"Eu sou assim, e digo mais - convivo muito bem com as minhas idéias fixas." - "De vez em quando, alguém me chama de “flor de obsessão”. Não protesto e explico: - não faço nenhum mistério dos meus defeitos. Eu os tenho e os prezo. Sou um obsessivo. E aliás, que seria de mim, que seria de nós, se não fossem três ou quatro idéias fixas? Repito: - não há santo, herói, gênio ou pulha sem idéias fixas. Só os imbecis não as têm." - Nelson Rodrigues
30.9.08
O STUDIUM, O PUNCTUM E O OVO COZIDO
Meu queridíssimo Bruno Ribeiro é tão exagerado e tão amigo dos amigos, que conseguiu elevar um tijucano humílimo, um fotógrafo mais-que-amador e rigorosamente despretensioso, à categoria de autor de pelo menos duas fotografias objetos de estudo. Vejam o que disse o malandro em seu BOTEQUIM DO BRUNO:
"Trata-se do balcão de uma esquina carioca. Chove canivete. E a chuva imóvel, ao fundo, parece emoldurar a cena, além de ser uma pintura. Se a chuva, originalmente, não tem esta cor alaranjada, deveria ter. À esquerda está o paulistano Fernando Szegeri; ao seu lado está o carioca Luiz Antonio Simas; e, na extrema direita, o jornalista Zé Sérgio Rocha (na segunda foto, suas mãos e o ovo). Sabemos que a máquina cristalizou um momento único, em que algo fundamental estava sendo discutido. Em verdade, cantado: o samba-enredo que Simas fez para o Salgueiro. Samba este que, se os orixás e os jurados assim quiserem, irá descer com a escola na Marquês de Sapucaí, no Carnaval do ano que vem. Eis o nosso studium.
Mas Barthes ficaria confuso, talvez, na hora de encontrar o punctum da foto. Pontos de fuga não faltam: pode ser tanto a barba amazônica do Szegeri quanto a careca do Simas. Eu diria que o grande ponto de fuga, no duro, é o ovo cozido na mão do Zé Sérgio. Em ambas as fotos. Os teóricos dirão que o Zé Sérgio, ou melhor, o ovo do Zé Sérgio, prejudica definitivamente o studium da imagem. "Se aquelas mãos, colocando uma pitada de sal naquele ovo, não aparecessem na segunda foto (ouço daqui os semiólogos dizerem), esta seria uma grande foto". Eu digo, porém, que é justamente o ovo cozido nas mãos do Zé Sérgio Rocha que faz desta uma grande foto. O ovo dá o toque tijucano à obra-prima de Eduardo Goldenberg - é detalhe invasivo, tosco, alheio à emoção que a lente da máquina captura. O ovo acaba com qualquer tentativa de afrescalhar a análise sobre um simples bate-papo de buteco. O ovo, pois, é essencial para a compreensão não apenas da cena, mas da alma peculiar da Tijuca. Punctum, diria o Zé Sérgio, é o que se faz depois de comer o ovo..."
Leiam, na íntegra, aqui.
Até.
"Trata-se do balcão de uma esquina carioca. Chove canivete. E a chuva imóvel, ao fundo, parece emoldurar a cena, além de ser uma pintura. Se a chuva, originalmente, não tem esta cor alaranjada, deveria ter. À esquerda está o paulistano Fernando Szegeri; ao seu lado está o carioca Luiz Antonio Simas; e, na extrema direita, o jornalista Zé Sérgio Rocha (na segunda foto, suas mãos e o ovo). Sabemos que a máquina cristalizou um momento único, em que algo fundamental estava sendo discutido. Em verdade, cantado: o samba-enredo que Simas fez para o Salgueiro. Samba este que, se os orixás e os jurados assim quiserem, irá descer com a escola na Marquês de Sapucaí, no Carnaval do ano que vem. Eis o nosso studium.
Mas Barthes ficaria confuso, talvez, na hora de encontrar o punctum da foto. Pontos de fuga não faltam: pode ser tanto a barba amazônica do Szegeri quanto a careca do Simas. Eu diria que o grande ponto de fuga, no duro, é o ovo cozido na mão do Zé Sérgio. Em ambas as fotos. Os teóricos dirão que o Zé Sérgio, ou melhor, o ovo do Zé Sérgio, prejudica definitivamente o studium da imagem. "Se aquelas mãos, colocando uma pitada de sal naquele ovo, não aparecessem na segunda foto (ouço daqui os semiólogos dizerem), esta seria uma grande foto". Eu digo, porém, que é justamente o ovo cozido nas mãos do Zé Sérgio Rocha que faz desta uma grande foto. O ovo dá o toque tijucano à obra-prima de Eduardo Goldenberg - é detalhe invasivo, tosco, alheio à emoção que a lente da máquina captura. O ovo acaba com qualquer tentativa de afrescalhar a análise sobre um simples bate-papo de buteco. O ovo, pois, é essencial para a compreensão não apenas da cena, mas da alma peculiar da Tijuca. Punctum, diria o Zé Sérgio, é o que se faz depois de comer o ovo..."
Leiam, na íntegra, aqui.
Até.
SIMAS E MUSSA ENTRE OS CINCO!!!!!
O BUTECO, que já publicou ESSE É MEU SAMBA (aqui), AINDA O SAMBA DO SIMAS E DO MUSSA (aqui), AINDA O SAMBA DO SIMAS E DO MUSSA - II (aqui) e FESTA NA ALDEIA (aqui)- continua em festa.
O samba - de longe, o meu preferido - luta, no dia 04 de outubro, sábado que vem, ao lado de mais quatro concorrentes, pelo direito de disputar a finalíssima do dia 11.
Axé, queridos!
Até.
O samba - de longe, o meu preferido - luta, no dia 04 de outubro, sábado que vem, ao lado de mais quatro concorrentes, pelo direito de disputar a finalíssima do dia 11.
Axé, queridos!
Até.
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - X
Não é demais repetir! A série A TIJUCA EM ESTADO BRUTO nasceu e ganhou corpo por absoluto acaso, sem que nada, rigorosamente nada, tenha sido planejado. Eu, que sou modesto como um frade franciscano, recomendo a leitura de toda a série! Leiam aqui o primeiro da série, texto no qual conto o que vi e vivi numa pizzaria tijucana, O FORNO RIO, numa noite de domingo (domingo é o dia mais tijucano da semana!); aqui o segundo, que traz o relato de um jantar no melhor restaurante de comida italiana do país, tijucano, é claro, o FIORINO; aqui o terceiro, pequena descrição do encontro de minha mãe com uma amiga de há séculos de vovó; aqui o quarto, narrativa saudosa fruto de um encontro meu com meu concunhado, no SALETE, na Tijuca, evidentemente; aqui o quinto, no qual faço uma comparação entre a mãe judia e a mãe tijucana; aqui o sexto, sobre o simpaticíssimo assalto que sofreu vovó, há umas semanas; aqui o sétimo, sobre os vícios de minha avó; aqui o oitavo, sobre o jantar que ofereci à Lina, minha querida cunhada, no já citado melhor restaurante italiano do Brasil e aqui o nono, dando início aos relatos envolvendo o médico homeopata de minha família.
Hoje quero lhes contar mais sobre nosso médico homeopata, o doutor Mauro. O doutor Mauro, a quem a família inteira, vivos e mortos, atribui o milagre da cura de minha mãe - que teve tifo aos três anos de idade -, jamais admitiu amortecer, sobre seus próprios ombros, o peso que minha parentalha, na íntegra, tinha (e tem) como incontestável. Basta alguém soprar, baixinho que seja, o nome do doutor Mauro e começam os murmúrios com as mãos espalmadas para o alto - "Um santo homem!", "Um sábio!", "Um verdadeiro espírita!", "Salvou a Mariazinha!", "Trata da Maricota desde os três anos!", essas bossas médico-patrióticas.
Curioso é que meu pai, meu amado pai, que evidentemente não conhecia mamãe quando ela teve o tifo, nutriu, ao longo da vida (ainda nutre, o doutor Mauro é que não clinica mais), desde que o conheceu e à sua história, verdadeira adoração, febril idolatria, preocupante fixação no médico homeopata de hábitos simples.
Se você, meu caro leitor, esbarrar no meu velho pai por aí (papai anda pela Tijuca diariamente), diga que lê o BUTECO, abra um sorriso franco em direção a ele, pouse uma das mãos em seu ombro e pergunte:
- E o doutor Mauro, Isaac?
E você ouvirá:
- Tá fazendo uma tremenda falta...
Papai é desses homens que anda com frases prontas no bolso. Experimente:
- Issac?! E a Noêmia?
- Uma lutadora! Eu gosto da Noêmia! - e abrirá um sorrisão.
Pausa para lhes contar uma recentíssima de papai (como vocês sabem, escrevo em ritmo febril, quase-mediunicamente, então vocês têm de me perdoar, vez por outra, esses arroubos, essas idas-e-vindas, essas mudanças bruscas de assunto). Estávamos, no domingo passado, reunidos em torno desse portento que é Fernando José Szegeri, na casa de papai e mamãe, no Alto da Boa Vista. Mamãe preparou, para homenageá-lo, um cozido, a geladeira estava cheia de cerveja, de vinho verde (do branco e do tinto), o uísque jorrando das torneiras da sala, até que papai pediu silêncio com o copo estendido. Iria fazer um discurso (e esse pequeno discurso, apenas ele, justificaria estar, o texto de hoje, na série A TIJUCA EM ESTADO BRUTO):
- Quero propor um brinde, primeiramente, à minha mulher! Um brinde a você, Dani, minha nora amada, eu amo você! Também amo você, Lina! Obrigado por tudo!
Papai tropeçava nas sílabas, uma garrafa de Red Label já tinha ido embora. Ele continuou, soluçando de leve:
- Um brinde, meus filhos... Dudu... Nando... e Szegeri, meu filho que veio de São Paulo...
O Szegeri começou a chorar. Papai prosseguiu:
- Um brinde, Cacá! Meu irmão! Meu irmão! E um brinde, por fim, a você, Verinha, minha querida... Um beijo!
Ele ia se sentar quando eu o interpelei:
- Pai? E a vovó?!
Vovó estava cabisbaixa, ao meu lado, e chegou a dizer baixinho:
- Deixa pra lá, Dudu, deixa pra lá...
E meu pai, espetando o copo em direção à sogra:
- Sua vó está quase todo dia aqui, pô! - e estatelou-se, às gargalhadas, no sofá.
Vamos voltar às reações de papai com relação ao doutor Mauro.
Assim que papai conheceu mamãe (leiam PAPAI ARREMESSADO AO PASSADO para entenderem um bocadinho a história dos dois, aqui), num dos primeiros lanches de domingo na casa de meus avós - papai e mamãe eram vigiadíssimos! -, vovó passava manteiga num brioche para meu avô quando lembrou, num estalo:
- Ih, meu Deus do céu! Está na hora do meu remédio!
Deixou o brioche esperando, abriu a gaveta da cômoda ao lado da mesa, tirou o vidrinho de Bryonia, encestou duas bolinhas na tampa de rosca do vidro escuro e pôs as duas, num arremesso, na boca. Disse pra si mesma, fechando o vidro:
- Hora em hora, Mathilde, não esquece!
Papai, querendo puxar assunto com a futura sogra, fincando uma fatia de mortadela com o garfo:
- Homeopatia?
Vovó, com o rosto iluminado e pondo uma das mãos sobre a mão direita de minha mãe:
- Sim, meu filho. Tratamos com a homeopatia, graças ao doutor Mauro, que salvou a vida da Mariazinha quando ela tinha três anos e teve o tifo...
E contou, durante todo o lanche, a história que eu também já lhes contei aqui.
Papai, que sempre foi um emotivo contido, chorou diante do relato emocionado de minha avó. Meu avô, homem de poucas palavras, concordou durante todo o tempo, assentindo com a cabeça, dando ares de verdade incontestável a cada palavra que vovó dizia. E mamãe, por sua vez, não escondia a satisfação diante da sensibilidade do namorado. Papai quebrou o silêncio:
- Tem que tirar o chapéu pro doutor Mauro...
- Se tem! - disse vovó.
Mamãe sorriu e meu avô reclamou seu brioche.
Foi nesse dia, então, que papai ouviu, pela primeira vez, o nome do doutor Mauro.
Julho chegou e com ele papai pegou uma gripe. Foi ao lanche dominical na casa de meus avós. Vovó abriu a porta - era sempre minha avó a abrir a porta de casa para meu pai - e deu de cara com o nariz vermelho de meu pai (papai tem um senhor nariz). Foi dar os dois beijinhos no namorado da filha única e ele, gentil:
- Não, dona Mathilde! Estou com uma gripe daquelas! E uma febrícula desde cedo...
Mamãe levantou-se preocupada (ainda sofria as conseqüências do trauma do tifo). Vovó disse:
- Você está medicado, Isaac?
Ele fez que não com a cabeça enquanto assoava o nariz com seu lenço azul e branco.
Vovó em direção à mamãe:
- Mariazinha! Vá lá dentro buscar papel e caneta!
Mamãe voltou à sala e minha avó, depois de escrever no tal papelucho, estendeu-o a meu pai:
- O telefone do doutor Mauro! Marque uma consulta para amanhã, meu filho!
Papai:
- Doutor Mauro...
E olhando ternamente para mamãe:
- ... o homem que salvou sua vida!
E vovó, já caminhando pelas sendas do espiritismo:
- Graças a Deus!
Ficaram os três de conversa na sala - meu avô ouvia o noticiário no rádio num canto, sem tirar os olhos do casal de pombinhos - até que minha avó, depois do quinto espirro de meu pai, disse:
- Vou ligar pra casa do doutor Mauro! Você está muito mal, meu filho!
Papai:
- Mas hoje é domingo, dona Mathilde, não há urgência, amanhã eu mesm...
Vovó já estava pendurada no gancho:
- Doutor Mauro? Oh, doutor Mauro, que Deus o abençoe... Me perdoe estar ligando num domingo... - e ficou espetando o polegar em direção ao teto anunciando o êxito da ligação.
Papai espirrou.
- Oh, doutor Mauro... O senhor ouviu? É o Isaac, doutor Mauro, namoradinho da Mariazinha, sabe? Está com uma gripe daquelas!
Fez cara de suspense:
- Sei, sei, sei. Tenho sim, doutor Mauro! - fez sinal com a mão pedindo papel e lápis mais uma vez.
Papai levou o mesmo papelucho, e o lápis:
- Aconitum... sei... Bryonia e Belladona! - o polegar espetadíssimo, quase eufórica.
Pôs a mão no bocal do fone e disse:
- Mariazinha, minha filha, pegue lá, na cesta dos medicamentos! Tome! Tome! - e lhe estendeu o papelucho.
Continuou:
- Oh, doutor Mauro, muito obrigada! Que Deus abençoe o senhor! Amanhã, então, o Isaac irá vê-lo!
E sendo moderna, disse sorrindo em direção a meu pai:
- O.K., doutor Mauro? Um abraço, doutor Mauro, lembranças à família, o Milton e a Mariazinha estão mandando um abraço para o senhor!
E desligou.
Mamãe chegou de volta com os medicamentos. Vovó, zelosa, explicou a meu pai, calma e pausadamente, como ele teria de tomar os remédios. E disse, colocando-os em fila na mesinha de centro:
- Comece agora, meu filho! Comece agora!
Lancharam, papai parou de espirrar - "E ainda dizem que a homeopatia é lenta!", disse vovó, quase-fanática -, e quando foi haver a despedida, falou, maternal:
- Leve os remédios, meu filho. Continue tomando, agora de meia em meia-hora. Amanhã, quando você sair do doutor Mauro, passe por aqui, devolve esses remédios e aproveita para nos dar notícia acerca de seu quadro!
Mamãe achava aquele cuidado da própria mãe com seu namorado, uma benção. E seus olhos deixavam isso muito claro.
Papai despediu-se com um aceno de meu avô - que nada disse -, despediu-se de mamãe (não podiam ir, sozinhos, ao portão da rua), e quando ia estender a mão em direção à vovó, ela lhe disse:
- Espia! Espera um minutinho!
