30.12.10

FINAL DE ANO

Eis que chegamos ao final do ano de 2010. Para mim 2010 terá a marca da saudade deixada por minha avó, que foi oló há poucas semanas, nesse dezembro que termina amanhã. Terá, também, a marca da batalha que travamos em prol da eleição da primeira mulher presidente do Brasil e a marca do último dos oito anos de governo do primeiro operário presidente do Brasil, revolucionário por conta da inversão que siginificou a impressão de suas medidas. Passamos a pensar grande, deixamos de lado a visão elitista e acadêmica que nos regeu durante séculos e a despedida desse homem, no dia primeiro de janeiro, vai ser emocionante demais, fazendo com que 2011 comece sob a égide também da saudade e da esperança.

Mas o que quero lhes trazer hoje, nesse último texto de 2010, depois desse hiato gerado pela correria do final do ano - meu último texto foi publicado no dia 17 de dezembro - é uma homenagem com cara de cartão postal dirigido a todos vocês, meus poucos mas fiéis leitores, que me lêem. 


2010 não foi, como não tem sido a vida, um ano tranqüilo. A situação que enfrento intramuros é capaz de estabelecer um permanente desafio que - é como penso - exige de mim a exata medida entre o medo e a esperança, entre a angústia e o ânimo, entre o ateísmo e a fé, entre o branco e o preto, entre o fogo e a tempestade, entre a baunilha e o sal. Mais que nunca, e tem sido assim a cada dia que passo, valho-me da lição de um de meus mestres e a cada tristeza ergo o meu copo ao humor - essa é a grandeza que o samba me ensinou.

Muita gente foi (e é) fundamental para que esse enfrentamento aconteça de forma a não me desestabilizar. E ainda que eu siga permanentemente em estado de visível desequilíbrio, como a esperança que dança na corda bamba de sombrinha, acordo diariamente disposto a assistir, sorrindo, o show continuar de mãos dadas com a esperança-equilibrista.

Mas a homenagem que presto hoje vai pra Marcela, minha amada Manguaça, que aparece na foto que ilustra este texto acarinhando meu vira-latas. Ninguém mais foi mais a expressão do carinho do que ela. Não me faltou, nunca, seu abraço, seu cafuné, seus dedos me enxugando o choro, seu colo e seu ombro paciente e doce. Filha de uma moça igualmente imprescindível, filha de um moço que talvez já tenha conhecido minha avó de mais perto, irmã de um sujeito que não nega o berço - ele também um poço de afeto -, a Manguaça recebe, daqui, minha mais profunda declaração pública de gratidão por tudo que é, por tudo que representa, por tudo que faz.

Desejo a vocês, que me lêem, um ano-manguaça. Se no ano-novo todos vocês tiverem que seja dez por cento do que essa moça representou pra mim nesse 2010, o ano de 2011 será um ano fabuloso. E não me ocorre palavra melhor e mais adequada do que "fabuloso". Porque é isso que ela é: quase que um troço de fábula, indizível, concretização dos melhores desejos em termos de gente.

A todos, muita saúde. Muita disposição para os enfrentamentos que a vida exige. Muito ânimo, muita paz, muito amor, muito axé.

Até 2011!      

17.12.10

AINDA SOBRE O PAULO, O MAGNÍFICO DO RIO-BRASÍLIA

Conforme lhes contei aqui e aqui, o RIO-BRASÍLIA tem, em seu magnífico staff, um único garçom, o Paulo. Paulo para uns, Paulinho para outros, Chico Xavier - ou simplesmente "médium" - para os mais gozadores, o sujeito é um Nunes, o ex-camisa 9 da Gávea: absolutamente desastrado no trato com a bola mas capaz de fazer um caminhão de gols para delírio da assistência. O que quer dizer que cada ida ao fabuloso bar da Almirante Gavião (não confundir jamais com a lanchonete da mesma calçada) significa testemunhar atuações de antologia. Como a de ontem.

Ontem eu tive a honra e o prazer de conhecer pessoalmente Idelber Avelar. Depois de ler, no twitter, que o professor tinha vontade de vir ao Rio de Janeiro para conhecer outro mestre, Luiz Antonio Simas (o Idelber vive nos Estados Unidos), meti o bedelho e costurei, humildemente, o encontro. Na Tijuca, evidentemente. Eis que então às 16h ancorei no balcão do buteco ao lado de meu compadre Leo Boechat. Estávamos a caminho do bar quando estrilou meu celular. Era Álvaro Costa e Silva, o Marechal, que seguramente soubera do encontro pelo próprio twitter. Tentou disfarçar:

- Ô, meu Edu! Tudo bem? Estou querendo muito beber uma boa batida de gengibre, podes me dar uma dica?

Fui direto:

- Rio-Brasília, imediatamente.

Minutos depois, chega o Marechal (e comprovando minha desconfiança, o bom e velho lobo da imprensa não bebeu uma gota sequer de batidade de gengibre... o caboclo queria mesmo era estar entre nós). Um pouco mais e chega o Idelber, gentilíssimo, trazendo uma mala de presentes para mim e para o Simas, que chegou em seguida. Estrilou de novo meu celular: era Diego Moreira, convocado no ato. Com sua chegada formou-se a mesa de seis.

E lá estava, é evidente, o Paulo - o único garçom da casa. E o bom Paulo deu, de novo, um show (fico feliz com a presença dos demais à mesa que poderão servir como testemunhas do que vou contar).

Bebíamos, industrialmente, Antarctica. A certa altura o Idelber manifesta o desejo de uma cachaça. Eu convoco o Paulo à mesa:

- Velho, quais as cachaças que você tem aí?

Ele sorri.

Os doze olhos à mesa percorrem os rostos da assistência. Clima tenso, com exceção do Diego que não consegue manter a linha diante do garçom - o sujeito explode de rir ao primeiro sinal da presença do Paulo. Eu insisto:

- Quais, Paulo?

