele perguntava o que estava acontecendo, mais eu chorava...".

E ele fez a pergunta que fez a Dani e a mamãe rolarem de rir:

- A avó dele parecia com o Benito di Paula?!

Explicado a ele que não, que meu mano paulista referia-se à semelhança entre a avó e o barbeiro, ele grunhiu balançando a cabeça:

- Vocês são doentes... - e chorou, literalmente, de tanto que também riu.

Daí mudamos o assunto, passamos a falar sobre sei-lá-o-quê e seguiu-se a noite. As noites, aliás, passadas no apartamento de meus pais, no aprazível Alto da Boa Vista, são sempre fabulosas, como eles dois.

Ontem à noite, como sempre às segundas-feiras, pra lá parti com minha Sorriso Maracanã. Não encontramos, como de costume, Fefê e Lina (alegando cansaço), que perderam um verdadeiro banquete armado por minha mãe. Vai daí que ficamos ali comendo e bebendo a provisão para seis pessoas, quando éramos, então, apenas quatro.

Uísque, uns belisquetes, vinho tinto, o jantar, a sobremesa, o licor de depois, o café, tudo embalado pela voz do Benito di Paula.

Assim que cheguei, com um sorriso escancarado (meu pai é um homem que, graças aos deuses, sorri cada vez mais), meu pai me entregou um CD:

- Toma... Você não disse que gostava? Procurei em toda a Praça Saens Peña e não encontrei... Claro, né? Só você ainda procura pelo Benito di Paula... Baixei 22 músicas pela internet e gravei pra você...

Até.

5.5.08

BICAMPEÃO 2007/2008

Chegou ao fim, ontem, o Campeonato Estadual do Rio de Janeiro (não é possível chamar de "Campeonato Carioca" se jogam Cardoso Moreira e Duque de Caxias e não o São Cristóvão, se há Macaé e não há Bangu ou Olaria). Flamengo e Botafogo fizeram ontem, diante de 80 mil pessoas, mais uma final eletrizante e o Flamengo, com a incontestável vitória de 3 a 1, conquistou seu trigésimo título estadual alcançando a marca do Fluminense, o que já dá ao Estadual 2009 mais um atrativo.

Eu disse 80 mil pessoas e confesso publicamente: eu não estava entre as 80 mil pessoas.

Eu não estava entre as 80 mil pessoas e você dirá (ouço daqui a emenda):

- Estava no Rio-Brasília, como sempre...

E eu responderei que não, semi-envergonhado.

Como minha queridíssima cunhada, Magali, chegou de viagem ontem com o marido, o Ricardo, e como eu morria de saudade, e como estar com as meninas, suas filhas, Maria Helena e Ana Clara, é sempre um deleite, e como eu prometera um spaghetti com camarão ao alho e óleo a eles, e como havia ainda a promessa da companhia sempre impagável de meus sogros, Comandante e Dona Sá, mandei-me pra Barra da Tijuca (Barra Cada Vez Menos da Tijuca) às duas da tarde para de lá assistir à partida. E eis o que eu queria lhes contar.

Não há um único rubro-negro na Barra. Se há, esse (ou esses) rubro-negro estava entre os 80 mil presentes ao Estádio Mário Filho.

Quando do gol do Botafogo senti o prédio tremer (eles moram no vigésimo-segundo andar). Ouvi fogos. Ouvi gritos. Houve festa.

Veio o segundo tempo, e veio o gol de empate do Obina, houve o segundo gol do Tardelli e por fim, já no finalzinho, o gol fecha-o-caixão, novamente do Obina.

Eis então a verdade: apenas eu e minha menina comemorávamos.

O que havia (éramos espectadores privilegiados daquele arranha-céu), por todo o bairro, era um silêncio aterrador.

E isso me deu - vocês hão de compreender o por quê - um imenso e intenso prazer.

Após o jogo chegaram todos, fui ao fogão (sem maldade, sem maldade!), preparei o jantar e ergui, de longe, um brinde aos meus queridos que, do Rio-Brasília, me ligavam inconformados com o que pareceu, a eles, um gesto incompatível comigo: Flavinho e Victinho (que assistiram juntos, de lá, à peleja), Digão, Candinha e Bemoreira (que foram pra lá, depois do jogo, que assistiram in loco).

Saudações rubro-negras a todos!!!

Fecho, hoje, mandando um forte abraço aos palmeirenses que conheço e que estão de parabéns pela conquista do Paulista 2008 (em ordem alfabética para não ferir suscetibilidades): Bruno Favela, Fernando Borgonovi, Fernando Szegeri, Iara Szegeri, todos de São Paulo, e o Imperador, do Rio-Brasília.

E um carinhoso beijo na aniversariante de hoje, minha amiga alvi-negra, Beth Carvalho!

Até.

4.5.08

VALE MUITO A PENA LER

Taí uma grande dica de leitura! Abri hoje cedo o PÁTRIA FUTEBOL CLUBE, fundamental blog de meu queridíssimo Bruno Ribeiro, e dei de cara com um texto que classifico como antológico.