Sumiu pelo corredor e voltou, ligeira:
- Meu filho, vá com Deus e que Jesus te acompanhe até em casa. E... - pigarreou - ... tome. Espero que você goste. Não há pressa. Depois você devolve.
E estendeu, sorrindo, um exemplar do Livro dos Espíritos, o mesmo que ganhara, anos antes, do doutor Mauro.
Papai o pôs debaixo do braço. Vovó:
- Alguma coisa contra, meu filho?
- Muito pelo contrário, dona Mathilde, muito pelo contrário...
Tomou a direção do portão, deu o último adeus da noite, e vovó, suspirando e fechando a porta:
- Um bom rapaz, o Isaac... Graças a Deus, minha filha, graças a Deus!
Até.
Hoje quero lhes contar mais sobre nosso médico homeopata, o doutor Mauro. O doutor Mauro, a quem a família inteira, vivos e mortos, atribui o milagre da cura de minha mãe - que teve tifo aos três anos de idade -, jamais admitiu amortecer, sobre seus próprios ombros, o peso que minha parentalha, na íntegra, tinha (e tem) como incontestável. Basta alguém soprar, baixinho que seja, o nome do doutor Mauro e começam os murmúrios com as mãos espalmadas para o alto - "Um santo homem!", "Um sábio!", "Um verdadeiro espírita!", "Salvou a Mariazinha!", "Trata da Maricota desde os três anos!", essas bossas médico-patrióticas.
Curioso é que meu pai, meu amado pai, que evidentemente não conhecia mamãe quando ela teve o tifo, nutriu, ao longo da vida (ainda nutre, o doutor Mauro é que não clinica mais), desde que o conheceu e à sua história, verdadeira adoração, febril idolatria, preocupante fixação no médico homeopata de hábitos simples.
Se você, meu caro leitor, esbarrar no meu velho pai por aí (papai anda pela Tijuca diariamente), diga que lê o BUTECO, abra um sorriso franco em direção a ele, pouse uma das mãos em seu ombro e pergunte:
- E o doutor Mauro, Isaac?
E você ouvirá:
- Tá fazendo uma tremenda falta...
Papai é desses homens que anda com frases prontas no bolso. Experimente:
- Issac?! E a Noêmia?
- Uma lutadora! Eu gosto da Noêmia! - e abrirá um sorrisão.
Pausa para lhes contar uma recentíssima de papai (como vocês sabem, escrevo em ritmo febril, quase-mediunicamente, então vocês têm de me perdoar, vez por outra, esses arroubos, essas idas-e-vindas, essas mudanças bruscas de assunto). Estávamos, no domingo passado, reunidos em torno desse portento que é Fernando José Szegeri, na casa de papai e mamãe, no Alto da Boa Vista. Mamãe preparou, para homenageá-lo, um cozido, a geladeira estava cheia de cerveja, de vinho verde (do branco e do tinto), o uísque jorrando das torneiras da sala, até que papai pediu silêncio com o copo estendido. Iria fazer um discurso (e esse pequeno discurso, apenas ele, justificaria estar, o texto de hoje, na série A TIJUCA EM ESTADO BRUTO):
- Quero propor um brinde, primeiramente, à minha mulher! Um brinde a você, Dani, minha nora amada, eu amo você! Também amo você, Lina! Obrigado por tudo!
Papai tropeçava nas sílabas, uma garrafa de Red Label já tinha ido embora. Ele continuou, soluçando de leve:
- Um brinde, meus filhos... Dudu... Nando... e Szegeri, meu filho que veio de São Paulo...
O Szegeri começou a chorar. Papai prosseguiu:
- Um brinde, Cacá! Meu irmão! Meu irmão! E um brinde, por fim, a você, Verinha, minha querida... Um beijo!
Ele ia se sentar quando eu o interpelei:
- Pai? E a vovó?!
Vovó estava cabisbaixa, ao meu lado, e chegou a dizer baixinho:
- Deixa pra lá, Dudu, deixa pra lá...
E meu pai, espetando o copo em direção à sogra:
- Sua vó está quase todo dia aqui, pô! - e estatelou-se, às gargalhadas, no sofá.
Vamos voltar às reações de papai com relação ao doutor Mauro.
Assim que papai conheceu mamãe (leiam PAPAI ARREMESSADO AO PASSADO para entenderem um bocadinho a história dos dois, aqui), num dos primeiros lanches de domingo na casa de meus avós - papai e mamãe eram vigiadíssimos! -, vovó passava manteiga num brioche para meu avô quando lembrou, num estalo:
- Ih, meu Deus do céu! Está na hora do meu remédio!
Deixou o brioche esperando, abriu a gaveta da cômoda ao lado da mesa, tirou o vidrinho de Bryonia, encestou duas bolinhas na tampa de rosca do vidro escuro e pôs as duas, num arremesso, na boca. Disse pra si mesma, fechando o vidro:
- Hora em hora, Mathilde, não esquece!
Papai, querendo puxar assunto com a futura sogra, fincando uma fatia de mortadela com o garfo:
- Homeopatia?
Vovó, com o rosto iluminado e pondo uma das mãos sobre a mão direita de minha mãe:
- Sim, meu filho. Tratamos com a homeopatia, graças ao doutor Mauro, que salvou a vida da Mariazinha quando ela tinha três anos e teve o tifo...
E contou, durante todo o lanche, a história que eu também já lhes contei aqui.
Papai, que sempre foi um emotivo contido, chorou diante do relato emocionado de minha avó. Meu avô, homem de poucas palavras, concordou durante todo o tempo, assentindo com a cabeça, dando ares de verdade incontestável a cada palavra que vovó dizia. E mamãe, por sua vez, não escondia a satisfação diante da sensibilidade do namorado. Papai quebrou o silêncio:
- Tem que tirar o chapéu pro doutor Mauro...
- Se tem! - disse vovó.
Mamãe sorriu e meu avô reclamou seu brioche.
Foi nesse dia, então, que papai ouviu, pela primeira vez, o nome do doutor Mauro.
Julho chegou e com ele papai pegou uma gripe. Foi ao lanche dominical na casa de meus avós. Vovó abriu a porta - era sempre minha avó a abrir a porta de casa para meu pai - e deu de cara com o nariz vermelho de meu pai (papai tem um senhor nariz). Foi dar os dois beijinhos no namorado da filha única e ele, gentil:
- Não, dona Mathilde! Estou com uma gripe daquelas! E uma febrícula desde cedo...
Mamãe levantou-se preocupada (ainda sofria as conseqüências do trauma do tifo). Vovó disse:
- Você está medicado, Isaac?
Ele fez que não com a cabeça enquanto assoava o nariz com seu lenço azul e branco.
Vovó em direção à mamãe:
- Mariazinha! Vá lá dentro buscar papel e caneta!
Mamãe voltou à sala e minha avó, depois de escrever no tal papelucho, estendeu-o a meu pai:
- O telefone do doutor Mauro! Marque uma consulta para amanhã, meu filho!
Papai:
- Doutor Mauro...
E olhando ternamente para mamãe:
- ... o homem que salvou sua vida!
E vovó, já caminhando pelas sendas do espiritismo:
- Graças a Deus!
Ficaram os três de conversa na sala - meu avô ouvia o noticiário no rádio num canto, sem tirar os olhos do casal de pombinhos - até que minha avó, depois do quinto espirro de meu pai, disse:
- Vou ligar pra casa do doutor Mauro! Você está muito mal, meu filho!
Papai:
- Mas hoje é domingo, dona Mathilde, não há urgência, amanhã eu mesm...
Vovó já estava pendurada no gancho:
- Doutor Mauro? Oh, doutor Mauro, que Deus o abençoe... Me perdoe estar ligando num domingo... - e ficou espetando o polegar em direção ao teto anunciando o êxito da ligação.
Papai espirrou.
- Oh, doutor Mauro... O senhor ouviu? É o Isaac, doutor Mauro, namoradinho da Mariazinha, sabe? Está com uma gripe daquelas!
Fez cara de suspense:
- Sei, sei, sei. Tenho sim, doutor Mauro! - fez sinal com a mão pedindo papel e lápis mais uma vez.
Papai levou o mesmo papelucho, e o lápis:
- Aconitum... sei... Bryonia e Belladona! - o polegar espetadíssimo, quase eufórica.
Pôs a mão no bocal do fone e disse:
- Mariazinha, minha filha, pegue lá, na cesta dos medicamentos! Tome! Tome! - e lhe estendeu o papelucho.
Continuou:
- Oh, doutor Mauro, muito obrigada! Que Deus abençoe o senhor! Amanhã, então, o Isaac irá vê-lo!
E sendo moderna, disse sorrindo em direção a meu pai:
- O.K., doutor Mauro? Um abraço, doutor Mauro, lembranças à família, o Milton e a Mariazinha estão mandando um abraço para o senhor!
E desligou.
Mamãe chegou de volta com os medicamentos. Vovó, zelosa, explicou a meu pai, calma e pausadamente, como ele teria de tomar os remédios. E disse, colocando-os em fila na mesinha de centro:
- Comece agora, meu filho! Comece agora!
Lancharam, papai parou de espirrar - "E ainda dizem que a homeopatia é lenta!", disse vovó, quase-fanática -, e quando foi haver a despedida, falou, maternal:
- Leve os remédios, meu filho. Continue tomando, agora de meia em meia-hora. Amanhã, quando você sair do doutor Mauro, passe por aqui, devolve esses remédios e aproveita para nos dar notícia acerca de seu quadro!
Mamãe achava aquele cuidado da própria mãe com seu namorado, uma benção. E seus olhos deixavam isso muito claro.
Papai despediu-se com um aceno de meu avô - que nada disse -, despediu-se de mamãe (não podiam ir, sozinhos, ao portão da rua), e quando ia estender a mão em direção à vovó, ela lhe disse:
- Espia! Espera um minutinho!
Sumiu pelo corredor e voltou, ligeira:
- Meu filho, vá com Deus e que Jesus te acompanhe até em casa. E... - pigarreou - ... tome. Espero que você goste. Não há pressa. Depois você devolve.
E estendeu, sorrindo, um exemplar do Livro dos Espíritos, o mesmo que ganhara, anos antes, do doutor Mauro.
Papai o pôs debaixo do braço. Vovó:
- Alguma coisa contra, meu filho?
- Muito pelo contrário, dona Mathilde, muito pelo contrário...
Tomou a direção do portão, deu o último adeus da noite, e vovó, suspirando e fechando a porta:
- Um bom rapaz, o Isaac... Graças a Deus, minha filha, graças a Deus!
Até.
29.9.08
PREÇO DE BUTECO
A porção de salaminho que vocês vêem quase devastada na fotografia abaixo, caprichadíssima e de qualidade, custa R$ 8,00 (oito reais) na QUITANDA ABRONHENSE, cortado na hora pelo seu José.
No bistrô que o ex-dono do RIO-BRASÍLIA abriu na Almirante Gavião - como eu já havia lhes contado aqui e aqui - custa R$ 25,90 (vinte e cinco reais e noventa centavos).Por essa e por outras, não ponho meus pés lá.
Até.
CASA DE FERREIRO, ESPETO DE PAU
Reparem no cartaz - imundo - à direita da foto (cliquem sobre a fotografia e vocês poderão vê-la em tamanho maior). ORGANIZE-SE, são as lições contidas no papel que mal se lê, de tanta sujeira. E atentem para a lição de número 5: SE SUJOU, LIMPE. E isso, meus poucos mas fiéis leitores, num dos bares mais sujos em que já pisei em quase 40 anos de vida. Ou o mais sujo, quero ser franco.
Casa de ferreiro, espeto de pau - literalmente.Até.
BEBENDO COM O BERINJELA
Vocês hão de se recordar... No começo de setembro esteve no Rio o meu queridíssimo Favela. Escrevi FAVELA NO RIO, DE NOVO e publiquei umas fotos do malandro (em preto e branco), bebendo com dois caboclos num final de noite no COLUMBINHA (vejam aqui).
Pois no final da noite de sábado, 27 de setembro, já madrugada de domingo, pediu-me o mano Szegeri (de passagem pelo Rio de Janeiro), depois de um dia de fortíssimas emoções (vejam aqui):
- Eu quero ir beber no Columbinha com aquele negro velho que eu conheci pelas fotos e que bebeu com o Favela, será que ele tá lá?
Saímos do BAR DO CHICO, atravessamos a Afonso Pena, bebemos uma no BAR PINK e tomamos o rumo do COLUMBINHA. E não é que estava lá o Berinjela?
Pois no final da noite de sábado, 27 de setembro, já madrugada de domingo, pediu-me o mano Szegeri (de passagem pelo Rio de Janeiro), depois de um dia de fortíssimas emoções (vejam aqui):
- Eu quero ir beber no Columbinha com aquele negro velho que eu conheci pelas fotos e que bebeu com o Favela, será que ele tá lá?
Saímos do BAR DO CHICO, atravessamos a Afonso Pena, bebemos uma no BAR PINK e tomamos o rumo do COLUMBINHA. E não é que estava lá o Berinjela?
Até.
27.9.08
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - IX
A família tijucana tem, com seu médico (que é, imprescindivelmente é, o médico da família), uma relação visceral, de dependência emocional até - eu diria. A minha, é claro, tijucana que é de forma aguda, tem o seu. E tem o seu, quero lhes dizer, desde os anos 40.
Estive em seu consultório esta semana. Eu disse em seu consultório, mas fui atendido por seu filho (também já o fui por seu neto!!!!!). O doutor Mauro (vou chamá-lo assim a fim de não ferir suscetibilidades ou mesmo para não aguçar a curiosidade alheia sobre a vida profissional impoluta de um homem de bem) é, até hoje (está vivo, vivíssimo, mas não clinica mais), uma espécie de mito da família. Seu consultório, portanto, que fica - creio ser desnecessário dizer - na Tijuca, é uma espécie de Meca para a qual se voltam, meus parentes todos, a cada febrinha, a cada tosse, a cada problema qualquer de saúde. Seu filho e seu neto atendem, evidentemente, no mesmíssimo consultório, que é humilde e simples como a morada de um franciscano. Vou lhes contar a origem do mito.
Meus irmãos, o Fefê e o Cristiano, são testemunhas oculares e auditivas do que vou dizer. A história, que passo a lhes contar, nós já ouvimos milhares de vezes. E não, meus poucos mas fiéis leitores, eu não estou exagerando, como pretendem, sempre, os que têm mania de me denegrir, fazer parecer. Vovó Mathilde e mamãe - principalmente as duas, embora papai seja um dos mais fanáticos pelo doutor Mauro - repetem sempre essa história, com os olhos espetados pra fora, com as mãos em atrito como se o suspense fosse inédito, com a respiração ofegante, com a voz alterada, com o pranto semi-pronto esperando a comoção do ouvinte.Estive em seu consultório esta semana. Eu disse em seu consultório, mas fui atendido por seu filho (também já o fui por seu neto!!!!!). O doutor Mauro (vou chamá-lo assim a fim de não ferir suscetibilidades ou mesmo para não aguçar a curiosidade alheia sobre a vida profissional impoluta de um homem de bem) é, até hoje (está vivo, vivíssimo, mas não clinica mais), uma espécie de mito da família. Seu consultório, portanto, que fica - creio ser desnecessário dizer - na Tijuca, é uma espécie de Meca para a qual se voltam, meus parentes todos, a cada febrinha, a cada tosse, a cada problema qualquer de saúde. Seu filho e seu neto atendem, evidentemente, no mesmíssimo consultório, que é humilde e simples como a morada de um franciscano. Vou lhes contar a origem do mito.
Antes, porém, um detalhe.
Quando, durante um almoço de família qualquer, alguém, por acaso (não há acaso, na verdade, o nome dele é SEMPRE lembrado) cita seu nome, vozes em côro repetem:
- Trata da Mariazinha desde que ela tinha três anos!
Pois bem: mamãe tinha três anos e ardia em febre na casa da Gonçalves Crespo. Vovó e vovô, minha bisavó e meu bisavô, a parentalha toda (moravam todos na mesma casa!), revezava-se na novena que ardia na sala (vovó não era, ainda, a espírita convicta que é hoje), passando os terços de mão em mão, na esperança de uma solução.