Ele pensa um pouco e diz:

- Não sei.

Sou paciente:

- Tem Seleta?

Ele sorri e responde dando pulinhos:

- Genebra? Tem!

- Não, Paulo! Seleta! Se-le-ta! - já gritando.

- Tem, tem, tem!

- Duas doses, por favor! - o Marechal queria também.

Vimos o Paulo tomar a direção do bar. Como um luminoso de neon, a garrafa de Seleta se destacava na prateleira. E vimos o magnífico (que é como papai se refere a qualquer garçom) completamente perdido diante da coleção de garrafas, e nesse momento já éramos seis guinchando de rir à mesa. Luiz Antonio Simas, sóbrio, ainda disse:

- Ele incorporou o personagem. Só pode ser de sacanagem!

Paulo foi à cozinha e chamou a preta. Foi ela que apontou a garrafa. E veio à mesa uma dose.

- São duas, Paulo! - disse o Marechal.

Rindo, como quem dá uma boa notícia, ele respondeu:

- Só tem essa.

Passado mais um tempo Idelber e Marechal manifestaram vontade de outra cachaça.

- Paulo, e aí? Quais cachaças ainda têm?

Ele sorriu de novo:

- Seleta! - e disse isso com ar de gênio.

- Tu não disse que tinha acabado?

- Disse.

- E então?

Ele sorriu.

Fui ao balcão. Voltei.

- Traga duas doses de Boazinha, por favor.

E vieram à mesa dois copos americanos até a boca de cachaça, doses inéditas.

- Mas que doses são essas, Paulo?! Enlouqueceu?! - eu disse.

E ele, novamente com ares de um gênio que tem sacadas incríveis ao longo do dia, disse piscando o olho:

- É uma boa dose. Dose boa. Dose de Boazinha! - e riu de si mesmo como um louco.

Por conta de compromissos, precisei partir às 19h.

Tão logo eu saiba mais sobre a atuação do Paulo até a saída dos cinco, lhes conto tudo por aqui.

Até.

15.12.10

AS ATUAÇÕES DO PAULO

Ontem lhes contei, aqui, sobre os personagens que compõem a assistência do RIO-BRASÍLIA, esse portento tijucano de escol. Fiz brevíssima apresentação do Paulo, o único garçom da casa, uma espécie de Nunes, o ex-camisa 9 da Gávea: atua de forma destrambelhada mas salva o sujeito sempre que a coisa aperta. Sobre o Paulo, também manifestou-se o bravo Álvaro Costa e Silva, nosso bom Marechal, aqui. E é sobre ele que quero lhes contar hoje. Sobre suas atuações, pra ser mais preciso.

E para que vocês que me lêem possam construir seus cenários particulares exibo, abaixo, uma foto do Paulo ao lado de Breno Boechat, no dia em que este último fez sua última incursão ao bar antes de sua viagem para o Canadá, onde fica até meados do primeiro semestre de 2011.

Notem bem: nesse dia, 27 de novembro de 2010, o Paulo usava uma boina de feltro cinza. Foi colocá-la sobre a cabeça e um gozador do pedaço bradou:

- Ô, Chico Xavier, materializa um maracujá aqui na minha mesa.

Deu-se a explosão de gargalhadas, quando o Breno me pediu:

- Tira uma foto minha com o médium!

Pois bem, feita a apresentação plástica e visual da figura, vamos ao que quero lhes contar.


Antes, porém, uma informação: o bom e doce Professor Diego Moreira, um dos expoentes do bairro, é testemunha de meu carinho no trato com o Paulo. Confesso que não tenho nenhuma paciência com o modus operandi do operário do buteco. Como lhes disse ontem, é completamente surdo, trabalha à base de doses indecentes de cachaça, treme as mãos agudamente, derruba tudo o que encontra pela frente mas é aquele negócio... quando chega perto trazendo o pedido é aquela figura digna de piedade e idolatria. Vou mesmo lhe contar sobre suas atuações, e começo com uma digna de registro.

Na sexta-feira passada fui com minha menina assistir ao show do João Bosco. Já quase em casa, na volta, ela disse para minha satisfação:

- Vamos beber um maracujá no Rio-Brasília?

Fomos.

E quando lá chegamos, lá estava o bom Paulo. Poucas vezes vi um magnífico (é como papai chama os graçons) fazer tanto salamaleque. Ele parecia, juro, um mestre-sala diante da cabine dos jurados. Estendeu-me a mão, beijou a mão da moça que me ensinou a sorrir, rodopiou, disse frases que eu não entendi, até que sentamos. E atenção, paulistas, para o que eu vou dizer: assim que risquei o Zippo e acendi meu cigarro, Paulo gingou em direção ao balcão e me estendeu um cinzeiro (e ele nunca havia feito isso, era mesmo para impressioná-la). Trouxe (e também pela primeira vez), guardanapos, palitos, azeite, sal, pimenta do reino, sendo que não pedimos rigorosamente nada pra comer.

- Dois maracujás, por favor!

Novos jogos de corpo, rapapés teatrais, uma afetação indescritível. Ela disse, depois do primeiro gole:

- É sempre assim?

- Não. Nunca.

E eis a frase que só mesmo uma mulher:

- Ah, que fofo.

Os marmanjos que me lêem e que já conhecem a peça devem estar guinchando de rir, mas vamos em frente.

Dia desses eu estava com o Felipinho Cereal no BAR DO MARRECO, que fica a exatos 220m a pé do RIO-BRASÍLIA (como seu preciso do início ao fim, eis o mapa aqui). Bebíamos de pé no balcão quando adentrou o recinto justamente o Paulo. Estava disposto a comprar cigarros para um freguês do RB. Cumprimentou-nos e disse ao Danilo, o barman que trabalha pro Marreco:

- Me vê um crshjwjkhsmill. - inaudível.

O Danilo, que já não é muito bom na comunicação, disse:

- Hã?

- Um maço de crshjwjkhsmill. - inaudível de novo.

