Foi meu dileto amigo
Felipinho Cereal quem me cutucou virtualmente ontem no final do dia. Mandou-me o
link direcionado para a carta de uma leitora, que foi publicada no
blog sobre os bairros da cidade do Rio que o jornal
O GLOBO mantém no ar. A tal carta, na íntegra, pode ser lida
aqui.
Eu, hoje, suspendo as porta de aço do
BUTECO apenas para me dirigir à leitora, que assina
Nancy Aguiar. Compreendo, sinceramente, que cada uma das razões que, digamos, desiludiram a autora da carta, seja uma razão capaz de abalá-la e desequilibrá-la. Eu não a conheço, razão pela qual não posso querer saber mais do que suas palavras expõem, e suas palavras expõem uma pessoa triste com o destino dado ao bairro em que vive. O que não compreendo - e eis aí a principal razão pela qual dirijo-me a ela - é o título dado à carta -
A TIJUCA ACABOU! - e a forma como ela vê o mundo, e conseqüentemente o bairro onde nasci e fui criado.
Peço licença a meus poucos mas fiéis leitores para me dirigir diretamente à dona
Nancy.
A Tijuca, dona
Nancy, ainda é um lindo bairro. Permita-me listar algumas das maravilhas daqui: temos ruas mais arborizadas que qualquer outro bairro da cidade (pau a pau com o Grajaú, que é um apêndice da Tijuca!), temos a maior floresta urbana do mundo, a Floresta da Tijuca, temos vários pequenos bairros dentro da Grande Tijuca que dão à Tijuca uma cara multifacetada e cheia de microcosmos incapazes de macular o conjunto, e falo do Maracanã, da Aldeia Campista, da Muda, da Usina, pequenos vilarejos com ares de cidade pequena, ainda cheios de casas (a senhora conhece, por exemplo, a rua Caruso, a rua São Vicente, a rua Domício da Gama, a rua Almirante Gavião, a rua Alberto de Sequeira, ruas fabulosas com imensa maioria de casas?), ainda com muitas praças. Aliás, permita-me lhe recomendar a leitura de cinco roteiros de passeios dentro da Tijuca que preparei entre os meses de maio e junho deste ano (
aqui o primeiro,
aqui o segundo,
aqui o terceiro,
aqui o quarto e
aqui o quinto).
Não há mais
"cinemas maravilhosos" na rua, é verdade, mas em que bairro há? Os
shopping-centers, verdadeiras anti-cidades, gigantescas estruturas capazes de desestruturar a vida sadia de um ser humano, detêm hoje quase todos os cinemas da cidade, salvo raríssimas exceções. Ainda há lanchonetes famosas, dona
Nancy, assim como ainda há diversos clubes (o
TIJUCA, a
AABB, o
MONTANHA...).
Quanto ao bairro ter virado
"um mercado de rua aberto, cheio de camelôs, menores de rua desrespeitando tudo e todos, ladrões desenfreados, ruas desertas, favelas crescendo sem controle, e olha que as favelas são pequenas, seria fácil contê-las, comércio de rua acabado", discordo da senhora mais uma vez. A cidade do Rio de Janeiro, desgovernada há tantos anos, permitiu esse estado de coisas - não apenas na Tijuca.
O comércio de rua - citado em sua carta - aqui na Tijuca, por exemplo, mantém-se firme e forte, mesmo com importantes baixas de vez em quando... Ainda é possível comprar flores em lojas de rua, onde pode-se manter conta mensal, inclusive. Açougues, mesmo com o sumiço do glorioso
AÇOUGUE RECREIO (leia sobre ele,
aqui), há aos montes. Meu pai tem conta em um perto de sua casa, minha avó idem, e isso é comum em todo o bairro. Há sapatarias, vidraçarias, lojas de roupa, armazéns, pequenas quitandas, e é preciso, apenas, ter olhos de ver, dona
Nancy, para perceber que a Tijuca ainda é um bairro caloroso, humano ao extremo, onde o convívio com o próximo é fácil, é desejável, é característico de cada quarteirão daqui.
Creio que a senhora se entrega quando diz...
"Vou focar no meu quarteirão. Olhem quantas infrações, em todos os níveis, me deparo diariamente. Cruzamento da Maracanã com José Higino. Sinal avançado em qualquer hora do dia, retorno de quem vem da José Higino para a Maracanã, mesmo proibido, todos fazem, colocando pedestres em risco, Supermercado Extra (onde era a Fábrica da Brahma) abandonado, qualquer dia vai ter arrastão lá, com certeza, eles não tem e não nos dão segurança, menores de rua dormindo e tomando banho num cano aberto no Rio Maracanã, tiroteios ouvidos em qualquer horário do dia, Rio Maracanã fétido.".
Quem pode ser responsabilizado pelas infrações cometidas na sua esquina, dona
Nancy? Os motoristas, sem educação, os guardas responsáveis pelo controle do trânsito que não coibem as irregularidas ou o pobre bairro da Tijuca?! E o que tem o pobre bairro com o abandono do
SUPERMERCADO EXTRA? Os meninos de rua, dona
Nancy, estão em toda a cidade: na Tijuca, em Copacabana, no Leblon, no Centro, em Ipanema, e são todos filhos da pobreza que não merecem a atenção devida do poder público, não sendo - em absoluto! - um problema particular da Tijuca. O
EXTRA está abandonado? Não oferece segurança? Então, dona
Nancy, passe a ir ao
MUNDIAL da Matoso, o maior supermercado do mundo!!!!!
Os tiroteios não são - de novo - exclusividade nossa. E acho melhor a senhora não tentar macular o Rio Maracanã, hein! O Maracanã é nosso rio, é de onde provém o soro poluído que nos salva depois de cada porre, como cantaram os poetas capazes de ver a beleza correndo o bairro, cortando suas ruas e desagüando no mar.
Dê-se uma chance, dona
Nancy!
Olhe mais à sua volta e com mais amplitude.
No finalzinho de sua carta a senhora exalta duas pequenas belezuras que saltaram aos seus olhos que foram capazes, naquele instante, de ver o que o mais fabuloso bairro da cidade tem para nos oferecer.
Olhe permanentemente para o alto. Há um amigo meu, o
Rodrigo Ferrari, que sempre que vem aqui diz:
- A Tijuca tem o céu mais bonito da cidade!
Ande mais a pé. Evite o metrô. Evite o shopping. Já que a senhora deu a dica de onde mora... Caminhe pela avenida Maracanã em direção à praça Xavier de Brito. Sente-se no
BAR DO PAVÃO. Puxe conversa com ele, o
Pavão, e com a dona
Jô. Pergunte pela dona
Olívia. Converse com a dona
Olívia. Fale em meu nome.
Beba um chope com eles. A senhora não bebe? Não tem problema...
Caminhe pela praça, perceba tudo à sua volta, o chafariz, a escola municipal, o prédio tombado da
CEDAE, e volte embriagada de tanta boniteza e simplicidade para casa.
E aceite meu fraterno abraço. Do tamanho da Tijuca.
Até.