Havia um desfile de automóveis na porta de casa, dos quais saltavam médicos portando maletas, estetoscópios e termômetros - doutor Oscar, doutor Borborema (cujo nome revi, anos depois, num romance do Nelson Rodrigues), doutor Benevenuto, doutor Jacinto, e muitos mais.
Os diagnósticos eram díspares, os remédios não surtiam efeito, os dias se passavam com mamãe ardendo como um círio num catedral em ruínas (apud Vinícius de Moraes), até que minha tia Linda, irmã de vovó, que - católica apostólica romana de fazer o Santo Papa parecer um ateu relapso -, em transe mediúnico (ninguém desconfiava, naquela casa, àquela época, o que fosse isso), disse:
- Chamem um homeopata!
Houve uma vaia coletiva em acintoso desrespeito com o ambiente tenso que assaltava aquele lar em aflição. Meu bisavô, que era a palavra mais ouvida naquela casa, disse:
- E por quê não?
Todos concordaram, em segundos, e foi um corre-corre em busca do nome de um homeopata.
Foi tia Linda, ainda debruçada sobre a mesa da sala, com a voz embargada, que disse para surpresa de todos:
- Chamem o doutor Mauro.
E disse o número de um telefone.
- Linda enlouqueceu! - gritou tio Hique.
- Lelé, coitada! - emendou tio Sílvio.
- Estou muito mal parado... - lamentou tio Beneval, seu marido.
E meu bisavô:
- Chamem!
A questão é a seguinte: os diagnósticos eram - como eu lhes disse - díspares. Falou-se em sarampo, em coqueluche, em rubéola, em escarlatina, até em caxumba, diagnóstico dado por um médico ligeiramente alcoolizado chamado às pressas.
Meu bisavô foi ao telefone e, cercado pelos filhos (do mais velho para o mais novo, Francisco, Sílvio, Carlinda - já refeita do transe -, Mathilde e Carlos Henrique), bateu o telefone pro tal médico.
Em nome da precisão, devo lhes dizer que não estão na lista acima a Silvinha (morta com cinco dias de vida), a Mariazinha (morta aos 15 anos, de quem mamãe herdou o nome e o pânico por festas de debutante, um dia desses lhes conto sobre isso) e o Pedrinho, que chegou depois.
Eis o que a parentalha pôde ouvir:
- Boa noite, doutor Mauro. Precisamos urgente que o senhor nos faça uma visita domiciliar! Mariazinha, minha neta, está mais pra lá do que pra cá!
Houve uma balbúrdia à qual ele pôs termo com uma pisada vigorosa nas tábuas do piso.
- Não, doutor Mauro. Não sabemos. Há vários diagnósticos. Mas a menina não melhora. E a febre está na casa dos quarenta e um graus!
Novo princípio de tumulto e um grito ao telefone:
- Como graças a Deus, doutor Mauro?!
Vovó teve um princípio de desmaio, meu avô anunciou que mataria o tal médico à bala, e meu bisavô continuou:
- Tome nota! Tome nota!
E pasou o endereço ao doutor Mauro.
- O quê te pareceu, Eugênio? - minha bisavó com o terço nas mãos.
- Diga, papai! Passou-lhe confiança?
Ele deu de ombros e sentou-se - todos se sentaram - à espera do doutor Mauro.
Uma hora depois, soa a campainha.
Meu bisavô faz um sinal e anuncia que vai sozinho ao portão. Dá de cara com um rapaz novo, bonito, até - vovó sempre elogia a beleza plástica daquele médico em sua primeira aparição - , formalmente vestido, uma pequena maleta numa das mãos e um sorriso sacrossanto no rosto plácido. Cumprimentaram-se e doutor Mauro foi levado à sala:
- Doutor Mauro? Esta é minha filha, Mathilde, e esse é meu genro, Milton, os pais da Mariazinha. Eles irão acompanhá-lo à câmara mortu...
Minha bisavó soltou um "oh" agudíssimo e meu bisavô, depois de um poderoso pigarro, consertou-se:
- ... ao quarto, doutor Mauro. Boa sorte.
A família sempre usa essa imagem: nem na Copa de 50, depois do fiasco da Seleção Brasileira diante do Uruguai, viu-se tamanho silêncio, tamanha depressão, tamanha ansiedade pelo que viria. Os minutos se passavam e apenas a tosse de minha mãe interrompia o silêncio.
Uma hora depois saem do quarto meus avós e o doutor Mauro.
- E aí, doutor?! - um sôfrego Eugênio, de pé, perguntou - Como está minha neta?
- Graças a Deus está bem, senhor Eugênio. O que a Mariazinha tem é tifo.
Foi um deus-nos-acuda.
Médicos experientes haviam passado por ali, catedráticos, donos de laboratório, e ninguém dissera a palavra "tifo".
- Tifo? - o côro de vozes.
- Ela vai ficar boa, senhor Eugênio!
- Já estou com os nomes dos remédios, papai! - disse vovó, esperançosa.
- Vamos? - disse meu avô.
Doutor Mauro se comprometera a ir até a casa do farmacêutico e de lá até à farmácia (tudo na Tijuca!!!!!) para o preparo dos medicamentos. Passava das dez da noite.
À meia-noite em ponto entra em casa meu avô trazendo os remédios homeopáticos, doutor Mauro a seu lado, e ele explica, com tranqüilidade comovente, à toda a família, o modus operandi do tratamento homeopático.
Vovó o acompanha até o portão:
- E quanto lhe devemos, doutor Mauro? Oh, estou tão grata...
- Nada, dona Mathilde. Fiquem com Deus... - e estendeu para minha avó, tirando-o da pasta, um exemplar do Livro dos Espíritos.
A família passou a noite se revezando na administração das duas bolinhas, alternadas, de quinze em quinze minutos, e já pela manhã minha mãe, suando em bicas, não tem mais febre.
Em questão de dias, depois de desenganada, mamãe estava boa, sarada, serelepíssima.
E vovó, para sempre, fanática pela devoção, pela dedicação, pela competência e pela grandeza do doutor Mauro.
Começou assim, meus poucos mas fiéis leitores, a história que une minha família a esse grande médico (fiz brevíssima e discretíssima menção a ele, aqui).
Há mais, muito mais para lhes contar sobre o assunto. Aguardem.
Até.
27 DE SETEMBRO
Hoje, 27 de setembro, quero relembrar o dia 09 de dezembro de 2006.
Salve a criançada!
Leiam aqui.
Até.
Salve a criançada!
Leiam aqui.
Até.
26.9.08
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - VIII
Quando escrevi A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - II (leiam aqui), fiz o convite público e convoquei, uma vez mais (já o havia feito antes), minha queridíssima cunhada, a Lina, para conhecer o FIORINO, restaurante italiano na Heitor Beltrão, na Tijuca - meu preferido dentre todos os restaurantes italianos. Como eu costumo dizer, não me venham com GERO, com CIPRIANI, com LOCANDA DELLA MIMOSA, com QUADRIFOGLIO, não dá nem pra saída. Como a Lina nunca conseguiu conter as gargalhadas de hiena ao me ouvir exaltar as qualidades do humílimo tijucano às margens do rio Trapicheiros, decidi convidá-la a fim de que ela mesmo pudesse tirar suas conclusões. Depois de muitas tentativas frustradas, fomos ontem, quinta-feira, eu e Fefê, acompanhados de nossas mais-amadas, jantar no magnífico FIORINO. E o relato do jantar entra para a série TIJUCA EM ESTADO BRUTO por razões óbvias que ficarão claras ao longo do texto. Vamos ao início.
Marcamos o encontro para às nove da noite. Oito e meia eu convoquei minha menina:
- Vamos indo?! Não é de bom tom chegarmos depois deles, né? Afinal, convidamos e vamos pagar tudo!
- Vamos... Mas você vai assim, de terno? Não vai trocar de roupa?
- Não! Não! Vou de terno! A noite é de gala e a Lina, você sabe, né?, elegante, formalíssima, melhor assim!
- É mesmo, é mesmo! Melhor assim!
Partimos. Nosso automóvel, garboso, deslizou pela Haddock Lobo, dobrou à esquerda na São Vicente, novamente à esquerda na Doutor Satamini, à direita na Campos Sales, à esquerda na Mariz e Barros, à esquerda na São Francisco Xavier e quando estávamos quase chegando, faltando dez pras nove, estrilou o telefone. O nome de meu irmão e sua fotografia piscavam na telinha do celular. Dani atendeu no viva-voz:
- Oi, quelido!
- Oi, quelida!
(pequena pausa: eles falam entre si, sabe-se lá por qual razão, como o Cebolinha, do Maurício de Souza, trocando os "érres" pelos "éles")
Continuou, o Fefê - tinha voz de enfado, meu irmão:
- A Lina quer saber se está de pé o jantar.
Minha menina me olhou, estranhando:
- Está, Fefê! Por quê? Vocês não vão?
- Já chegamos. Ela só queria confirmar se vai ser aqui mesmo.
Ouvíamos a Lina falando algo, ao fundo, que nos escapava.
- Estamos chegando! - e desligou.
Eu, fino, disse:
- Já era. A Lina detestou.
Minha menina, categórica e implacável:
- Não disse?
Paramos diante do FIORINO. Entreguei as chaves a um dos guardadores - o FIORINO tem vários guardadores que não cobram rigorosamente nada, ao contrário de todos os restaurantes da zona sul da cidade que obrigam o cidadão a pagar uma fortuna pelos insuportáveis serviços de valet park! -, ajeitei o paletó - "Tá direito, Dani?" -, dei o braço para minha garota e entrei triunfante.
Não encontrei Fefê e Lina, numa primeira passada de olhos. O maître:
- O senhor procura pelo Sr. e Sra. Goldenberg?
- Arrã.
- Estão ali! - apontou - Naquela mesa, senhor, atrás daquela planta!
Fomos à mesa. Cumprimentamo-nos, houve uma festa de "obas", "olás" e tapinhas nas costas, e eu disse:
- Por que essa mesa, Fê?
Ele, de soslaio para a Lina:
- Ela prefere não ser vista.
Dani, ao meu ouvido:
- Relaxa, amor. Ela já detestou, vamos aproveitar a noite.
Vamos à brevíssima descrição.
Fefê e Lina, no que diz respeito à roupa, nos humilhavam de maneira acintosa. Meu terno - e eu crente que estava abafando - era ofuscado pela elegância opulenta de meu irmão (um ex-adepto do jeans e da camiseta de malha) e minha menina parecia uma bonequinha de trapo perto da sobriedade do vestido preto da Lina, que causou "ohs" e "ahs" ditos à larga pela Dani, quando a viu:
- Lindo, o vestido! É da Renner? C&A? Cantão?
Lina tossiu e disse:
- Dior.
Vem o garçom à mesa:
- Vão aceitar o serviço?
- Claro! - eu disse, sóbrio.
- Alguma bebida, um drink?
Meus olhos brilharam e eu disse:
- Vamos abrir com um Red Label, Fê?
Ele, já contaminado:
- Red? Não tem um 18 anos?
Lina o cutucou, e ele:
- Vai o Red mesmo, então. - e não disfarçou quando muxoxou.
- E duas águas com gás, por favor! - disse a Dani.
- Perrier? - perguntou a Lina.
Agora foi o Fefê quem a cutucou.
- São Lourenço, senhora.
- Vai, vai... - e sorriu, a Lina.
Quando chegaram à mesa as cestas de pães, a manteiga, os patês, a coisa começou a mudar de figura. Como uma víbora ensandecida, a Tijuca começou a percorrer as entranhas de meu irmão e comecei a reconhecê-lo. Propondo um brinde com o copo de uísque numa das mãos, Fefê disse, de boca cheia:
- Adoro esse pão-palito! Adoro esse pão-palito!
Foi quando a Lina, que até então não havia tocado em nada, disse:
- Deixe-me provar...
Ah, meus poucos mas fiéis leitores, a Lina, depois da primeira mordida, transfigurou-se. Provou de todos os pães, lambeu sem cerimônia os beiços, seus olhos brilhavam, ora os fechava e suspirava fundo, e eu tomei coragem:
- Gostou?
- Claro! Lógico!
Fui arrojado:
- Comparável ao couvert do Cipriani?
- Pobre Francesco Carli! - disse a internacional Lina.
Como se demorasse, o garçom, perguntou-me o Fefê, à moda de papai:
- Cadê o garçom? Chama o gerente! Chama o gerente!
Veio à mesa, o garçom. Ofereceu-nos a carta de vinhos e a Dani, que nunca erra, gentilíssima com nossa convidada, escolheu um portentoso vinho argentino. Veio à mesa o vinho e o garçom serviu-nos mais cestinhas de pães com manteiga e patês:
- Trata-se de um complemento, senhores...
Eu, espetado na cadeira:
- Complemento?
Fefê, isaquiano até a medula:
- Chama o gerente, chefe! O que significa complemento?
- Uma cortesia, senhores...
- Ahhhhhhhhhh, bom! - foi o que dissemos eu e o Fefê, em uníssono.
Estávamos na varanda do FIORINO. Chamei a atenção dos três para o que acontecia do lado de dentro, no salão principal, que estava lotadíssimo. Disse, ainda:
- Se eu escrevo isso, dizem que é mentira.
Mal conseguíamos ver o que se passava lá dentro, tal era a quantidade de flashes sendo espocados por casais, famílias, garçons fotografando as pessoas, pessoas fotografando os pratos, um troço. A Tijuca estava ali, baixada, cravada, fincada naqueles tacos daquele salão suntuoso.
Escolhemos os pratos, derrubamos a primeira garrafa de vinho. A Dani, que havia cheirado a rolha da primeira e aprovado diante de um atônito Fefê ("Deixa eu cheirar também, deixa!"), pediu a segunda garrafa (caríssima!). E quando os pratos chegaram, meus poucos mas fiéis leitores, o que foi a reação da Lina????? Êxtase. Encantamento. E incredulidade.
Cada um de nós pediu um prato diferente. O meu, uma massa recheada com coração de alcachofra e presunto di Parma. Minha menina foi também de massa, também recheada, mas com figos e queijo. Fefê pediu massa também, e ela vinha aberta, recheadíssima, parecia um roseiral, na insuspeitada opinião do Romário, o garçom que nos atendia. A Lina, mais elegante que todos nós, pediu um paglia e feno com abobrinha. Comeu de olhos fechados, notei uma lágrima escorrendo à certa altura, perguntei:
- Tudo bem, Lina?
- Tudo... Fui remetida à Emilia-Romagna, na Itália, onde comi um prato como esse, não tão bom, é verdade, mas bem parecido...
Fechamos a noite com a melhor sobremesa do planeta Terra - vá lá e peça! -, café, e uma certeza que jamais me abandonou... Pois se até a Lina, elegante, requintada, viajada, sabida, concordou que o FIORINO é o melhor restaurante italiano que existe, não resta espectro de dúvida.
É, mesmo.
Fazia um frio polar na Tijuca. Partimos não sem antes nos despedirmos na calçada da Heitor Beltrão, o Fefê elogiando as centenárias casuarinas que margeiam o rio Trapicheiros, de cristalinas águas que dão um som mágico à rua àquela altura da noite, e a própria Lina me disse, quando abraçada a mim, antes de partir:
- Obrigada, Edu. Eu amo a Tijuca.
Até.
Marcamos o encontro para às nove da noite. Oito e meia eu convoquei minha menina:
- Vamos indo?! Não é de bom tom chegarmos depois deles, né? Afinal, convidamos e vamos pagar tudo!
- Vamos... Mas você vai assim, de terno? Não vai trocar de roupa?
- Não! Não! Vou de terno! A noite é de gala e a Lina, você sabe, né?, elegante, formalíssima, melhor assim!
- É mesmo, é mesmo! Melhor assim!
Partimos. Nosso automóvel, garboso, deslizou pela Haddock Lobo, dobrou à esquerda na São Vicente, novamente à esquerda na Doutor Satamini, à direita na Campos Sales, à esquerda na Mariz e Barros, à esquerda na São Francisco Xavier e quando estávamos quase chegando, faltando dez pras nove, estrilou o telefone. O nome de meu irmão e sua fotografia piscavam na telinha do celular. Dani atendeu no viva-voz:
- Oi, quelido!
- Oi, quelida!