Eu e o Felipinho já rolávamos, como bolas de gude, pelo chão. Fui voluntário:

- O que você quer, Paulo?

Ele riu, já manjando o clima.

- Um maço de cigarro... o nome parece com camelo, sei lá...

O Felipinho, sem fôlego, em meio à explosão ruidosa e prolongada do riso, disse:

- Camel, Danilo! Camel!

- Não tem isso não.

Seu Brasil, síndico do pedaço, estendeu o indicador em direção ao box de cigarros e disse:

- E que porra é aquele ali, ô imbecil!

- Ah! Ninguém compra essa porra!

Resolvemos o problema do Paulo.

Pra terminar: também na semana passada sentei-me no RIO-BRASÍLIA com o Vidal, a Lenda, e com Lúcio Lemos, bissexto na área, mais assíduo no circuito Botafogo, onde trabalha. Papo vai, maracujá vem, papo vem, maracujá de novo, o Lúcio sinaliza em direção ao Paulo. É um carinhoso, o Lúcio:

- Ô, Paulinho, quebra uma pra mim? Compra um Carlton ali no Estudantil pra mim?

Eu senti quando o caboclo tremeu na base. O olhar de esguelha em minha direção foi indisfarçável. Lúcio estendeu a nota de cinco reais e vimos partir o Paulo para sua marcha de não mais que 30m, trajeto ida e volta em menos de cinco minutos.

Quarenta minutos depois chega o Paulo. Imediatamente ele põe sobre a mesa um maço de Lucky Strike. O Lúcio:

- Não tinha Carlton?

O Paulo:

- Não sei.

O Lúcio:

- Por que você trouxe Lucky Strike?

O Paulo:

- Não sei.

Este, meus poucos mas fiéis leitores, é o Paulo.

Quando voltei lá, no dia seguinte, disse-me o pobre-coitado:

- De hoje em diante só saio pra comprar cigarro levando a embalagem pra comprar igual...

Até.

14.12.10

O BOM E VELHO RIO-BRASÍLIA

O RIO-BRASÍLIA, já lhes disse isso diversas vezes, é meu buteco de estimação. Além de ficar a exatos 120 metros de minha casa, é perfeito no que diz respeito à estrutura (azulejos antigos, balcão farto, bebida gelada etc) e ao atendimento. O Paulo, o único garçom da casa, é o pior garçom do Brasil (quiçá do mundo) mas é um excelente garçom. É surdo, bebe mais que toda a clientela, treme horrores, quebra diversos copos e garrafas por dia, derrama metade do maracujá no trajeto entre o balcão e a mesa mas é de uma gentileza comovente. Estive lá anteontem, uma vez mais, na companhia de Felipinho Cereal, Luiz Antonio Simas (acompanhado de sua senhora) e Vidal, a Lenda. Minha menina deu-me o visto para descer com uma condição:

- Já não bastam as 14 horas na rua ontem?! Vê lá, hein?! Vá rápido e traga o Vidal pra beber um uisquinho com você aqui...

Uma doçura que me emociona. A frase "traga o Vidal pra beber" deveu-se a uma de minhas frases clássicas que uso em caso de extrema necessidade:

- Eu preciso ir, sabe? O Vidal não tá nada bem... - dita com uma expressão gravíssima, uma máscara de corredor de UTI.

Ela sabe que é mentira em 90% dos casos mas funciona sempre.

Ao chegar no bar - eis o que eu queria lhes contar - a mesma assistência.

Taí uma das características marcantes de qualquer bom e clássico botequim. A assistência. Vejam vocês que os bares incensados pela imprensa têm sempre um público de museu, e explico: são pessoas estranhas ao ambiente e que chegam em levas intermináveis, ora de van (há quem organize expedições aos bares em vans), ora guiados pelo GPS do automóvel.

Já os tradicionais, não.

Não têm público de museu. Têm, mais que freqüentadores, figurantes fixos. Aqueles que, quando não aparecem no pedaço, merecem a frase:

- Fulano faltou hoje.

Pois o RIO-BRASÍLIA é assim. E lembrei-me de lhes contar isso por conta da atuação do Vidal na noite de domingo. Muito provavelmente para ver aflorar minha veia crítica deu de perguntar:

- Quem é esse, Edu? E aquele? E aquele outro? - por aí.

Felipinho Cereal me ajudou nas respostas. Lembrei-me de um detalhe: em um desses botequins clássicos - como o descrito aqui por meu irmão, Fernando Szegeri - poucas vezes se sabe o nome dos figurantes. O que vale é mesmo o apelido.

Lá estava no domingo o Benito di Paula Preto - "com a mesma camisa há três dias", apontou o Cereal. O sujeito é os cornos do cantor friburguense, aquele cabelão, aquela barbicha. Antes de prosseguir quero lhes contar um troço.

Papai é um homem que anda com uma carteira imaginária de frases prontas no bolso. E sempre - eu disse sempre! - que papai passa em frente a um botequim e vê, lá, sentado numa das mesas ou mesmo de pé no balcão, uma pobre alma solitária bebendo sua cerveja, ele solta em tom de lamento:

- Coitado... Todos os dias esse homem está aí. Não tem família! Não tem família!

Pois estava no RIO-BRASÍLIA, também, a Sem Família. Trata-se de uma mulher na casa de seus 45 anos e freqüentadora diária. Parece um daqueles vendedores de bilhete de loteria dos botequins: passa a noite indo de mesa em mesa, filando um cigarro aqui, um gole de cerveja ali, até que é resgatada, todas as noites, pelo filho. Há, é preciso dizer, outras duas com o mesmo comportamento: são a Sem Família I e a Sem Família II. Há também a Cássia Eller da Tijuca, moradora do prédio em cima do bar. Pelo que conta Felipinho Cereal, um observador nato, mora com outra mulher e as duas adotaram uma criança que - vejam vocês! - também tem apelido: Chicão, por conta do nome do filhote da roqueira falecida. Outra figura clássica: o Bigodinho, vizinho do Cereal. Também o Taxista, que todos os dias - todos! - comparece com a mulher e o casal de filhos. Outro que estava lá diariamente - mas sumiu - é o Pica-Pau. Depois que se envolveu num imbróglio que beirou as vias de fato com o Felipinho Cereal e o Espanhol, seu tio, sumiu para sempre. O Felipinho, inclusive, já é chamado pela assistência de Exterminador de Aves, por conta disso. Pois ficamos ali legendando os personagens para delírio do Vidal. Pagamos a conta - e uma vez mais coube a cada um menos de dez reais - e fomos pra casa, eu e meu dentista.