Chama-se SAUDADE e foi escrito - tenho esse misto de certeza e vaidade - um pouco como fruto da conversa que tivemos, eu, ele e Luiz Antonio Simas, no Rio-Brasília, na quarta-feira da semana passada, quando demos, eu, Flavinho, Vidal e o Simas, a sorte de poder abraçá-lo durante sua rápida passagem pelo Rio.

Brevíssima pausa.

Fiquei felicíssimo, na noite de quinta-feira, primeiro de maio, quando meu celular estrilou carregando uma mensagem enviada por meu irmão-siamês, o Fefê. Dizia o seguinte: "O Bruno ainda está no Rio? Quero conhecê-lo.".

Comove-me, profundamente, essa intenção de união dos iguais. Não foi possível, dessa vez - ainda! -, promover o encontro desses dois craques que me enriquecem com sua amizade. Mas será em breve, é a promessa que me faço!

É um pouco sobre isso, também, sobre a união e a reunião dos homens de bem, que o Bruno escreve no emocionadíssimo texto que recomendo vivamente.

Leia-o aqui.

Até.

2.5.08

É ELE! É ELE!

Cliquem aí na imagem e leiam vocês mesmos a entrevista (nojenta) com o principal destruidor dos verdadeiros butecos cariocas. Eu não tenho o que dizer, sinceramente. Só posso repetir o que diria meu querido Bemoreira:

- Que nojo!

Notem (minha única intervenção) como ele se refere aos imóveis e negócios que ele compra... (o que acabou de fazer com a Casa Brasil).

publicado na revista RIOSHOW, de O GLOBO, em 02 de maio de 2008

Ah, sim! E esse verdadeiro destruidor dos verdadeiros butecos cariocas é chamado, na capa da tal revista, de "agitador cultural". Que tal, hein?!

Até.

NÃO É POR NADA NÃO...

...mas... como diria meu saudoso e eterno Governador Leonel de Moura Brizola... francamente!

Eu, aqui no BUTECO, no dia 09 de abril de 2008, tristíssimo, publiquei BELMONTE RIMA COM DESMONTE (leiam aqui), denunciando a venda da Casa Brasil para os megainvestidores da REDE BELMONTE.

E somente em 30 de abril, como vocês podem ver pela imagem abaixo, o Juarez Becoza, do blog PÉ-SUJO, hospedado n´O GLOBO, noticiou o fato.

publicado por Juarez Becoza no blog PÉ-SUJO, do jornal O GLOBODei um furo, não?

Até.

DO DOSADOR

* a todos que - obrigado, desde já! - torceram pela plena recuperação do meu HD, que pifou como lhes contei aqui -, mandando emails a rodo, mais uma satisfação: desde hoje de manhã que já estou com uma máquina nova instalada em casa, mas sem os dados do pobrezinho, até segunda ordem... O bicho baixou mesmo numa espécie de hospital (não entendo patavinas desses termos...) que vai tentar, a fórceps, recuperar seus dados. Continuem na torcida!

* espero, de coração, que domingo seja domengo. Se eu não acreditava muito na capacidade do time enfrentar o Botafogo com força total em razão do desgaste evidente de uma viagem de ida e volta para uma partida pela Libertadores, no México, a pouco mais de 72 horas da decisão, depois da partida e da vitória de 4 a 2 sobre o América do México, com uma atuação bastante empolgante do time, acredito, agora, e muito, na conquista do Estadual 2008.

* não sei, sinceramente, o que mais está me dando nos nervos, ultimamente, na (cada vez mais pobre) imprensa brasileira... Se o caso da menina arremessada da janela em São Paulo ou se o episódio do jogador de futebol que foi parar num motel, na Barra da Tijuca, com três travestis... Não há nada mais importante acontecendo no Brasil, não? Ô, saco! E haja paciência!!!

* Compramos hoje, eu e a mulher que me ensinou a sorrir, para fazer a festa de duas sobrinhas amadas, Maria Helena e Ana Clara, com quem vamos nos encontrar no sábado à tarde, mangostim, granadilha, jatobá e laranja kinkan, frutas que elas - tenho certeza - jamais viram. Elas e nós, diga-se de passagem (e quase que num sussuro). Compramos, aliás, justamente por isso - enquanto lambíamos os beiços durante as provas!!! E dizendo serem para elas, disfarçamos a inconstetável verdade: somos crianças eternamente.

* Faz anos amanhã, dia 03 de maio (quando o BUTECO não vai abrir), minha irmãzinha querida, de quem tenho olímpica saudade mesmo tendo estado com ela há coisa de pouco mais de duas semanas, a doce Stê, companheira de meu mano Szegeri e mãe da Rosa. Sentimentos doutros tempos, não tenho dúvida, me unem a ela, pra quem mando daqui, de pé, diante do balcão imaginário, o meu melhor abraço, meu mais demorado e estalado beijo, minha torcida por muita saúde e muita coisa boa ao longo da longa vida que espero vê-la trilhando. Axé, Stê. Amo você.

Até.