(pequena pausa: eles falam entre si, sabe-se lá por qual razão, como o Cebolinha, do Maurício de Souza, trocando os "érres" pelos "éles")
Continuou, o Fefê - tinha voz de enfado, meu irmão:
- A Lina quer saber se está de pé o jantar.
Minha menina me olhou, estranhando:
- Está, Fefê! Por quê? Vocês não vão?
- Já chegamos. Ela só queria confirmar se vai ser aqui mesmo.
Ouvíamos a Lina falando algo, ao fundo, que nos escapava.
- Estamos chegando! - e desligou.
Eu, fino, disse:
- Já era. A Lina detestou.
Minha menina, categórica e implacável:
- Não disse?
Paramos diante do FIORINO. Entreguei as chaves a um dos guardadores - o FIORINO tem vários guardadores que não cobram rigorosamente nada, ao contrário de todos os restaurantes da zona sul da cidade que obrigam o cidadão a pagar uma fortuna pelos insuportáveis serviços de valet park! -, ajeitei o paletó - "Tá direito, Dani?" -, dei o braço para minha garota e entrei triunfante.
Não encontrei Fefê e Lina, numa primeira passada de olhos. O maître:
- O senhor procura pelo Sr. e Sra. Goldenberg?
- Arrã.
- Estão ali! - apontou - Naquela mesa, senhor, atrás daquela planta!
Fomos à mesa. Cumprimentamo-nos, houve uma festa de "obas", "olás" e tapinhas nas costas, e eu disse:
- Por que essa mesa, Fê?
Ele, de soslaio para a Lina:
- Ela prefere não ser vista.
Dani, ao meu ouvido:
- Relaxa, amor. Ela já detestou, vamos aproveitar a noite.
Vamos à brevíssima descrição.
Fefê e Lina, no que diz respeito à roupa, nos humilhavam de maneira acintosa. Meu terno - e eu crente que estava abafando - era ofuscado pela elegância opulenta de meu irmão (um ex-adepto do jeans e da camiseta de malha) e minha menina parecia uma bonequinha de trapo perto da sobriedade do vestido preto da Lina, que causou "ohs" e "ahs" ditos à larga pela Dani, quando a viu:
- Lindo, o vestido! É da Renner? C&A? Cantão?
Lina tossiu e disse:
- Dior.
Vem o garçom à mesa:
- Vão aceitar o serviço?
- Claro! - eu disse, sóbrio.
- Alguma bebida, um drink?
Meus olhos brilharam e eu disse:
- Vamos abrir com um Red Label, Fê?
Ele, já contaminado:
- Red? Não tem um 18 anos?
Lina o cutucou, e ele:
- Vai o Red mesmo, então. - e não disfarçou quando muxoxou.
- E duas águas com gás, por favor! - disse a Dani.
- Perrier? - perguntou a Lina.
Agora foi o Fefê quem a cutucou.
- São Lourenço, senhora.
- Vai, vai... - e sorriu, a Lina.
Quando chegaram à mesa as cestas de pães, a manteiga, os patês, a coisa começou a mudar de figura. Como uma víbora ensandecida, a Tijuca começou a percorrer as entranhas de meu irmão e comecei a reconhecê-lo. Propondo um brinde com o copo de uísque numa das mãos, Fefê disse, de boca cheia:
- Adoro esse pão-palito! Adoro esse pão-palito!
Foi quando a Lina, que até então não havia tocado em nada, disse:
- Deixe-me provar...
Ah, meus poucos mas fiéis leitores, a Lina, depois da primeira mordida, transfigurou-se. Provou de todos os pães, lambeu sem cerimônia os beiços, seus olhos brilhavam, ora os fechava e suspirava fundo, e eu tomei coragem:
- Gostou?
- Claro! Lógico!
Fui arrojado:
- Comparável ao couvert do Cipriani?
- Pobre Francesco Carli! - disse a internacional Lina.
Como se demorasse, o garçom, perguntou-me o Fefê, à moda de papai:
- Cadê o garçom? Chama o gerente! Chama o gerente!
Veio à mesa, o garçom. Ofereceu-nos a carta de vinhos e a Dani, que nunca erra, gentilíssima com nossa convidada, escolheu um portentoso vinho argentino. Veio à mesa o vinho e o garçom serviu-nos mais cestinhas de pães com manteiga e patês:
- Trata-se de um complemento, senhores...
Eu, espetado na cadeira:
- Complemento?
Fefê, isaquiano até a medula:
- Chama o gerente, chefe! O que significa complemento?
- Uma cortesia, senhores...
- Ahhhhhhhhhh, bom! - foi o que dissemos eu e o Fefê, em uníssono.
Estávamos na varanda do FIORINO. Chamei a atenção dos três para o que acontecia do lado de dentro, no salão principal, que estava lotadíssimo. Disse, ainda:
- Se eu escrevo isso, dizem que é mentira.
Mal conseguíamos ver o que se passava lá dentro, tal era a quantidade de flashes sendo espocados por casais, famílias, garçons fotografando as pessoas, pessoas fotografando os pratos, um troço. A Tijuca estava ali, baixada, cravada, fincada naqueles tacos daquele salão suntuoso.
Escolhemos os pratos, derrubamos a primeira garrafa de vinho. A Dani, que havia cheirado a rolha da primeira e aprovado diante de um atônito Fefê ("Deixa eu cheirar também, deixa!"), pediu a segunda garrafa (caríssima!). E quando os pratos chegaram, meus poucos mas fiéis leitores, o que foi a reação da Lina????? Êxtase. Encantamento. E incredulidade.
Cada um de nós pediu um prato diferente. O meu, uma massa recheada com coração de alcachofra e presunto di Parma. Minha menina foi também de massa, também recheada, mas com figos e queijo. Fefê pediu massa também, e ela vinha aberta, recheadíssima, parecia um roseiral, na insuspeitada opinião do Romário, o garçom que nos atendia. A Lina, mais elegante que todos nós, pediu um paglia e feno com abobrinha. Comeu de olhos fechados, notei uma lágrima escorrendo à certa altura, perguntei:
- Tudo bem, Lina?
- Tudo... Fui remetida à Emilia-Romagna, na Itália, onde comi um prato como esse, não tão bom, é verdade, mas bem parecido...
Fechamos a noite com a melhor sobremesa do planeta Terra - vá lá e peça! -, café, e uma certeza que jamais me abandonou... Pois se até a Lina, elegante, requintada, viajada, sabida, concordou que o FIORINO é o melhor restaurante italiano que existe, não resta espectro de dúvida.
É, mesmo.
Fazia um frio polar na Tijuca. Partimos não sem antes nos despedirmos na calçada da Heitor Beltrão, o Fefê elogiando as centenárias casuarinas que margeiam o rio Trapicheiros, de cristalinas águas que dão um som mágico à rua àquela altura da noite, e a própria Lina me disse, quando abraçada a mim, antes de partir:
- Obrigada, Edu. Eu amo a Tijuca.
Até.
25.9.08
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - VII
Como já lhes disse dia desses, a série A TIJUCA EM ESTADO BRUTO nasceu e ganhou corpo por absoluto acaso, sem que nada tenha sido planejado. Leiam aqui o primeiro da série, texto no qual conto o que vi e vivi numa pizzaria tijucana numa noite de domingo (domingo é o dia mais tijucano da semana!), aqui o segundo, que traz o relato de um jantar no melhor restaurante de comida italiana do país, tijucano, é claro, aqui o terceiro, pequena descrição do encontro de minha mãe com uma amiga de há séculos de vovó, aqui o quarto, narrativa saudosa fruto de um encontro meu com meu concunhado, aqui o quinto, no qual faço uma comparação entre a mãe judia e a mãe tijucana e aqui o sexto, sobre o simpaticíssimo assalto que sofreu vovó, há umas semanas.
Pausa brevíssima: este texto, que pode ser lido aqui, gerou um comentário que, em CNTP, eu não publicaria nem a fórceps. Feito por um homem que assinou PAULO (comentários têm disso, cada um põe o nome que quer...), o comentário me agride de maneira gratuita e agride - o que é pior, é pior! - ao Brasil e à Tijuca, de forma repulsiva. Já disse o que eu tinha a dizer ao sujeito. Se vocês quiserem fazê-lo também, fiquem à vontade. Pigarreio e sigo em frente.
Quero lhes contar, hoje, mais sobre vovó. Dona Mathilde, 84 anos, programadíssima (não pára quieta em casa, e isso de segunda à segunda!), ativíssima, formosa, cheirosa e vaidosa como canta o samba, espírita praticante, tem um único vício. Vou ser mais preciso: vovó mantém vivo um único vício. O vício do jogo. Vou lhes explicar.
Quando eu nasci, vovó morava - quem me lê, sabe - numa vila na rua Professor Gabizo, da qual tenho pouquíssima memória. Lembro-me mesmo, e bem, da vila para a qual ela se mudou (com vovô Milton, minha bisavó, Mathilde, e minha tia Idinha), pouco depois, e que fica (ainda fica) na rua São Francisco Xavier 84.
Nesta casa, cujo acesso se dava por uma escada de mármore branco, em "L", vovô e vovó usufruíam, e bem, de seus vícios pagãos. Lembro-me com nitidez agudíssima do bar que havia na casa, na sala. Garrafas de cristal guardavam licores de menta, havia diversas garrafas de Teacher´s, o uísque de todos os dias de meu avô, Campari, Martini. Havia sempre maços e maços de cigarro pela casa, vovô fumava Continental e vovó mandava brasa no Hollywood. E isso - a bebida e o cigarro - fazia parte do cenário que vi, incontáveis vezes, armado na casa de meus avós: a mesa de jogo.
Havia sempre jogatina na casa de meus avós. A parentalha, ou os amigos, ou os vizinhos, o que não faltava era parceria. E aquela sala era um tilintar de pedras de gelo, uma cortina de espessa fumaça e um farfalhar das cartas dos baralhos. Eu, criança, admirava aquele mundo de adultos pelo corredor ou através da porta da cozinha, e ficava admirado de ver minha avó, louríssima, fumando desbragadamente, bebendo cerveja, fazendo bigode de espuma e estalando a língua, mandando servir amendoim, azeitona, tilintando o sino de prata que mantinha sobre a mesa pra chamar a Penha (que levava, coitada, os maiores sabões de minha avó!). Uma avó moderníssima - eis a fantasia que eu mantinha em mim.
Passou o tempo.
Vovó, espírita praticante - como já lhes disse - , foi deixando, ao longo da vida, os vícios de lado. Também foram deixando minha avó, a sua mãe, minha bisavó Mathilde, a sua tia, minha tia-avó Idinha, e seu marido, o meu avô Milton. Vovó deixou de fumar - hoje tem ojeriza a cigarro. Nunca mais a vi fazendo bigode de espuma de cerveja, embora - verdade seja dita! - vovó peça, de vez em quando, principalmente em dia de festa, uma dose de uísque, uma taça de vinho, um licor, essas bossas alcoólicas.
Um vício, um único vício - voltando, então -, ela não largou: o do jogo.
Hoje mesmo, pela manhã, bati-lhe o telefone:
- Alô?!
- Oi, vozinha!
- Ô, meu querido!
- Sua benção, minha vó!
E ela, espírita de fazer o Kardec parecer ateu:
- Deus te abençoe, meu filho!
Convidei vovó pra almoçar um cozido no domingo. Mamãe e eu estamos organizando um cozido no Alto da Boa Vista para recebermos em festa um parente de fora que vem passar o final de semana no Rio de Janeiro (não digo quem é, nem a fórceps). E disse-me a vovó:
- Cozido?! De novo?
Eu, sem entender:
- Como de novo, vó?!
E ela, rindo:
- É que no sábado tem biriba na Noêmia, sabe?
- Arrã.
- E ela vai oferecer um cozido para as meninas do carteado...
Noêmia tem 94 anos - era a dona da casa-cenário do conto DEBUTE NO ENGENHO NOVO, leiam aqui - e vovó é a caçula do cassino!
De onde são essas senhoras, meus poucos mas fiéis leitores... de onde?
Salve a Tijuca! Salve a Tijuca!
Até.
Pausa brevíssima: este texto, que pode ser lido aqui, gerou um comentário que, em CNTP, eu não publicaria nem a fórceps. Feito por um homem que assinou PAULO (comentários têm disso, cada um põe o nome que quer...), o comentário me agride de maneira gratuita e agride - o que é pior, é pior! - ao Brasil e à Tijuca, de forma repulsiva. Já disse o que eu tinha a dizer ao sujeito. Se vocês quiserem fazê-lo também, fiquem à vontade. Pigarreio e sigo em frente.
Quero lhes contar, hoje, mais sobre vovó. Dona Mathilde, 84 anos, programadíssima (não pára quieta em casa, e isso de segunda à segunda!), ativíssima, formosa, cheirosa e vaidosa como canta o samba, espírita praticante, tem um único vício. Vou ser mais preciso: vovó mantém vivo um único vício. O vício do jogo. Vou lhes explicar.
Quando eu nasci, vovó morava - quem me lê, sabe - numa vila na rua Professor Gabizo, da qual tenho pouquíssima memória. Lembro-me mesmo, e bem, da vila para a qual ela se mudou (com vovô Milton, minha bisavó, Mathilde, e minha tia Idinha), pouco depois, e que fica (ainda fica) na rua São Francisco Xavier 84.
Nesta casa, cujo acesso se dava por uma escada de mármore branco, em "L", vovô e vovó usufruíam, e bem, de seus vícios pagãos. Lembro-me com nitidez agudíssima do bar que havia na casa, na sala. Garrafas de cristal guardavam licores de menta, havia diversas garrafas de Teacher´s, o uísque de todos os dias de meu avô, Campari, Martini. Havia sempre maços e maços de cigarro pela casa, vovô fumava Continental e vovó mandava brasa no Hollywood. E isso - a bebida e o cigarro - fazia parte do cenário que vi, incontáveis vezes, armado na casa de meus avós: a mesa de jogo.
Havia sempre jogatina na casa de meus avós. A parentalha, ou os amigos, ou os vizinhos, o que não faltava era parceria. E aquela sala era um tilintar de pedras de gelo, uma cortina de espessa fumaça e um farfalhar das cartas dos baralhos. Eu, criança, admirava aquele mundo de adultos pelo corredor ou através da porta da cozinha, e ficava admirado de ver minha avó, louríssima, fumando desbragadamente, bebendo cerveja, fazendo bigode de espuma e estalando a língua, mandando servir amendoim, azeitona, tilintando o sino de prata que mantinha sobre a mesa pra chamar a Penha (que levava, coitada, os maiores sabões de minha avó!). Uma avó moderníssima - eis a fantasia que eu mantinha em mim.
Passou o tempo.
Vovó, espírita praticante - como já lhes disse - , foi deixando, ao longo da vida, os vícios de lado. Também foram deixando minha avó, a sua mãe, minha bisavó Mathilde, a sua tia, minha tia-avó Idinha, e seu marido, o meu avô Milton. Vovó deixou de fumar - hoje tem ojeriza a cigarro. Nunca mais a vi fazendo bigode de espuma de cerveja, embora - verdade seja dita! - vovó peça, de vez em quando, principalmente em dia de festa, uma dose de uísque, uma taça de vinho, um licor, essas bossas alcoólicas.
Um vício, um único vício - voltando, então -, ela não largou: o do jogo.
Hoje mesmo, pela manhã, bati-lhe o telefone:
- Alô?!
- Oi, vozinha!
- Ô, meu querido!
- Sua benção, minha vó!
E ela, espírita de fazer o Kardec parecer ateu:
- Deus te abençoe, meu filho!
Convidei vovó pra almoçar um cozido no domingo. Mamãe e eu estamos organizando um cozido no Alto da Boa Vista para recebermos em festa um parente de fora que vem passar o final de semana no Rio de Janeiro (não digo quem é, nem a fórceps). E disse-me a vovó:
- Cozido?! De novo?
Eu, sem entender:
- Como de novo, vó?!
E ela, rindo:
- É que no sábado tem biriba na Noêmia, sabe?
- Arrã.
- E ela vai oferecer um cozido para as meninas do carteado...
Noêmia tem 94 anos - era a dona da casa-cenário do conto DEBUTE NO ENGENHO NOVO, leiam aqui - e vovó é a caçula do cassino!
De onde são essas senhoras, meus poucos mas fiéis leitores... de onde?