O Vidal, à certa altura, já na terceira dose de uísque - foi-se embora minha garrafa de Blue Label - contou pra minha menina minha atuação quanto à apresentação dos figurantes. E ela, de voleio:

- E tu acha que falam o quê do Edu? Ele também está lá todos os dias, todos os dias!

De olhos baixos - aqueles olhos-faróis, verdíssimos, perdição de suas pacientes - ele disse:

- É... pouco antes do Edu chegar a Cássia Eller da Tijuca comentou sobre a ausência da Baleia de Gravata. Foi quando o Benito di Paula Preto perguntou a ela se a referência era ao Maracujá-Kojak.

Até.     

10.12.10

NOEL ROSA - 100 ANOS

Eis que amanhã Noel Rosa faz 100 anos. Não vou fazer do balcão virtual do BUTECO oratório para chorumelas ou arengas contra a calhordice da prefeitura calhorda do Rio de Janeiro que ignora solenemente a data. É uma vergonha, é verdade, mas não se poderia mesmo esperar nada diferente de uma administração que parece querer marcar sua atuação por conta da chamada operação "choque de ordem".

O povo carioca, entretanto, é mestre na arte da subversão da ordem. E historicamente dispensa o auxílio do poder constituído para fazer suas festas que também historicamente sempre lhe foram sonegadas, boicotadas, proibidas até.

Amanhã, portanto, é dia do carioca sair às ruas (como sempre, aliás...) e brindar à memória de Noel. Beber, cantar, jogar porrinha, fazer samba, fazer troça, incorporar o espírito do homem que em tão pouco tempo de vida nos deixou um legado que está aí, quase um século depois, vivo e impregnado no imaginário popular.

O BUTECO fica, portanto, até segunda-feira, exibindo Noel através do traço inconfundível do mestre Loredano, um homem que, como o Poeta da Vila, ama o Rio de Janeiro inifinitas vezes mais que qualquer administrador oportunista como os que ora ocupam os cargos de comando da cidade.

Como dica para amanhã indico a roda de samba que outro carioca máximo, Rodrigo Ferrari, fará em frente à livraria FOLHA SECA, na rua do Ouvidor 37. Mas o ponto alto, quero crer, será mesmo na Vila Isabel, no Boulevard 28 de Setembro, onde viveu Noel Rosa. É lá que ele "vaga na noite e no dia, vive na Terra e no céu".


Até.

9.12.10

O ESPÓLIO DE MINHA AVÓ - II

Prossigo hoje escarafunchando o baú que ganhei de presente de mamãe por ocasião da morte de minha avó, conforme lhes contei ontem, aqui.

Vovó tinha 8 anos de idade nesta impactante fotografia, tirada no dia 19 de fevereiro de 1933, um domingo, uma semana antes do início do Carnaval. A foto foi tirada no jardim da casa na qual moravam meus bisavós, Eugenio Augusto Monteiro de Barros (é o quarto da esquerda para a direita, na fila mais alta da fotografia, de camisa branca e braços cruzados) e Mathilde Veloso Monteiro de Barros (a terceira da esquerda para a direita, na fila mais baixa, de saia preta e camisa branca), na rua Marquês de São Vicente 186, na Gávea. A casa, é claro - como ocorre em uma cidade que pouco valoriza sua memória - não existe mais, e ficava quase em frente ao terreno no qual se localiza, hoje, a PUC. À certa altura (depois apuro isso com afinco) meu bisavô vendeu a casa para, sabiamente, mudar-se com a família para a Tijuca (e dizia-se Engenho Velho, à época).

Algumas coisas me chamam a atenção na fotografia que pode ser vista, maior, com um simples clique sobre ela. Antes, uma breve pausa.

Meus bisavós tiveram seis filhos, pela ordem de nascimento: Maria Florinda, que morreu muito nova, aos 15 anos, vítima do tétano (dia desses falo sobre ela, que inspirou minha avó, sua irmã, a dar seu nome à minha mãe), Francisco de Paula Monteiro de Barros (tio Chico), Carlinda (tia Linda), Silvio Augusto (tio Silvio), Mathilde (minha avó) e Carlos Henrique (tio Hique).

Havia (ainda há, parece) uma espécie de pacto entre os Monteiro de Barros: o primogênito de todo Eugenio Augusto seria obrigatoriamente um Francisco de Paula, e todo primogênito de um Francisco de Paula seria obrigatoriamente um Eugenio Augusto, e vejam vocês se isso não justifica, de certo modo, o transtorno obsessivo compulsivo (TOC) que me persegue.

Vamos aos personagens da fotografia, sempre da esquerda para a direita: na primeira fila, a mais baixa, dona Lina, mãe de minha bisavó, avó de vovó, bisavó de minha mãe. A seu lado, dona Adelina. A seu lado, minha bisavó, Mathilde (elegante, elegante!, a dona da casa), mãe de vovó e avó de minha mãe. A seu lado, o doutor Oscar, personagem mítica da filha (falarei sobre ele em brevíssimo!). E a seu lado, fechando a fila, Francisco de Paula, o primogênito de meu bisavô, que se casaria, em 1942, com a tia Noêmia (sobre a tia Noêmia, recomendo vivamente um de meus textos preferidos sobre a família, DEBUTE NO ENGENHO NOVO, de primeiro de setembro de 2006, aqui). Notem que tanto o doutor Oscar quanto o tio Chico têm, nas mãos, uma caneca de cerveja preta.