Salve a Tijuca! Salve a Tijuca!
Até.
24.9.08
ALGO A DIZER SOBRE FAUSTO WOLFF
O jornal ALGO A DIZER acaba de pôr no ar sua edição de número 12, dedicada a esse grande homem que é (eu disse "é", no presente) Fausto Wolff. Para minha alegria, o ALGO A DIZER reproduz, na íntegra, a entrevista que fizemos com o bardo no BAR BRASIL, na Lapa, em 19 de junho de 2004. E traz, ainda, texto do cada-vez-mais-saudoso Fernando Toledo e de minha queridíssima Áurea Alves. Cliquem na imagem abaixo, divirtam-se e se deixem levar pela emoção.
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - VI
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO está virando, confesso, uma série interessante. Leiam aqui o primeiro, aqui o segundo, aqui o terceiro, aqui o quarto e aqui o quinto. Não era pra ser assim, não foi nada planejado, mas a Tijuca tem desses troços, a Tijuca é tão espraiada dentro de quem a ama, a Tijuca ocupa tanto espaço, a Tijuca tem tanta história, que somos flagrados assim, tomados de Tijuca até a alma - e somos obrigados a dividir essas tijucaníssimas emoções, esse afeto tijucano, sob pena de sentirmos dor, inclusive. Pois a Tijuca, meus poucos mas fiéis leitores, a Tijuca machuca. Feito o intróito, em frente.
Hoje vou lhes contar uma história - realíssima, eis que sou preciso do início ao fim - envolvendo vovó, dona Mathilde, uma mulher altiva, 84 anos, ativíssima, formosa, cheirosa e vaidosa como canta o samba. Vou lhes contar, mais precisamente, a história de um assalto que vovó sofreu recentemente (o primeiro depois de 84 anos de Tijuca, diga-se!, o que só prova que a violência, na Tijuca, é coisa rara como goiabada-cascão).
Minha avó acaba de sair de seu prédio e vem caminhando pela rua onde mora para tomar um ônibus. Uns 500 metros depois de seu prédio é abordada por um sujeito, na casa dos 30, 35 anos, esbaforido, correndo, aflitíssimo:
- Ô, senhora... boa tarde!
Vovó, que sorri para estátuas, pombos, postes, bancas de jornal - como sorri, a minha avó! -, responde:
- Boa tarde, meu filho. Como é seu nome? - vovó conhece todo mundo pelo nome!
(pequena pausa: eu tenho a impressão de que esse "meu filho" deu ao meliante a certeza do êxito de sua empreitada)
- Ô, senhora... - forjava baforadas de exaustão - É Robson. Vim correndo, seu porteiro bem me disse que eu alcançaria a senhora... Ele bem que me disse que a senhora estava com uma calça branca e uma blusa colorida... Muito simpático, ele... Como é mesmo seu nome? Me esqueci! - e guardou um crachá que trazia pendurado no pescoço.
Vovó, terna:
- Mathilde.
Ele deu um tapa na testa:
- Puxa vida! Como pude me esquecer! O nome da professora que me ensinou a ler... - e fingiu enxugar lágrimas dos olhos.
- Pois não, meu filho...
- Então, dona Mathilde. Eu sou da LIGHT. A senhora não vinha achando sua conta de luz cara?!
- Caríssima!
(pequena pausa: quem paga as contas de vovó é papai, que jura que suas contas de luz sempre foram baixíssimas)
- Pois eu acabo de trocar seu relógio de luz!
Vovó, terníssima:
- Ô, meu filho, ô, Robson...
Estende a mão em direção ao sujeito, faz festinha em suas mãos, e, sendo espírita da cabeça aos pés, diz:
- Deus te abençoe, Robson!
Ele sorriu e disse num sem-pulo:
- Obrigado, dona Mathilde. Mas eu vim correndo não apenas para avisar a senhora, mas... - fingiu constrangimento abaixando os olhos - ... esse serviço é pago.
- Oh! É? - e já foi abrindo a bolsa, aflita - E quanto é?
- Quinze reais, dona Mathilde.
Vovó revirou a bolsa e estendeu ao homem uma nota de cinqüenta e duas de vinte:
- Só tenho assim. O senhor tem troco?
- Não tenho, dona Mathilde... A senhora me espera aqui? Posso ir trocar ali no bar da esquina...
- Ô, meu filho, você faz isso? Estou indo para o outro lado.
- Claro, senhora...
(pequena pausa: notem a genialidade do momento, o encanto e a doçura do assalto, só possíveis num assalto na Tijuca)
Vovó estendeu a nota de cinqüenta.
Ele:
- Ô, senhora, me dê a de vinte...
- Não, meu filho! Eu aproveito e já troco essa nota grande!
- Não, não, será mais fácil trocar a de vinte.
Vovó está esperando o homem até agora.
Quando chamamos sua atenção - todos -, vovó disse, sábia:
- Ele precisa mais do que eu. E foi, convenhamos, genial, não foi? Mereceu! Mereceu! Além de tudo, poderia ter ficado com minha nota de cinqüenta... Foi até gentil!
Até.
Hoje vou lhes contar uma história - realíssima, eis que sou preciso do início ao fim - envolvendo vovó, dona Mathilde, uma mulher altiva, 84 anos, ativíssima, formosa, cheirosa e vaidosa como canta o samba. Vou lhes contar, mais precisamente, a história de um assalto que vovó sofreu recentemente (o primeiro depois de 84 anos de Tijuca, diga-se!, o que só prova que a violência, na Tijuca, é coisa rara como goiabada-cascão).
Minha avó acaba de sair de seu prédio e vem caminhando pela rua onde mora para tomar um ônibus. Uns 500 metros depois de seu prédio é abordada por um sujeito, na casa dos 30, 35 anos, esbaforido, correndo, aflitíssimo:
- Ô, senhora... boa tarde!
Vovó, que sorri para estátuas, pombos, postes, bancas de jornal - como sorri, a minha avó! -, responde:
- Boa tarde, meu filho. Como é seu nome? - vovó conhece todo mundo pelo nome!
(pequena pausa: eu tenho a impressão de que esse "meu filho" deu ao meliante a certeza do êxito de sua empreitada)
- Ô, senhora... - forjava baforadas de exaustão - É Robson. Vim correndo, seu porteiro bem me disse que eu alcançaria a senhora... Ele bem que me disse que a senhora estava com uma calça branca e uma blusa colorida... Muito simpático, ele... Como é mesmo seu nome? Me esqueci! - e guardou um crachá que trazia pendurado no pescoço.
Vovó, terna:
- Mathilde.
Ele deu um tapa na testa:
- Puxa vida! Como pude me esquecer! O nome da professora que me ensinou a ler... - e fingiu enxugar lágrimas dos olhos.
- Pois não, meu filho...
- Então, dona Mathilde. Eu sou da LIGHT. A senhora não vinha achando sua conta de luz cara?!
- Caríssima!
(pequena pausa: quem paga as contas de vovó é papai, que jura que suas contas de luz sempre foram baixíssimas)
- Pois eu acabo de trocar seu relógio de luz!
Vovó, terníssima:
- Ô, meu filho, ô, Robson...
Estende a mão em direção ao sujeito, faz festinha em suas mãos, e, sendo espírita da cabeça aos pés, diz:
- Deus te abençoe, Robson!
Ele sorriu e disse num sem-pulo:
- Obrigado, dona Mathilde. Mas eu vim correndo não apenas para avisar a senhora, mas... - fingiu constrangimento abaixando os olhos - ... esse serviço é pago.
- Oh! É? - e já foi abrindo a bolsa, aflita - E quanto é?
- Quinze reais, dona Mathilde.
Vovó revirou a bolsa e estendeu ao homem uma nota de cinqüenta e duas de vinte:
- Só tenho assim. O senhor tem troco?
- Não tenho, dona Mathilde... A senhora me espera aqui? Posso ir trocar ali no bar da esquina...
- Ô, meu filho, você faz isso? Estou indo para o outro lado.
- Claro, senhora...
(pequena pausa: notem a genialidade do momento, o encanto e a doçura do assalto, só possíveis num assalto na Tijuca)
Vovó estendeu a nota de cinqüenta.
Ele:
- Ô, senhora, me dê a de vinte...
- Não, meu filho! Eu aproveito e já troco essa nota grande!
- Não, não, será mais fácil trocar a de vinte.
Vovó está esperando o homem até agora.
Quando chamamos sua atenção - todos -, vovó disse, sábia:
- Ele precisa mais do que eu. E foi, convenhamos, genial, não foi? Mereceu! Mereceu! Além de tudo, poderia ter ficado com minha nota de cinqüenta... Foi até gentil!
Até.
FESTA NA ALDEIA!!!!!
Meu mano Luiz Antonio Simas anunciou hoje cedo, em seu HISTÓRIAS DO BRASIL, que o samba com que disputa o direito de representar o SALGUEIRO na avenida em 2009 (em parcecia com o Mussa - e mais Edgar Filho, Gari Sorriso e Bené do Salgueiro), foi anunciado, ontem, como um dos seis que continuam no páreo.
O BUTECO, que já havia publicado ESSE É MEU SAMBA (aqui), AINDA O SAMBA DO SIMAS E DO MUSSA (aqui) e AINDA O SAMBA DO SIMAS E DO MUSSA - II (aqui) - está em festa.
Ergo, de pé, diante do balcão imaginário do BUTECO, meu copo cheio de chope com espessa espuma, em homenagem a esses dois, Simas e Mussa, que merecem muito mais nos domínios da vermelho-e-branco do meu coração.
Leiam SÁBADO TEM MAIS FESTA NA ALDEIA!, a convocação do Simas, aqui.
Até.
O BUTECO, que já havia publicado ESSE É MEU SAMBA (aqui), AINDA O SAMBA DO SIMAS E DO MUSSA (aqui) e AINDA O SAMBA DO SIMAS E DO MUSSA - II (aqui) - está em festa.
Ergo, de pé, diante do balcão imaginário do BUTECO, meu copo cheio de chope com espessa espuma, em homenagem a esses dois, Simas e Mussa, que merecem muito mais nos domínios da vermelho-e-branco do meu coração.
Leiam SÁBADO TEM MAIS FESTA NA ALDEIA!, a convocação do Simas, aqui.
Até.
23.9.08
RIO-BRASÍLIA: NOVAS PERSPECTIVAS
Antes de mais nada, entenda o imbroglio envolvendo o triste e abrupto encerramento das atividades do RIO-BRASÍLIA lendo JOAQUIM E TEREZINHA - AS IMPRESSÕES - aqui, O JOAQUIM ENLOUQUECEU - aqui, O JOAQUIM ENLOUQUECEU II - aqui, RIO-BRASÍLIA FECHADO - aqui, EXTRA - MAIS SOBRE O FECHAMENTO DO RIO BRASÍLIA - aqui, RIO-BRASÍLIA: PARECE QUE FECHOU MESMO - aqui e MINHAS ÚLTIMAS FOTOS NO RIO-BRASÍLIA aqui.
Por uma dessas coincidências - não há coincidências - saltei do metrô, há pouco, vindo do trabalho, na estação AFONSO PENA e dou de cara com o Felipinho Cereal. Disse-me o menino, de olhos marejados:
- Vamos caminhando juntos?
Assenti.
- Vamos passar pela Almirante Gavião?
Assenti, de novo.
E qual não foi nossa surpresa.
O RIO-BRASÍLIA estava aberto.
Uma Terezinha sem jeito, sem graça, disse:
- Gente... desculpa...
O Felipinho pigarreou.
E ela continuou:
- Nós não vamos fechar assim... Desculpa por não ter avisado a vocês...
E disse que eles não vão suportar os dois bares abertos ao mesmo tempo; disse que não pretendem fechar definitivamente sem uma satisfação aos mais-fiéis; que não era intenção dela magoar a gente, esses troços.
Saímos de lá mais felizes.
Esperançosos.
Eis aí o nosso Felipinho Cereal em estado de graça!
E vamos ver como anda a carruagem na Almirante Gavião.Por uma dessas coincidências - não há coincidências - saltei do metrô, há pouco, vindo do trabalho, na estação AFONSO PENA e dou de cara com o Felipinho Cereal. Disse-me o menino, de olhos marejados:
- Vamos caminhando juntos?
Assenti.
- Vamos passar pela Almirante Gavião?
Assenti, de novo.
E qual não foi nossa surpresa.
O RIO-BRASÍLIA estava aberto.
Uma Terezinha sem jeito, sem graça, disse:
- Gente... desculpa...
O Felipinho pigarreou.
E ela continuou:
- Nós não vamos fechar assim... Desculpa por não ter avisado a vocês...
E disse que eles não vão suportar os dois bares abertos ao mesmo tempo; disse que não pretendem fechar definitivamente sem uma satisfação aos mais-fiéis; que não era intenção dela magoar a gente, esses troços.
Saímos de lá mais felizes.
Esperançosos.
Eis aí o nosso Felipinho Cereal em estado de graça!
Aqui, no BUTECO, vocês, meus poucos mas fiéis leitores, saberão de tudo.
Até.
MINHAS ÚLTIMAS FOTOS NO RIO-BRASÍLIA
O BUTECO DO EDU, que tinha firme intenção de começar a publicar amanhã a série sobre a rua do Matoso, que tão cuidadosamente preparei com o auxílio do Felipinho Cereal, do meu pai e do Simas - que esteve conosco em um dos três passeios organizados para a prospecção da gloriosa e tijucaníssima rua - publica hoje as últimas fotos que fiz no RIO-BRASÍLIA, na noite de sexta-feira, quando lá fiquei com alguns amigos queridos enquanto o casal Joaquim e Terezinha inaugurava o lamentável bistrô responsável pelo fechamento do portentoso buteco da Almirante Gavião.
Entenda o imbroglio envolvendo o triste e abrupto encerramento das atividades do RIO-BRASÍLIA lendo JOAQUIM E TEREZINHA - AS IMPRESSÕES - aqui, O JOAQUIM ENLOUQUECEU - aqui, O JOAQUIM ENLOUQUECEU II - aqui, RIO-BRASÍLIA FECHADO - aqui, EXTRA - MAIS SOBRE O FECHAMENTO DO RIO BRASÍLIA - aqui e RIO-BRASÍLIA: PARECE QUE FECHOU MESMO - aqui.
Muito por conta disso - pois o assunto ainda é palpitante e tem neguinho apostando numa virada do jogo! -, é mais provável que a série sobre a rua do Matoso comece a ser publicada apenas na segunda-feira que vem, 29 de setembro.
Eis aí as duas últimas fotos que fiz no RIO-BRASÍLIA, sem saber que eram as últimas. Minutos antes - o Felipinho Cereal é testemunha - a Terezinha disse, de dentro do balcão:
- Imagina, Eduardo, se vamos fechar isso daqui...
Por isso, talvez - ou será impressão minha? - o sorriso constrangido do Imperador, já vestido com o avental do bistrô do casal, na foto abaixo.
Entenda o imbroglio envolvendo o triste e abrupto encerramento das atividades do RIO-BRASÍLIA lendo JOAQUIM E TEREZINHA - AS IMPRESSÕES - aqui, O JOAQUIM ENLOUQUECEU - aqui, O JOAQUIM ENLOUQUECEU II - aqui, RIO-BRASÍLIA FECHADO - aqui, EXTRA - MAIS SOBRE O FECHAMENTO DO RIO BRASÍLIA - aqui e RIO-BRASÍLIA: PARECE QUE FECHOU MESMO - aqui.
Muito por conta disso - pois o assunto ainda é palpitante e tem neguinho apostando numa virada do jogo! -, é mais provável que a série sobre a rua do Matoso comece a ser publicada apenas na segunda-feira que vem, 29 de setembro.
Eis aí as duas últimas fotos que fiz no RIO-BRASÍLIA, sem saber que eram as últimas. Minutos antes - o Felipinho Cereal é testemunha - a Terezinha disse, de dentro do balcão:
- Imagina, Eduardo, se vamos fechar isso daqui...
Por isso, talvez - ou será impressão minha? - o sorriso constrangido do Imperador, já vestido com o avental do bistrô do casal, na foto abaixo.
Até.