Na segunda fila: não consegui descobrir quem são as duas primeiras. O baixinho que vem depois é o Soony, que está no colo de Alzira, sua mãe, irmã de minha bisavó, a tia Zirota (e sobre minha tia Zirota, a que voava, também recomendo a leitura de MINHA PRIMEIRA VIAGEM, de 24 de janeiro de 2008, aqui). Os demais não consegui identificar.

Logo acima da tia Zirota, erguendo um copo, está Carlinda, minha tia Linda. A seu lado, em pé, dona Mathilde, minha avó, com apenas 8 anos. O menino ao lado de minha avó é Carlos Henrique, meu tio Hique.

Os três primeiros da fila de cima também não consegui saber quem são. Logo depois, meu bisavô. A seu lado, tio Procter, inglês, marido de Alzira (minha tia Zirota), com Marylou no colo, irmã do Soony


Vamos ao que quero lhes contar hoje. Não... não quero lhes contar mais nada hoje. E que fiquem aí, registrados os personagens de muitas das histórias que lhes contarei nos próximos dias. Como quase todo mundo que mantém relação afetiva com seus ancestrais, tenho um corolário de histórias que beiram a ficção envolvendo toda essa gente aí da fotografia.

Desfiando esse novelo aqui, publicamente, aplaco a saudade que sinto de todos eles, dos que conheci e dos que me são vivos por conta da memória de tudo aquilo que ouvi ao longo de 41 anos de vida. Como diz um de meus mestres, Aldir Blanc, é na saudade "que tudo que amei sobrevive".

Até.

8.12.10

O ESPÓLIO DE MINHA AVÓ

(dedicado a meus irmãos, Fernando Braga Goldenberg e Cristiano Braga Goldenberg, e a minha mãe, Mariazinha)

Mamãe viveu ontem, ao lado de minha menina, de certa forma (infinitamente menos dolorosa, é verdade), o drama de "arrumar o quarto de um filho que já morreu". Esteve na casa de vovó, na Tijuca evidentemente, para tratar das coisas práticas que o evento morte exige. Eu, um poltrão (como diria minha bisavó), evitei a tarefa. Mas vamos ao que quero lhes contar, sempre norteado pela lição de grandeza que o samba me ensinou: erguer o copo ao humor (apud Aldir Blanc).

Minha infância é povoada de mulheres. Bisavós, tias, avós, a parentalha toda (e fomos sempre uma família, digamos, regida pelo matriarcado - refiro-me à linhagem de mamãe) virava e mexia soltava uma frase que era, na verdade, o brandir de um brasão imaginário:

- Somos parentes do Barão de Paraopeba!

Isso era usado em qualquer situação. Encerrava-se uma discussão com algum vizinho com essa sentença fatal:

- Somos parentes do Barão de Paraopeba!

Pequena pausa: isso me vinha sempre à cabeça, anos depois, quando eu ouvia o anúncio "ninguém, ninguém, ninguém segura o Khalil!" (entendam isso, aqui).

O Barão de Paraopeba era, para mim, na mais tenra infância, um mito. Vamos em frente.

Antes, porém, nova pausa: peço ao meu dileto e fraterno Diego Moreira, especialista na arte de escarafunchar o passado das famílias, que me auxilie com os graus de parentesco daqui por diante. Vamos lá.

Romualdo José Monteiro de Barros era o nome do Barão de Paraopeba. Teve, o dito cujo, 11 (onze) filhos, sendo que o mais velho era o Desembargador Francisco de Paula Monteiro de Barros. Este, por sua vez, teve 08 (oito) filhos, um deles Eugenio Monteiro de Barros, nascido na fazenda Boa Esperança, de propriedade do Barão, em Congonhas do Campo, MG, em 20 de agosto de 1835. Vida que segue, Eugenio Monteiro de Barros casou-se, já no Rio de Janeiro, com Francisca Carolina Werna da Fonseca Monteiro de Barros, nascida em 25 de maio de 1845, tendo morrido a dona Chica em 28 de fevereiro de 1918. Eis que dona Chica era outra personagem de minha infância. E isso porque as minhas velhotas particulares tinham uma outra frase impactante:

- Cadê o postal que a Isabel mandou pra Chica?

Era essa frase ser lançada no ar e havia sempre um atropelo em direção a uma das cômodas de um dos cômodos da casa de minha biasavó.

Vamos em frente. Eugenio Monteiro de Barros e Francisca Monteiro de Barros tiveram 08 (oito) filhos. Um deles? Francisco de Paula Monteiro de Barros, nascido em 12 de fevereiro de 1871. Foi este Francisco (que já tem nome idêntico ao Desembargador lá do começo da história) que casou-se, em 17 de setembro de 1892, com Leonor Isabel de Sá Caminha. Dentre os filhos que tiveram, nasceu meu bisavô, Eugenio Augusto Monteiro de Barros (tenho histórias dele pra contar, a quem não conheci, mas fica pra outro dia, vamos em frente), no dia 22 de novembro de 1893. Meu bisavô exerceu durante muitos anos o alto cargo de contador da Companhia de Navegação Costeira, foi presidente da União dos Empregados do Comércio do Rio de Janeiro, deputado federal classista tendo assinado a Constituição de 1934 e casou-se em 17 de maio de 1913 (mesmíssimo dia em que nasceu, anos depois, minha mãe), com a dona Mathilde Veloso, minha amada bisavó, que passou a assinar Mathilde Veloso Monteiro de Barros, ela filha de Francisco Veloso, português, e de Julia Pinheiro Veloso, egressa de São João da Barra.

Agora é que eu preciso do Diego! Eu sou o quê da dona Francisca, meu Deus?! Isso deixa para lá, vamos em frente.

As velhotas se engalfinhavam, de vez em quando, em busca de ver, de tocar, de ler o tal "postal que a Isabel mandou pra Chica".

É que a dona Francisca, a Chica, era amicíssima da dona Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bragança e Bourbon. Filhota de Dom Pedro II, Isabel casou-se com o Conde d´Eu dando origem aos atuais herdeiros da coroa imperial, os Orléans e Bragança. Eis o fato: dona Chica era muito amiga da Princesa Isabel.

Isabel deixou o Brasil com 43 anos de idade (e se eu estiver errado me corrijam) em 17 de novembro de 1889, pouco depois da proclamação da República. Consta que teria partido "aos soluços, sob as ordens e intimações do tenente-coronel João Nepomuceno Mallet".

Consta das lendas familiares que Chica traficava feijão preto pra França, a fim de matar as saudades que Isabel sentia do Brasil, do Rio de Janeiro. Consta, ainda, que eram muitas as correspondências mantidas guardadas sabe-se lá por quem.

E eis o que eu queria lhes contar.

Vovó mantinha em casa um dos postais - o tal, o tal! - e mamãe, ontem à noite e a pedido meu, fez de mim o fiel depositário do que é, pra nós, um documento.

O postal, datado de 08 de outubro de 1915, foi enviado de Paris e traz, na frente, uma fotografia de Isabel, onde se lê:

"Saudosos agradecimentos, Isabel Condessa d´Eu"


No verso, lê-se:

"Minha querida Chica: quanto lhe agradeço suas boas acções por ocasião do dia 29 de julho! (...) na saudosa Cathedral! Quantas recordações!

Não me lembro se você já tem esta photographia. Em todo caso lhe mando e com ella nossas lembranças muito affectuosas.

Isabel Condessa d´Eu.

O Silva Costa lhe fará entregar os 500$ que lhe serão úteis queridíssima!"


É, de fato, emocionante, estar com o cartão em mãos, 95 anos depois dele ter sido expedido de Paris, manuscrito pela Princesa Isabel, de ter chegado às mãos da dona Francisca (segundo minhas parcas contas, minha tataravó), de ter ficado tantos anos com minha bisavó, Mathilde, e outros tantos com minha avó, também Mathilde.

É desse patrimônio, imaterial e afetuoso, que é feito o espólio de minha avó.

E tem sido tão fascinante o revirar do baú que me foi entregue que tenho ouvido, em estado febril, o alarido das velhotas em êxtase diante das lembranças que guardo dentro de mim, agora amparadas pelos documentos, pelas fotografias, pelos bilhetes e pelas cartas que mamãe me entregou.

Com o passar dos dias, se os deuses assim permitirem, divido muitas coisas com vocês, contando as histórias que cresci ouvindo e que ainda hoje me assombram de deslumbramento de tanto amor que minha família semeou.

Até.

7.12.10

VOVÓ (1924-2010)

Eis que vovó, minha avó materna, dona Mathilde, personagem de tantas histórias contadas aqui neste blog, personagem de tantas histórias que vi e vivi ao longo de meus 41 anos de vida, foi oló na noite de domingo. Estava eu em São Paulo quando o telefone tocou às 23h15min com a notícia. Vovó estava internada há pouco mais de duas semanas e confesso a vocês, publicamente, que não consegui receber a tristeza como companheira diante da notícia: vovó viveu intensamente seus 86 anos de vida, dos quais 41 comigo como testemunha, seu primeiro neto, sempre norteada pelo intenso amor herdado do exemplo de vida de sua mãe, minha bisavó, Mathilde também, o mesmíssimo amor que igualmente norteia a vida de mamãe, sua filha única. Na foto abaixo, que já ilustrou tantos textos aqui publicados, sou o menino de calças curtas e camisa listrada com a mão direta na mão de mamãe, com a mão esquerda nas mãos de vovó, ao lado também de minha bisa, que foi pro Orum em 1982, e tinha eu só 13 anos de idade (o que é, convenhamos, um privilégio... conviver 13 anos com a bisavó é um presente!).


Quem a conheceu - e refiro-me aqui a meus amigos mais próximos - por ela se encantou. Doce, pose e porte de rainha, cheirosa que só ela, vaidosa que só ela, vovó era um encanto de pessoa (escrevo "era um encanto de pessoa" e já me corrijo, vovó é um encanto de pessoa). A foto abaixo, de setembro de 2008, mostra vovó ao lado da minha menina e de sua menina, minha mãe. Vovó estava - como se vê, e como esteve até o último dia - elegante para receber, no Rio, na casa de meus pais, o portentoso Fernando Szegeri, meu irmão e também seu neto. Vou lhes contar, ao longo dos próximos dias, histórias bacanas da dona Mathilde, cujo velório, ontem, recebeu um público de Fla x Flu.

E é justo sobre o velório - rodrigueano - que quero lhes contar hoje, seguindo o princípio de que é preciso erguer o copo ao humor, sempre!


Chegamos de SP, eu e minha menina, por volta do meio-dia. Lá estavam suas amigas do pôquer - vovó jogava pôquer no Méier todas as sextas-feiras em uma mesa na qual era a caçula! -, dos centros espíritas que freqüentava, da "costura" - vovó costurava fraldas, lençóis, cobertores e mantinhas para os pobres - primas e primos, sobrinhas e sobrinhos, vizinhos e vizinhas, enfim... como lhes falei, um público de Fla x Flu.

E foi, meus poucos mas fiéis leitores, um velório tijucano e rodrigueano.

Logo na entrada da capelinha, uma coroa de flores gigantesca enviada por Gilberto Braga, sua irmã Rosa Maria e seu irmão Ronaldo. Vovó era amicíssima da Ieda, mãe dos três. Sua melhor amiga, contam. Os três a chamavam "tia Tida" e por ela tinham um carinho sem tamanho. Pois vamos à cena no melhor estilo Tijuca. As velhotas que se acotovelavam em volta do caixão vez por outra apontavam na direção da tal coroa de flores. Havia um alarido (apud Nelson Rodrigues) de vozes acompanhando aquele apontar de dedos. Até que deu-se a cena de cinema.