O LUTO DO FELIPINHO CEREAL
Muito mais triste do que eu, muito mais inconformado do que o mais inconformado freqüentador do RIO-BRASÍLIA, está meu querido amigo Felipinho Cereal. Em seu BOEMIA & NOSTALGIA, com imagens - sem palavras - , ele expressa a saudade antecipada daquele pedacinho do céu encravado na Almirante Gavião. Leiam aqui.
Até.
Até.
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - V
Muito se diz sobre a mãe judia: extremamente protetora, zelosa no mais alto grau, orgulhosa dos filhos mesmo que os filhos não o mereçam. Ocorre que - eis o que quero lhes contar hoje - perto da mãe tijucana, eis a verdade, a mãe judia é uma mãe relapsa, é uma mãe ingrata, é a antítese da mãe. Eu diria, se tivesse que preparar uma espécie de defesa de tese sobre o palpitante tema e em apertada síntese, que a mãe judia é fanática, cega, irracional, irascível, e a mãe tijucana é orgulhosa racionalmente.
A mãe tijucana é apegadíssima ao filho. É apegadíssima ao filho e não se satisfaz com esse apego a dois, não se satisfaz com o filho no colo dentro de casa, não se satisfaz com o carinho intramuros, não basta à mãe tijucana a certeza silenciosa da cumplicidade filial. Não. A mãe tijucana gosta de pôr o próprio filho - "sangue do meu sangue!", a mãe tijucana adora tal expressão - num outdoor imaginário.
Vamos a exemplos práticos - e vocês hão de me entender.
Há uma piada, uma historinha sobre a mãe judia. A mãe judia passeia com seus gêmeos, dois meses de idade, empurrando, contente, o carrinho pelo calçadão da praia. Uma velhinha estaca diante do carrinho e diz:
- Oh! Que lindos! São seus?
E a idishe mama, apontando para um, depois para o outro:
- Sim! Este é médico, e este é engenheiro.
Notem que o fanatismo expõe a mãe judia ao ridículo.
A mãe tijucana, por sua vez, dá carinho, alimenta, educa, orienta o filho até o dia de sua formatura. Espera ver o canudo na mão do filhote. E dali em diante, aí sim, dali em diante passa a apresentar o filho:
- Eduardo, meu mais velho, advogado!
E ainda completa:
- Tem seu cartão aí, filho?
- Não, mãe... - coradíssimo de vergonha.
E ela, implacável:
- Mas eu tenho! - e estende o cartão em direção à amiga.
Outro exemplo: o filho da mãe tijucana consegue um bom emprego, imprime vigoroso êxito na carreira, até que um dia anuncia a compra de um apartamento. De um bom apartamento. De um bom apartamento em um condomínio fechado, de luxo, e a mãe enche-se de orgulho. Enche-se de orgulho e crava, na cabeça e no coração, uma meta: suas amigas têm que conhecer o apartamento do filho, precisam conhecer o apartamento do filho.
Eu não sei se vocês conseguem acompanhar o que eu digo. Mas se tal se dá com o filho de uma mãe de Copacabana, por exemplo, a aquisição do imóvel vai merecer, no máximo, um jantar em família. Um brinde singelo, um orgulho que a mãe guardará no coração discreto. Já com a mãe da Tijuca, não. Voltemos a ela e à cena que quero lhes propôr para uma mais ampla compreensão do modus operandi da mãe tijucana.
O filho, já tendo dado a notícia da compra do imóvel, põe a mãe no banco do carona e desliza com o automóvel até o apartamento. A mãe, que já tem nas mãos a chave do apartamento novo de seu filho, grita à certa altura:
- Pára! Pára! Rapidinho!
Salta. Volta em menos de dez minutos. O filho:
- O que você foi fazer, mãe?
- Cópia da chave para mim! Toca pro apartamento, toca!
Lá chegando, a mãe é uma festa de "ohs" e "ahs". E decreta, ainda na sala:
- Ah! Mas eu tenho que trazer a Rita de Cássia pra conhecer isso aqui!
Percebam a obsessão pelo filho num outdoor:
- O prédio tem salão de festas?
- Tem, mãe...
- Oh! Que maravilha! Vou marcar um chá com minhas amigas aqui, na semana que vem!!!
- Mas, mãe, eu ainda nem me mud...
- Ih, meu filho, isso é o de menos! A Regina Lúcia precisa conhecer seu apartamento, seu prédio! - e dá pequeno saltitos enquanto avança pelo corredor.
- Mas eu só me mudo na semana que vem, mam...
- Ótimo! Vou chamar a Lia Cristina para dar uns toques na decoração!
E fica, a mãe tijucana, tendo crises de urticária e ansiedade enquanto não consegue levar as amigas para conhecerem o ninho do filhote. Até que, no dia da tal visita, dá-se ainda mais impressionante coisa. A mãe ignora, solenemente, dianta da amiga, a presença do filho. Tem a obsessão de expôr a sala, os móveis, a vista, as ferragens dos banheiros, o blindex do box e a cama, os quadros, a qualidade dos lençóis, esses troços. É uma febril, apontando o indicador orgulhoso em direção a tudo.
A mãe judia jamais faria isso. A mãe judia tem medo do olho gordo, a mãe judia teme seqüestros, a mãe judia tem o pânico da exposição à toa.
Notaram a diferença?
Dia desses volto a falar da mãe tijucana.
Eu, que evidentemente tenho uma (a quem amo profundamente), falo com conhecimento de causa.
Até.
A mãe tijucana é apegadíssima ao filho. É apegadíssima ao filho e não se satisfaz com esse apego a dois, não se satisfaz com o filho no colo dentro de casa, não se satisfaz com o carinho intramuros, não basta à mãe tijucana a certeza silenciosa da cumplicidade filial. Não. A mãe tijucana gosta de pôr o próprio filho - "sangue do meu sangue!", a mãe tijucana adora tal expressão - num outdoor imaginário.
Vamos a exemplos práticos - e vocês hão de me entender.
Há uma piada, uma historinha sobre a mãe judia. A mãe judia passeia com seus gêmeos, dois meses de idade, empurrando, contente, o carrinho pelo calçadão da praia. Uma velhinha estaca diante do carrinho e diz:
- Oh! Que lindos! São seus?
E a idishe mama, apontando para um, depois para o outro:
- Sim! Este é médico, e este é engenheiro.
Notem que o fanatismo expõe a mãe judia ao ridículo.
A mãe tijucana, por sua vez, dá carinho, alimenta, educa, orienta o filho até o dia de sua formatura. Espera ver o canudo na mão do filhote. E dali em diante, aí sim, dali em diante passa a apresentar o filho:
- Eduardo, meu mais velho, advogado!
E ainda completa:
- Tem seu cartão aí, filho?
- Não, mãe... - coradíssimo de vergonha.
E ela, implacável:
- Mas eu tenho! - e estende o cartão em direção à amiga.
Outro exemplo: o filho da mãe tijucana consegue um bom emprego, imprime vigoroso êxito na carreira, até que um dia anuncia a compra de um apartamento. De um bom apartamento. De um bom apartamento em um condomínio fechado, de luxo, e a mãe enche-se de orgulho. Enche-se de orgulho e crava, na cabeça e no coração, uma meta: suas amigas têm que conhecer o apartamento do filho, precisam conhecer o apartamento do filho.
Eu não sei se vocês conseguem acompanhar o que eu digo. Mas se tal se dá com o filho de uma mãe de Copacabana, por exemplo, a aquisição do imóvel vai merecer, no máximo, um jantar em família. Um brinde singelo, um orgulho que a mãe guardará no coração discreto. Já com a mãe da Tijuca, não. Voltemos a ela e à cena que quero lhes propôr para uma mais ampla compreensão do modus operandi da mãe tijucana.
O filho, já tendo dado a notícia da compra do imóvel, põe a mãe no banco do carona e desliza com o automóvel até o apartamento. A mãe, que já tem nas mãos a chave do apartamento novo de seu filho, grita à certa altura:
- Pára! Pára! Rapidinho!
Salta. Volta em menos de dez minutos. O filho:
- O que você foi fazer, mãe?
- Cópia da chave para mim! Toca pro apartamento, toca!
Lá chegando, a mãe é uma festa de "ohs" e "ahs". E decreta, ainda na sala:
- Ah! Mas eu tenho que trazer a Rita de Cássia pra conhecer isso aqui!
Percebam a obsessão pelo filho num outdoor:
- O prédio tem salão de festas?
- Tem, mãe...
- Oh! Que maravilha! Vou marcar um chá com minhas amigas aqui, na semana que vem!!!
- Mas, mãe, eu ainda nem me mud...
- Ih, meu filho, isso é o de menos! A Regina Lúcia precisa conhecer seu apartamento, seu prédio! - e dá pequeno saltitos enquanto avança pelo corredor.
- Mas eu só me mudo na semana que vem, mam...
- Ótimo! Vou chamar a Lia Cristina para dar uns toques na decoração!
E fica, a mãe tijucana, tendo crises de urticária e ansiedade enquanto não consegue levar as amigas para conhecerem o ninho do filhote. Até que, no dia da tal visita, dá-se ainda mais impressionante coisa. A mãe ignora, solenemente, dianta da amiga, a presença do filho. Tem a obsessão de expôr a sala, os móveis, a vista, as ferragens dos banheiros, o blindex do box e a cama, os quadros, a qualidade dos lençóis, esses troços. É uma febril, apontando o indicador orgulhoso em direção a tudo.
A mãe judia jamais faria isso. A mãe judia tem medo do olho gordo, a mãe judia teme seqüestros, a mãe judia tem o pânico da exposição à toa.
Notaram a diferença?
Dia desses volto a falar da mãe tijucana.
Eu, que evidentemente tenho uma (a quem amo profundamente), falo com conhecimento de causa.
Até.
22.9.08
RIO-BRASÍLIA: PARECE QUE FECHOU MESMO
Com esse cartaz mal escrito - "ESTAMOS NA LOJE D. AO LADO ESO OLHAR" - o casal Joaquim e Terezinha anunciou o que parecia mentira: o RIO-BRASÍLIA, portento tijucano, fechou definitivamente. Acabo de chegar de lá - do bistrô inaugurado pelo casal - com o Felipinho Cereal (entenda o imbroglio lendo isso aqui, isso aqui, isso aqui e isso aqui). Fomos em busca de notícias concretas, para não ficarmos supondo coisas eventualmente sem fundamento.
Encontramo-nos às 18h30min na QUITANDA ABRONHENSE. Bebemos duas cervejas geladíssimas servidas pelo seu José, conversamos com o Szegeri e com o Simas, que telefonaram em busca de notícias, e seguimos o trecho Matoso, Doutor Satamini e Almirante Gavião até o RIO-BRASÍLIA.
Demos de cara com esse cartaz, bisonho.
Fomos até o bistrô. Vazio, um homem desconhecido bebendo do lado de fora, e Deus - trabalhando lá, agora, disse:Encontramo-nos às 18h30min na QUITANDA ABRONHENSE. Bebemos duas cervejas geladíssimas servidas pelo seu José, conversamos com o Szegeri e com o Simas, que telefonaram em busca de notícias, e seguimos o trecho Matoso, Doutor Satamini e Almirante Gavião até o RIO-BRASÍLIA.
Demos de cara com esse cartaz, bisonho.
- Ô, gente! Entra! Estão com medo?
A resposta:
- Medo? Não. Mas com nojo.
Veio ao balcão a Terezinha.
Felipinho Cereal, com os olhos marejados, começou:
- Puxa vida, Terezinha, vocês nem pra avisarem a gente que...
E ela, grossíssima, sem nem olhar nos olhos do meu amigo:
- Sermão, não! Vá reclamar com o Joaquim! Passa depois aqui, quando ele estiver!
E ficou ali, sendo vaga, vaguíssima, evasiva, dizendo frases sem sentido como:
- Por enquanto o Rio-Brasília está fechado.
- O bar não vai fechar, não. Mas a cozinha foi deslocada para cá.
- Comida agora, só aqui. Lá, nunca mais.
- Não temos público para as duas casas.
- Nossos clientes gostaram da mudança.
- Ainda estamos decidindo o que fazer.
E outras merdas do mesmo gênero.
Fomos beber a última do dia - segunda-feira, afinal! - no ESTUDANTIL, adorável espelunca na Haddock Lobo entre a Alberto de Sequeira e a Almirante Gavião.
Quando tomamos o rumo de casa, decidi fazer uma fotografia - que ficou péssima, à moda do bistrô do casal - do troço.
Notem, ao fundo, à direita, o escuro.
Ali ficava o RIO-BRASÍLIA.
Essa coisa com cores de lanchonete, casa de suco, sei lá o quê, é a nova aposta do Joaquim.
Lamentável.
Até.
EXTRA - MAIS SOBRE O FECHAMENTO DO RIO-BRASÍLIA
Estou indo daqui a pouco, pouquíssimo, encontrar o desolado Felipinho Cereal. Vamos até o bistrô do casal Joaquim e Terezinha em busca de notícias. Pode ser que não dê em nada, já que, pelos últimos acontecimentos, eles escondem o jogo com a mesma presteza com quem serviam carne assada, coradas, maracujá e limãozinho da casa. Em breve, portanto, novidades aqui no BUTECO. Aguardem.
Até.
Até.
RIO-BRASÍLIA FECHADO
São 13h02min.
Em condições normais de temperatura e pressão, o RIO-BRASÍLIA estaria lotado a essa hora, mesas e calçada cheias de gente em busca da comida caseira que faz (ou fazia...) a festa dos trabalhadores da região no horário do almoço.
Meu querido sogro, Wlader Dutra Miranda, que está passando uma temporada na Tijuca, lá em casa, acaba de me bater o celular:
- Edu? O RIO-BRASÍLIA fechou! Passei por lá agora e tem um cartaz na porta escrito que eles estão funcionando na loja ao lado... Triste, né?
Tristíssimo.
Até.
Em condições normais de temperatura e pressão, o RIO-BRASÍLIA estaria lotado a essa hora, mesas e calçada cheias de gente em busca da comida caseira que faz (ou fazia...) a festa dos trabalhadores da região no horário do almoço.
Meu querido sogro, Wlader Dutra Miranda, que está passando uma temporada na Tijuca, lá em casa, acaba de me bater o celular:
- Edu? O RIO-BRASÍLIA fechou! Passei por lá agora e tem um cartaz na porta escrito que eles estão funcionando na loja ao lado... Triste, né?
Tristíssimo.
Até.
O MELHOR DA INAUGURAÇÃO DO BISTRÔ
O que houve de melhor na sexta-feira passada, 19 de setembro, durante a inauguração do decepcionante bistrô do Joaquim e da Terezinha, aconteceu no RIO-BRASÍLIA.
Graças ao planejamento do Joaquim, o RIO-BRASÍLIA ficou, na sexta-feira, acéfalo: não havia ninguém no balcão, ninguém servindo ninguém, um mísero cozinheiro, um único funcionário, nada!
E o que fez nosso querido Felipinho Cereal?
Passou pro lado de dentro do balcão, passou a servir a freguesia que se recusou a pisar no tal bistrô e lavou os copos de toda a assistência - como comprovam as fotografias abaixo. Talvez, lamentavelmente, pela última vez...
Graças ao planejamento do Joaquim, o RIO-BRASÍLIA ficou, na sexta-feira, acéfalo: não havia ninguém no balcão, ninguém servindo ninguém, um mísero cozinheiro, um único funcionário, nada!
E o que fez nosso querido Felipinho Cereal?
Passou pro lado de dentro do balcão, passou a servir a freguesia que se recusou a pisar no tal bistrô e lavou os copos de toda a assistência - como comprovam as fotografias abaixo. Talvez, lamentavelmente, pela última vez...
Até.
O JOAQUIM ENLOUQUECEU - II
Dia desses escrevi O JOAQUIM ENLOUQUECEU (leiam aqui), lhes contando sobre o preço da porção de salaminho no bistrô que acaba de ser aberto na Almirante Gavião, ao lado do RIO-BRASÍLIA. Cobrando quase vinte e seis reais por uma porção miserável de salaminho (cujo quilo, numa padaria, custa isso!), o Joaquim vai dando mostras não apenas de sua ganância mas também da diretriz que pretende imprimir à nova empreitada.
Ontem, domingo, enquanto eu aproveitava o frio na serra de Santa Teresa (para o tijucano, Santa Teresa é uma espécie de Petrópolis mais perto), o Joaquim dava mais uma prova de insanidade.
Soube pelo Pratinha e pelo Tande Biar (ambos leitores do BUTECO) que o Joaquim, depois de décadas de tradição, fechou - vou escrever com maiúsculas e em negrito... FECHOU! - o RIO-BRASÍLIA para concentrar seu público (pausa para uma golfada de leve) diante da TV de LCD que ocupa quase uma parede inteira do novo bistrô.
Lamentável.
Até.
Ontem, domingo, enquanto eu aproveitava o frio na serra de Santa Teresa (para o tijucano, Santa Teresa é uma espécie de Petrópolis mais perto), o Joaquim dava mais uma prova de insanidade.
Soube pelo Pratinha e pelo Tande Biar (ambos leitores do BUTECO) que o Joaquim, depois de décadas de tradição, fechou - vou escrever com maiúsculas e em negrito... FECHOU! - o RIO-BRASÍLIA para concentrar seu público (pausa para uma golfada de leve) diante da TV de LCD que ocupa quase uma parede inteira do novo bistrô.
Lamentável.
Até.
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - IV
Dia desses eu estava de carro, dando carona ao Ricardo, marido da Magali, minha cunhada, irmã da mulher que me ensinou a sorrir, quando ele me disse, do banco do carona:
- Estou com fome. Vamos parar pra comer alguma coisa?
Estávamos na Mariz e Barros e os pneus do automóvel cantaram eufóricos quando dobrei à esquerda na Afonso Pena:
- Vamos ao Salete!
Era um sábado. E por uma dessas insondáveis decisões anti-comerciais o SALETE fecha às oito da noite aos sábados. Eram sete e quarenta da noite quando estacionei diante do bar e sentamo-nos do lado de fora. Veio o garçom:
- Dois chopes na pressão! E quatro empadas.
- Senhor, com licença... A cozinha já fechou para pedidos e infelizmente as empadas acabaram faz tempo...
- O Ferreira está aí?
- Sim, senhor.
- Pode chamá-lo?
- Pois não.
Veio o Ferreira à mesa, o gerente, e ele passou a fazer com os braços os mesmos gestos afoitos que fazem os bonecos infláveis dos postos de gasolina quando me viu.
Nem precisei de muitos argumentos:
- Ô, Eduardo, quantas empadas vocês vão querer?
E ficamos ali, eu e o Ricardo, bebendo chope, comendo empada e conversando sobre a Tijuca, centro de nossas atenções naquele começo de noite.
É preciso que eu lhes diga que o Ricardo também é (como eu) um típico exemplar de hommo tijuccanus. Vejam se não é: nasceu na Barão de Mesquita, fez natação e futebol aquático no TIJUCA TÊNIS CLUBE, estudou no SÃO JOSÉ e fez medicina na UERJ.
Morando hoje na Barra da Tijuca por contingências que não vêm ao caso, perguntou-me o Ricardo apontando para a esquina da Mariz e Barros com a Afonso Pena:
- Ali não era a Gerbô?
Ah, meus poucos mas fiéis leitores... A pergunta foi como um murro na alma e fui violentamente arremessado ao passado. Senti, no instante seguinte à pergunta, um forte gosto de palmière na boca (biscoitos caramelados que eram um dos vícios gastronômicos de mamãe) e me vi, de calças curtas e camisa listrada, de mãos dadas com papai e mamãe, no amplo salão branquíssimo, cercado por vitrines giratórias exibindo bolos e tortas impressionantes! E disse ao Ricardo, que concordou comigo às gargalhadas:
- Festa na Tijuca sem bolo da Gerbô era vaiada na hora do parabéns.
Eis a verdade inapelável: a ansiedade dos convidados de uma festa de aniversário, de uma comemoração de bodas, de uma festa de debutante, era verificar a grife do bolo, da torta. Havia, inclusive, uma cisão nítida entre os mais velhos. Os mais tradicionais, os mais conservadores, os mais arraigados às tradições do bairro (caso de minha bisavó, de minha avó, de minha mãe) consideravam a GERBÔ o ápice em matéria de doceria. Os mais avançados (termo debochado que minha bisavó usava), os mais tendentes às coisas novidadeiras, preferiam a VOVÓ CATARINA, que luta para manter-se aberta até hoje, na Conde de Bonfim.
Falei da GERBÔ e ficamos lembrando do comércio de rua naquele pedacinho da Tijuca. Papai e mamãe, sempre que precisávamos de uma fotografia 3x4, me levavam para posar na FRIMA, que ficava ao lado da REGINA, que deu lugar à TRIGUS, na esquina da Mariz e Barros com a Ibituruna.
Papai comprava seus automóveis no CARDOSO, que ficava no POSTO LORD, na Campos Sales, e enquanto papai escolhia o carro, nós nos fartávamos na PITUCHINHA comendo os mais saborosos salgadinhos que, aleluia!, ainda podem ser comidos no mesmíssimo lugar.
Perto das nove e meia da noite, embriagados pelas lembranças do bairro e delicadamente convidados pelo Ferreira para irmos embora, tomamos a direção da Barra da Tijuca.
Tijucaníssimos, subindo a Conde de Bonfim em direção ao Alto da Boa Vista, ainda fomos pelo caminho numa festa de indicadores apontados para fora das janelas do carro:
- Carioca e América, dois portentosos cinemas que deram lugar a uma farmácia e a uma igreja evangélica... Eu assisti à estréia de E.T. aqui!!!
- Bruni Tijuca, como eu vim ver filmes aqui...
- Aqui ficava a Khalil M. Gebara!
- Olha o Tijuca!
- Como é antiga a Five Magazine, ainda está ali, olha só...
- Ainda existe a Vanzilotta?????
- Claro! Fica aqui na José Higino, ó, onde eu estudei muito tempo! Grande Palas...
- Ainda tem a Tele-Rio, aqui?! Putz!
- E onde é o Otto, ali ó, era o Bicho da Tijuca, tremenda espelunca...
- Cara! O Batista!
- Olha só! Outra filial do Palas, abandonada... Aqui estudei no segundo grau...
- O Só Kana, Edu! Ainda existe! Olha só!
- Rua da Cascata, Rico. Aqui também havia um Palas...
- Ordem Terceira da Penitência...
- ... onde eu nasci!
Um pouco mais à frente eu percebo o homenzarrão de quase dois metros, do meu lado, fungando:
- Pô... o São José... que saudade... Nem prestei atenção quando passamos a Vovó Catarina... - e assoou o nariz, os olhos vermelhos, enxugando os óculos.
E subimos o Alto da Boa Vista impregnados disso tudo.
Até.
- Estou com fome. Vamos parar pra comer alguma coisa?
Estávamos na Mariz e Barros e os pneus do automóvel cantaram eufóricos quando dobrei à esquerda na Afonso Pena:
- Vamos ao Salete!
Era um sábado. E por uma dessas insondáveis decisões anti-comerciais o SALETE fecha às oito da noite aos sábados. Eram sete e quarenta da noite quando estacionei diante do bar e sentamo-nos do lado de fora. Veio o garçom:
- Dois chopes na pressão! E quatro empadas.
- Senhor, com licença... A cozinha já fechou para pedidos e infelizmente as empadas acabaram faz tempo...
- O Ferreira está aí?
- Sim, senhor.
- Pode chamá-lo?
- Pois não.
Veio o Ferreira à mesa, o gerente, e ele passou a fazer com os braços os mesmos gestos afoitos que fazem os bonecos infláveis dos postos de gasolina quando me viu.
Nem precisei de muitos argumentos:
- Ô, Eduardo, quantas empadas vocês vão querer?
E ficamos ali, eu e o Ricardo, bebendo chope, comendo empada e conversando sobre a Tijuca, centro de nossas atenções naquele começo de noite.
É preciso que eu lhes diga que o Ricardo também é (como eu) um típico exemplar de hommo tijuccanus. Vejam se não é: nasceu na Barão de Mesquita, fez natação e futebol aquático no TIJUCA TÊNIS CLUBE, estudou no SÃO JOSÉ e fez medicina na UERJ.
Morando hoje na Barra da Tijuca por contingências que não vêm ao caso, perguntou-me o Ricardo apontando para a esquina da Mariz e Barros com a Afonso Pena:
- Ali não era a Gerbô?
Ah, meus poucos mas fiéis leitores... A pergunta foi como um murro na alma e fui violentamente arremessado ao passado. Senti, no instante seguinte à pergunta, um forte gosto de palmière na boca (biscoitos caramelados que eram um dos vícios gastronômicos de mamãe) e me vi, de calças curtas e camisa listrada, de mãos dadas com papai e mamãe, no amplo salão branquíssimo, cercado por vitrines giratórias exibindo bolos e tortas impressionantes! E disse ao Ricardo, que concordou comigo às gargalhadas:
- Festa na Tijuca sem bolo da Gerbô era vaiada na hora do parabéns.
Eis a verdade inapelável: a ansiedade dos convidados de uma festa de aniversário, de uma comemoração de bodas, de uma festa de debutante, era verificar a grife do bolo, da torta. Havia, inclusive, uma cisão nítida entre os mais velhos. Os mais tradicionais, os mais conservadores, os mais arraigados às tradições do bairro (caso de minha bisavó, de minha avó, de minha mãe) consideravam a GERBÔ o ápice em matéria de doceria. Os mais avançados (termo debochado que minha bisavó usava), os mais tendentes às coisas novidadeiras, preferiam a VOVÓ CATARINA, que luta para manter-se aberta até hoje, na Conde de Bonfim.
Falei da GERBÔ e ficamos lembrando do comércio de rua naquele pedacinho da Tijuca. Papai e mamãe, sempre que precisávamos de uma fotografia 3x4, me levavam para posar na FRIMA, que ficava ao lado da REGINA, que deu lugar à TRIGUS, na esquina da Mariz e Barros com a Ibituruna.
Papai comprava seus automóveis no CARDOSO, que ficava no POSTO LORD, na Campos Sales, e enquanto papai escolhia o carro, nós nos fartávamos na PITUCHINHA comendo os mais saborosos salgadinhos que, aleluia!, ainda podem ser comidos no mesmíssimo lugar.
Perto das nove e meia da noite, embriagados pelas lembranças do bairro e delicadamente convidados pelo Ferreira para irmos embora, tomamos a direção da Barra da Tijuca.
Tijucaníssimos, subindo a Conde de Bonfim em direção ao Alto da Boa Vista, ainda fomos pelo caminho numa festa de indicadores apontados para fora das janelas do carro:
- Carioca e América, dois portentosos cinemas que deram lugar a uma farmácia e a uma igreja evangélica... Eu assisti à estréia de E.T. aqui!!!
- Bruni Tijuca, como eu vim ver filmes aqui...
- Aqui ficava a Khalil M. Gebara!
- Olha o Tijuca!
- Como é antiga a Five Magazine, ainda está ali, olha só...
- Ainda existe a Vanzilotta?????
- Claro! Fica aqui na José Higino, ó, onde eu estudei muito tempo! Grande Palas...
- Ainda tem a Tele-Rio, aqui?! Putz!
- E onde é o Otto, ali ó, era o Bicho da Tijuca, tremenda espelunca...
- Cara! O Batista!
- Olha só! Outra filial do Palas, abandonada... Aqui estudei no segundo grau...
- O Só Kana, Edu! Ainda existe! Olha só!
- Rua da Cascata, Rico. Aqui também havia um Palas...
- Ordem Terceira da Penitência...
- ... onde eu nasci!
Um pouco mais à frente eu percebo o homenzarrão de quase dois metros, do meu lado, fungando:
- Pô... o São José... que saudade... Nem prestei atenção quando passamos a Vovó Catarina... - e assoou o nariz, os olhos vermelhos, enxugando os óculos.
E subimos o Alto da Boa Vista impregnados disso tudo.
Até.
21.9.08
RUA DO MATOSO - A SÉRIE - BASTIDORES V
Fizemos ontem, sábado, partindo às oito e meia da manhã da PADARIA MILU, nosso terceiro e último passeio pela rua do Matoso visando a série que publicarei no BUTECO a partir dessa semana, e hoje publico a quinta edição dos bastidores dos passeios (aqui o I, aqui o II, aqui o III e aqui o IV).
Fomos eu, Felipinho Cereal e meu pai, meu amado pai, Isaac Goldenberg.
A primeira Brahma foi às 8h50min no ESCONDIDINHO DA MATOSO. De lá, seguimos em direção à QUITANDA ABRONHENSE, onde derrubamos mais algumas garrafas de cerveja em meio a um fabuloso papo com o seu José e com a dona Conceição, o casal que comanda aquele oásis desde 1967.
Visitamos mais algumas lojas antiqüíssimas da rua e terminamos no ARMAZÉM MATOSO (mais detalhes durante a publicação da série), onde vivemos momentos intensamente emocionantes, fechando com chave de ouro nosso terceiro passeio.Fomos eu, Felipinho Cereal e meu pai, meu amado pai, Isaac Goldenberg.
A primeira Brahma foi às 8h50min no ESCONDIDINHO DA MATOSO. De lá, seguimos em direção à QUITANDA ABRONHENSE, onde derrubamos mais algumas garrafas de cerveja em meio a um fabuloso papo com o seu José e com a dona Conceição, o casal que comanda aquele oásis desde 1967.
Até.
20.9.08
O JOAQUIM ENLOUQUECEU
Cheguei há pouco do passeio à Matoso com o Felipinho Cereal e com meu amado pai.
Como eu já lhes contei hoje pela manhã (leiam aqui), o gênio do comércio, o Joaquim, está cobrando, em seu novo bar (restaurante, sei lá), absurdos R$ 25,90 (vinte e cinco reais e noventa centavos) por uma porção miserável de salaminho.
Fechamos o passeio de hoje com algumas garrafas de Brahma geladíssima no MARRECO, buteco na esquina da Haddock Lobo com Caruso. Eis o preço da porção de salaminho, da mesmíssima marca servida pelo Joaquim, em quantidade infinitamente mais generosa: R$ 8,00 (oito reais).
Por extenso e em negrito: OITO REAIS.
Até.
Como eu já lhes contei hoje pela manhã (leiam aqui), o gênio do comércio, o Joaquim, está cobrando, em seu novo bar (restaurante, sei lá), absurdos R$ 25,90 (vinte e cinco reais e noventa centavos) por uma porção miserável de salaminho.
Fechamos o passeio de hoje com algumas garrafas de Brahma geladíssima no MARRECO, buteco na esquina da Haddock Lobo com Caruso. Eis o preço da porção de salaminho, da mesmíssima marca servida pelo Joaquim, em quantidade infinitamente mais generosa: R$ 8,00 (oito reais).
Por extenso e em negrito: OITO REAIS.
Até.
JOAQUIM E TEREZINHA - AS IMPRESSÕES
A princípio chama-se JOAQUIM E TEREZINHA o bar inaugurado na noite de ontem na Almirante Gavião, conforme lhes contei aqui. Ao menos era esse o nome estampado na camiseta e no avental dos funcionários que lá trabalhavam, atônitos (o bar estava lotado).
Segundo alguns freqüentadores jurássicos do glorioso RIO-BRASÍLIA previam, a nova casa não é, nem a fórceps, um buteco. Está mais para restaurante ou, como disse um iroso Felipinho Cereal (ontem pude sentir, de perto, a ebulição de seu sangue espanhol), para uma filial desses bares-de-grife que tanto mal fazem à cidade.
Há uma TV de LCD gigantesca na parede, que passou a noite no volume máximo. Uma porção de salaminho custa (sentem, sentem, sentem!) R$ 25,90 (vinte e cinco reais e noventa centavos). A Brahma, que no RB sai por R$ 3,00, custa R$ 3,20. O público, barulhentíssimo, em nada se parece com a fina flor da escumalha que dá vida ao buteco humilde de azulejos azuis e pretos na parede... Uma tristeza, em suma.
Passamos a noite no RB. Mesa enorme (pela ordem): mamãe, Guerreira, Manguaça, Natasha, a Rafa com o Tito e seus dois moleques, Vidal, Claudinha, papai e Comandante, e eu e Felipinho , ambos de pé, no balcão.