Uma das velhas tomou a direção da coroa de flores arrastando outra velhota pela mão. Estacou diante da coroa equilibrada no cavalete, pouco depois de estender uma câmera fotográfica para sua amiga. Postou-se ao lado da bóia de flores, esticou a faixa com os dizeres "saudades eternas", apontou pro nome do autor de novelas e disse pra outra:

- Tira! Tira! Vai!

Foi então que formou-se uma pequena fila para a mesmíssima fotografia.

Mas não ficou aí, apenas, o tijucanismo do momento.

À certa altura adentra a capelinha Dayse Lúcidi, prima da vovó. A radialista e atriz, hoje fazendo o papel de uma avó e cafetina na novela das oito, causou um furor de velhas no salão. Cochichos, fotografias, explosão de flashes, autógrafos.

E lá estava vovó vivendo o drama tantas vezes retratado por Nelson Rodrigues.

"A dor tem, ao fundo, um alarido de xícaras e de pires", disse o mestre.

Ontem, diante da ausência do bar da capela e da presença da modernidade, o alarido foi de flashes e do automático das câmeras portáteis.

Até.

3.12.10

MAIS SOBRE LUCIANA FRÓES

Anteontem publiquei O ANTI-BRASIL, NO JORNAL O GLOBO. No texto, expus um filminho feito e exibido pela "gastromaníaca" Luciana Fróes - o adjetivo dado por ela mesmo - gravado no restaurante LAGUIOLE, aqui no Rio. A crítica gastronômica exibe, ali, orgulhosa e deslumbrada, uma "chámmelier" - vejam aqui. Vai ao delírio com ampulhetas, pinças, tesouras, acha aquilo tudo o máximo e ajuda, assim, o jornalão em sua missão perniciosa em busca da destruição das coisas mais simples. Volto hoje à dita senhora.

A horripilante revista RIOSHOW, que vem encartada às sextas-feiras no jornal, traz matéria de sua autoria intitulada É COISA NOSSA. Vocês leiam a matéria abaixo e me digam se esses troços exaltados pela anti-carioca são coisas nossas. Vamos à análise da coisa, eis que sou preciso do início ao fim - coisa que incomoda sobremaneira a meus detratores.

Primeiro equívoco? No primeiro parágrafo, na primeira frase:

"Embalada pelo clima de amor à cidade que toma conta dos cariocas (...)."

Só mesmo uma anti-carioca que não conhece a cidade em que vive pode dizer uma atrocidade dessas. Perguntem a Luiz Antonio Simas, carioca máximo, se ele está embalado pelo amor à cidade (e a lastimável colunista só pode estar fazendo referência à invasão, pela polícia, do Complexo do Alemão) ou se ele a ama desde antes de nascer. Façam a mesma pergunta a Felipe Quintans, a Leonardo Boechat, a Marcos Handofsky, a Fernando Szegeri, a Bruno Ribeiro, a Arthur Tirone, estes três últimos moradores do Estado de São Paulo e mais cariocas que 99,99% dos leitores da revista que não se presta nem para servir de privada pro meu vira-latas. Mas vamos em frente. Pode ser - vocês devem estar pensando - implicância minha.

O que vocês acham da exaltação aos "biscoitos de polvilho à la Globo, que magistralmente o chef carrioca Claude Troisgros costumizou (com curry) e transformou numa das atrações do couvert de seu Olympe"? Deixando de lado o erro grotesco da jornalista - o certo é customizar e não "costumizar" - qual é o carioca que deixa de comer o biscoito original, fabricado na Rua do Resende, e vendido a R$ 0,50 (cinqüenta centavos) em qualquer loja honesta da cidade (não nas praias, onde custa R$ 3,00) para comer esse biscoito com curry criado pelo "chef carrioca" e que deve custar os olhos da cara? Tem mais.

Que tal a dica do picadinho a R$ 70,00 (setenta reais) (!!!!!)????? Picadinho eu como em qualquer buteco honesto por não mais do que R$ 10,00 (dez reais) - e estou jogando o preço bem pra cima. E sem essa porra de "terroir"!!!!! - vão tomando nota das expressões internacionais usadas pela referida senhora.

E a indicação da capirinha de lima-da-pérsia, "invenção de Chico Mascarenhas, restaurateur (...)"? O GUIMAS ainda foi elevado à categoria de "bistrô franco-carioca". Ela pergunta:

"Conhece igual?"

Conheço, Luciana Fróes. Conheço muitos. E muito melhores! E pela metade do preço, diga-se.

Ocorre que o mais nojento, o mais revoltante, o mais abjeto da abjeta matéria, está por vir.

Demonstrando com isso o quanto O GLOBO não enxerga a cidade do Rio de Janeiro senão como uma ilhota chamada zona sul, o quanto o jornalão odeia (e não conhece) a cidade e seus habitantes de outras regiões que não as consideradas nobres pela autora da matéria, ela diz que "vale a viagem até Vicente de Carvalho" para comer o bolinho de bacalhau da ADEGA D´OURO que ela só deve conhecer por conta de expedições de vans organizadas por... ... ... isso-deixa-para-lá.

Isso mesmo. Ela recomenda uma VIAGEM até Vicente de Carvalho. Distante pouco mais de 15km de onde moro.

Um nojo. Um nojo absoluto!

A matéria está aí, na íntegra.    



Até.

2.12.10

E SEGUEM DESTRUINDO O FUTEBOL...

Estava eu hoje, ao volante, em direção ao trabalho. Passava um pouco das 09h quando - rádio ligado na CBN - um sujeito cujo nome não pesquei (se alguém souber, por favor, ajude nos comentários), passou a tecer comentários - em um tom "hor-ro-ri-za-do" que já me deixou cabreiro - sobre a venda de ingressos para o jogo de domingo, do Fluminense. À certa altura, disse em tom de faniquito:

"O torcedor precisa ser tratado como um cliente pelos clubes!"