De certo modo, um alívio acalentou-me: não haverá, jamais, a angústia ou a dúvida me acossando quando eu dobrar a esquina da Haddock Lobo com a Almirante Gavião. Meu destino será, sempre, o portentoso RIO-BRASÍLIA, sua velha TV de 29 polegadas, seu banheiro único, seu balcão humilde, seus azulejos pré-históricos, suas mesas do LA-FAYETTE e sua jardineira de Espadas-de-São-Jorge e pés de boldo.
Até.
Segundo alguns freqüentadores jurássicos do glorioso RIO-BRASÍLIA previam, a nova casa não é, nem a fórceps, um buteco. Está mais para restaurante ou, como disse um iroso Felipinho Cereal (ontem pude sentir, de perto, a ebulição de seu sangue espanhol), para uma filial desses bares-de-grife que tanto mal fazem à cidade.
Há uma TV de LCD gigantesca na parede, que passou a noite no volume máximo. Uma porção de salaminho custa (sentem, sentem, sentem!) R$ 25,90 (vinte e cinco reais e noventa centavos). A Brahma, que no RB sai por R$ 3,00, custa R$ 3,20. O público, barulhentíssimo, em nada se parece com a fina flor da escumalha que dá vida ao buteco humilde de azulejos azuis e pretos na parede... Uma tristeza, em suma.
Passamos a noite no RB. Mesa enorme (pela ordem): mamãe, Guerreira, Manguaça, Natasha, a Rafa com o Tito e seus dois moleques, Vidal, Claudinha, papai e Comandante, e eu e Felipinho , ambos de pé, no balcão.
De certo modo, um alívio acalentou-me: não haverá, jamais, a angústia ou a dúvida me acossando quando eu dobrar a esquina da Haddock Lobo com a Almirante Gavião. Meu destino será, sempre, o portentoso RIO-BRASÍLIA, sua velha TV de 29 polegadas, seu banheiro único, seu balcão humilde, seus azulejos pré-históricos, suas mesas do LA-FAYETTE e sua jardineira de Espadas-de-São-Jorge e pés de boldo.
Até.
19.9.08
DOIS AVISOS MÍNIMOS
Em primeiro lugar: é hoje, sexta-feira, a inauguração do novo buteco do Joaquim e da Terezinha, como eu já havia lhes dito aqui. Como o Joaquim não é dado a formalidades ou frescuradas (como ele prefere dizer), a espelunca está aberta desde hoje cedo. Mas a escumalha que freqüenta o RIO-BRASÍLIA vai mesmo, em peso, comparecer apenas mais à noite. Eu aparecerei por volta das 22h. Apareçam vocês também. A Almirante Gavião e a família tijucana agradecem penhoradamente.
E em segundo lugar: como vocês estão sabendo acompanhando os bastidores dos passeios à rua do Matoso (I, II, III e IV), estamos preparando - eu e Felipinho Cereal, com o auxílio de meu amado pai e de amigos como o Simas - uma série sobre a rua do Matoso. Amanhã, sábado, às oito e meia da manhã, partimos para o terceiro e (esperamos!) último passeio com esse fim. Semana que vem, se der tudo certo, a série começa a ser publicada.
Até.
E em segundo lugar: como vocês estão sabendo acompanhando os bastidores dos passeios à rua do Matoso (I, II, III e IV), estamos preparando - eu e Felipinho Cereal, com o auxílio de meu amado pai e de amigos como o Simas - uma série sobre a rua do Matoso. Amanhã, sábado, às oito e meia da manhã, partimos para o terceiro e (esperamos!) último passeio com esse fim. Semana que vem, se der tudo certo, a série começa a ser publicada.
Até.
A TIJUCA EM ESTADO BRUTO - III
Fascinante, quero confessar a vocês, falar sobre a Tijuca sob o prisma de seus personagens que dão cor, forma, cheiro, conteúdo e solidez ao bairro. O que eu chamo, vocês sabem, de Tijuca em estado bruto.
Sobre a Tijuca, muito já se disse. Meu caro amigo Aldir Blanc, por exemplo, disse, com muita propriedade, que a Tijuca não é um estado de espírito, é um estado de sítio. Alguém decretou que o tijucano pode sair da Tijuca, mas a Tijuca não sai, jamais, de dentro do tijucano.
Vejam vocês o caso de meus irmãos (serei discretíssimo para não devassar suas intimidades). Um está morando em Santa Teresa. Sua casa quase que não tem paredes; tem janelões de blindex que dão vista para a opulenta mata que verdeja aquele aprazível bairro carioca. E o que fez meu irmão com menos de uma semana na casa nova? Colou, nos janelões de blindex que o impressionaram (confessou-se impressionadíssimo, com a voz trêmula, no primeiro telefonema que me deu de lá), adesivos com o escudo do Vasco, adesivos da campanha do Roberto Dinamite para presidente do clube cruzmaltino e um, que é seu xodó, da PIER, loja que foi febre entre os tijucanos na década de 80. O outro mora na Barra da Tijuca em um condomínio novíssimo, luxuoso, com seguranças por toda a parte. Os prédios são sóbrios, os apartamentos têm varandas sóbrias, e assim, olhando de longe, você vê, de cara, qual o apartamento de meu irmão: na varanda, uma samambaia-chorona, planta-símbolo da Tijuca, rejeitada pelos decoradores da elite; sua toalha de banho, embora haja varal no apartamento, permanentemente secando pendurada na varanda; e um adesivo, bem no estilo Barra da Tijuca, grudado na janela da cozinha com visão para quem vê de fora: I LOVE TIJUCA. Uma beleza! Uma beleza! Deixemos meus irmãos de lado e vamos falar de mamãe.
Mamãe tem, vez por outra, crises de identidade. Fala mal da Tijuca, pragueja contra o bairro, esculhamba o modus vivendi do tijucano, reclama mais educação e polidez, mas não tem jeito... Mamãe é Tijuca da sola dos pés ao mais alto fio de cabelo, ambos (pés e cabelo) tratados à pão-de-ló num salão de beleza na Tijuca, é evidente. Notem a cena (só possível aos tijucanos).
Estou com mamãe, num desses últimos domingos, assistindo a uma palestra. A palestra corria já há uma hora e quinze minutos e mamãe roncava, de leve, com a cabeça deitada em meu ombro esquerdo. Roncava e eu percebia que uma velhinha, de longe, olhava sorrindo para nós. Eu pensava: está achando bonito esse carinho do filho com a mãe?; está achando engraçado ver minha mãe dormindo solenemente durante o esforço do palestrante?; será que ela conhece minha mãe?
A palestra chegou ao fim. Cutuquei mamãe, que disse ajeitando os óculos:
- Interessantésima a palestra, né, Dudu?
Disposto a não polemizar, nem respondi. E percebi a velhota vindo em nossa direção com o mesmo sorriso. Eu disse:
- Mãe, quem é essa velhinha que vem aí?
- Quem?
- Aquela, mãe! De saia azul de bolinha branca e camisa branca de bolinha azul!
- Ahhhhh! - disse, terna.
- Quem é?
- É a irmã do doutor Lauro...
- Irmã do doutor Lauro? - estranhei.
Chega-se a velhinha.
- Ô, Mariazinha! Há quanto tempo!
- É verdade, é verdade...
Mamãe se levantou, abraçou a velhinha e a velhinha disse:
- Esse é o seu filho mais velho? Eduardo, né?
E dirigindo-se a mim, ainda abraçada à minha mãe:
- Eu te vi desse tamaninho!!! - e pôs as mãos na altura do joelho.
Sorri.
Mamãe, ainda abraçada a ela, cochichou em minha direção:
- Não é a irmã do doutor Lauro!
Ficaram de frente uma para a outra.
- E como vai sua mãe? Saudade da Mathilde!
- Mamãe está ótima!
Mamãe tinha feições de preocupação. Certa de que não estava diante da irmã do doutor Lauro, parecia não saber o que perguntar. Foi vaga:
- Como vão todos?
- Bem...
Olhos de pânico, mamãe arriscou, genérica:
- E a filharada?
- Como?
- Hã? - mamãe, instintivamente mas sem nenhum efeito prático, deu-me um bico na altura da canela.
- O Leandro vai bem...
- Graças a Deus! - gritou mamãe com as mãos pro alto.
A velhinha sem entender muito bem o que se passava.
Os olhos de minha mãe pareciam uma máquina de caça-níquel. Ela buscava, nos recônditos da memória, o Leandro - e parecia não encontrar.
- E a senhora, está morando aonde?
A velha a desafiou:
- Você sabe quem eu sou, Mariazinha?
- Imagina! A senhora está quase me ofendendo! - e riu dando tapinhas nas costas da velhota.
Ficaram ali, conversando, e eu pedi licença pra ir ao banheiro. De dentro do banheiro, ao celular:
- Vó? Tudo bem? Escuta... quem é uma velhinha, amiga sua possivelmente, que me viu pequeno, que tem um filho chamado Leandro...
A memória de vovó, infalível:
- A Ana, meu filho! Da vila da Professor Gabizo! Vocês estão com ela?!
- Depois falo com você, vó! Um beijo.
Volto a elas.
A velhinha está dizendo:
- Mas, minha filha, não se trata de desconfiar... Mas é que eu estou com impressão de que você não está mesmo me reconhecendo!
Eu:
- Não seja injusta, dona Ana! Mamãe passou grande parte da palestra me contando sobre suas histórias, sobre o Leandro, sobre o tempo bom que foi aquele vivido naquela vila da Professor Gabizo...
Os olhos de dona Ana empoçaram.
- ... disse que seria emoção demais falar pessoalmente com a senhora depois de tantos anos!
Mamãe, teatral:
- Dona Ana!!!!! - e agarrou a velha.
Ficaram ali, abraçadas, e a velhinha disse:
- Ainda na Tijuca, minha filha?
- Ô! O que é que a senhora acha?
- E o filhão? Também?
- Ô! - repetiu mamãe.
Partimos para um lanche, eu e minha mãe, e rimos muito do encontro inusitado, de meu telefone para minha avó de dentro do banheiro, e das histórias - realmente divertidas - da dona Ana na vila da Professor Gabizo.
Até.
Sobre a Tijuca, muito já se disse. Meu caro amigo Aldir Blanc, por exemplo, disse, com muita propriedade, que a Tijuca não é um estado de espírito, é um estado de sítio. Alguém decretou que o tijucano pode sair da Tijuca, mas a Tijuca não sai, jamais, de dentro do tijucano.
Vejam vocês o caso de meus irmãos (serei discretíssimo para não devassar suas intimidades). Um está morando em Santa Teresa. Sua casa quase que não tem paredes; tem janelões de blindex que dão vista para a opulenta mata que verdeja aquele aprazível bairro carioca. E o que fez meu irmão com menos de uma semana na casa nova? Colou, nos janelões de blindex que o impressionaram (confessou-se impressionadíssimo, com a voz trêmula, no primeiro telefonema que me deu de lá), adesivos com o escudo do Vasco, adesivos da campanha do Roberto Dinamite para presidente do clube cruzmaltino e um, que é seu xodó, da PIER, loja que foi febre entre os tijucanos na década de 80. O outro mora na Barra da Tijuca em um condomínio novíssimo, luxuoso, com seguranças por toda a parte. Os prédios são sóbrios, os apartamentos têm varandas sóbrias, e assim, olhando de longe, você vê, de cara, qual o apartamento de meu irmão: na varanda, uma samambaia-chorona, planta-símbolo da Tijuca, rejeitada pelos decoradores da elite; sua toalha de banho, embora haja varal no apartamento, permanentemente secando pendurada na varanda; e um adesivo, bem no estilo Barra da Tijuca, grudado na janela da cozinha com visão para quem vê de fora: I LOVE TIJUCA. Uma beleza! Uma beleza! Deixemos meus irmãos de lado e vamos falar de mamãe.
Mamãe tem, vez por outra, crises de identidade. Fala mal da Tijuca, pragueja contra o bairro, esculhamba o modus vivendi do tijucano, reclama mais educação e polidez, mas não tem jeito... Mamãe é Tijuca da sola dos pés ao mais alto fio de cabelo, ambos (pés e cabelo) tratados à pão-de-ló num salão de beleza na Tijuca, é evidente. Notem a cena (só possível aos tijucanos).
Estou com mamãe, num desses últimos domingos, assistindo a uma palestra. A palestra corria já há uma hora e quinze minutos e mamãe roncava, de leve, com a cabeça deitada em meu ombro esquerdo. Roncava e eu percebia que uma velhinha, de longe, olhava sorrindo para nós. Eu pensava: está achando bonito esse carinho do filho com a mãe?; está achando engraçado ver minha mãe dormindo solenemente durante o esforço do palestrante?; será que ela conhece minha mãe?
A palestra chegou ao fim. Cutuquei mamãe, que disse ajeitando os óculos:
- Interessantésima a palestra, né, Dudu?
Disposto a não polemizar, nem respondi. E percebi a velhota vindo em nossa direção com o mesmo sorriso. Eu disse:
- Mãe, quem é essa velhinha que vem aí?
- Quem?
- Aquela, mãe! De saia azul de bolinha branca e camisa branca de bolinha azul!
- Ahhhhh! - disse, terna.
- Quem é?
- É a irmã do doutor Lauro...
- Irmã do doutor Lauro? - estranhei.
Chega-se a velhinha.
- Ô, Mariazinha! Há quanto tempo!
- É verdade, é verdade...
Mamãe se levantou, abraçou a velhinha e a velhinha disse:
- Esse é o seu filho mais velho? Eduardo, né?
E dirigindo-se a mim, ainda abraçada à minha mãe:
- Eu te vi desse tamaninho!!! - e pôs as mãos na altura do joelho.
Sorri.
Mamãe, ainda abraçada a ela, cochichou em minha direção:
- Não é a irmã do doutor Lauro!
Ficaram de frente uma para a outra.
- E como vai sua mãe? Saudade da Mathilde!
- Mamãe está ótima!
Mamãe tinha feições de preocupação. Certa de que não estava diante da irmã do doutor Lauro, parecia não saber o que perguntar. Foi vaga:
- Como vão todos?
- Bem...
Olhos de pânico, mamãe arriscou, genérica:
- E a filharada?
- Como?
- Hã? - mamãe, instintivamente mas sem nenhum efeito prático, deu-me um bico na altura da canela.
- O Leandro vai bem...
- Graças a Deus! - gritou mamãe com as mãos pro alto.
A velhinha sem entender muito bem o que se passava.
Os olhos de minha mãe pareciam uma máquina de caça-níquel. Ela buscava, nos recônditos da memória, o Leandro - e parecia não encontrar.
- E a senhora, está morando aonde?
A velha a desafiou:
- Você sabe quem eu sou, Mariazinha?
- Imagina! A senhora está quase me ofendendo! - e riu dando tapinhas nas costas da velhota.
Ficaram ali, conversando, e eu pedi licença pra ir ao banheiro. De dentro do banheiro, ao celular:
- Vó? Tudo bem? Escuta... quem é uma velhinha, amiga sua possivelmente, que me viu pequeno, que tem um filho chamado Leandro...
A memória de vovó, infalível:
- A Ana, meu filho! Da vila da Professor Gabizo! Vocês estão com ela?!
- Depois falo com você, vó! Um beijo.
Volto a elas.
A velhinha está dizendo:
- Mas, minha filha, não se trata de desconfiar... Mas é que eu estou com impressão de que você não está mesmo me reconhecendo!
Eu:
- Não seja injusta, dona Ana! Mamãe passou grande parte da palestra me contando sobre suas histórias, sobre o Leandro, sobre o tempo bom que foi aquele vivido naquela vila da Professor Gabizo...
Os olhos de dona Ana empoçaram.
- ... disse que seria emoção demais falar pessoalmente com a senhora depois de tantos anos!
Mamãe, teatral:
- Dona Ana!!!!! - e agarrou a velha.
Ficaram ali, abraçadas, e a velhinha disse:
- Ainda na Tijuca, minha filha?
- Ô! O que é que a senhora acha?
- E o filhão? Também?
- Ô! - repetiu mamãe.
Partimos para um lanche, eu e minha mãe, e rimos muito do encontro inusitado, de meu telefone para minha avó de dentro do banheiro, e das histórias - realmente divertidas - da dona Ana na vila da Professor Gabizo.
Até.
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