Eu quase bati com o carro de tão furioso.

Para delírio da Lucia Hippolito, que comandava o horário, o basbaque começou a ter um chilique em pleno ar:

"Cadê o Estatuto do Torcedor, Lucia?"

Uma outra locutora (ou repórter, sei lá), à moda das estagiárias das redações dos jornais de Nelson Rodrigues, emendou, animadíssima:

"Com tanta facilidade hoje, né, Lucia?, podendo haver venda de ingressos pela internet, como pode ainda acontecer tanto tumulto...?"

E eles todos gemiam "ohs" e "ahs", deslumbrados em cadeia com as próprias sentenças.

Vamos ao que tenho a lhes dizer.

Em meados do ano passado lancei, digamos, uma série chamada MULHERES NO ESTÁDIO DE FUTEBOL. Recebi maciço apoio de quem leu e entendeu e fui criticado por quem leu e não entendeu (aqui, aqui, aqui e aqui), e volto a explicar.

Não tenho nada contra mulher em estádio de futebol. Tenho tudo contra gente fresca em estádio de futebol, e vali-me de "mulheres" para dar corpo ao que quis, naquele momento, dizer a vocês. Não tenho nada contra - serei, talvez pela primeira vez, politicamente correto para ser bem compreendido - um homossexual no estádio de futebol. Tenho tudo contra bichas escandalosas em estádio de futebol. Ficou claro que estou a tratar de um estado de espírito? Vou em frente, então.

Fui levado ao Maracanã pela primeira vez - e quantas vezes já lhes disso isso aqui... - pelas mãos de meu pai, no colo pra ser mais preciso. Tinha eu poucos meses de vida quando o velho Isaac,cheio de justificável orgulho, foi levar seu primogênito para respirar, pela vez primeira, o ar quente que subia das arquibancadas de concreto numa manhã ensolarada. De lá pra cá, de 1969 pra cá, perdi a conta de quantos jogos assisti. Mais que jogos, de quantos dramas assisti (aqui, conto um pouco disso), de quantas derrotas eu sofri, de quantas vitórias eu comomerei, de quantos empates me frustraram. Perdi a conta de quantas filas enfrentei. De quantas porradas, todas involuntárias, levei, de quantas porradas dei em busca de um lugar pra sentar, de um ingresso pra comprar, não tendo sido raro entrar no maior do mundo sem ingresso, pulando muro, furando esquema de segurança - tudo em nome da paixão pelo Flamengo e pelo futebol.

Vem daí - desse currículo, dessa história, desse hábito - minha revolta contra esse processo babaca de higienização do futebol brasileiro.


Quem é a moça, e que autoridade tem para fazê-lo, que como uma espécie de Luciana Fróes do futebol (entenda isso, aqui) clama, pelo rádio, pela venda de ingressos pela internet? Quem é o sujeito que, cheio de tom-de-autoridade, determina que torcedor de futebol tem de ser tratado como cliente pelo clube que ama? Será que não já está de bom tamanho a quantidade de transformações feitas nos campos brasileiros (e nos clubes, e nos regulamentos etc), capazes de tão aguda deformação do futebol em estado bruto que nos deu (e ainda nos dá) tanta identidade?

Por que é que eu tenho que achar normal o vice-governador do estado do Rio de Janeiro dizer que as cadeiras do Maracanã reformado (adeus, arquibancadas...) serão azuis para que seja seguido o modelo europeu? Por que é que eu tenho que achar normal a nova norma que identifica um estádio como arena? Por que é que tudo - botequins, por exemplo... - tem de ser adequado ao gosto escroto e plástico da elite-de-merda que insiste em invadir um espaço que é do jeito que é há milênios?

Eu quero enfrentar fila debaixo de sol quente pra comprar ingresso porque isso faz parte do ritual de imolação sagrado que o torcedor apaixonado cumpre com uma alegria que essa escória jamais vai compreender. Eu quero empurrar e ser empurrado pra entrar no estádio através de roletas de ferro, como as dos trens, porque ali prossegue o rito de exorcismo dos anjos e demônios que moram na alma do torcedor fanático. Eu quero encher a cara de cerveja nos bares dos anéis das arquibancadas a fim de aplacar a sede no mais amplo sentido da palavra sede. Eu quero sentar na arquibancada depois de ganhar um lugar no grito, na arquibancada de concreto, quente, ou mesmo ficar de pé ao lado dos irmãos-de-crença que vão gritar, vão xingar, vão chorar e vão vibrar durante os noventa minutos de bola rolando. Eu quero gritar "piranha" quando uma gostosa desembarcar na arquibancada. Eu quero mandar o juiz tomar no cu, chamá-lo de filhodaputa, roubando ou não roubando, que isso é um direito sagrado de todo torcedor, legitimado por anos e anos de batalhas heróicas que antecedem a assepsia do Estatuto do Torcedor a que o basbaque se referiu hoje cedo, pelo rádio. Eu quero meu rádio de pilha no ouvido. Eu quero, porra. E se eu quero, eu posso.

Ceder passivamente a modismos, modernidades e outros bichos nunca foi - e jamais será - do meu feitio. É pau na canalha, sempre. 

Até.

1.12.10

O ANTI-BRASIL, NO JORNAL O GLOBO

Eis-me de volta a uma de minhas atividades extraprofissionais preferidas, a defesa do Brasil, da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, dos hábitos simples dessa gente simples que vive numa cidade que nada tem a ver com a cidade retratada pelo jornal O GLOBO, a luta contra o que chamo de afrescalhamento agudo capaz de destruir a imagem da cidade e do país. Antes de mais nada, e para que eu possa desfiar meu novelo que dará coerência a tudo o que digo, desde 2004 neste humílimo blog, assistamos todos - com um saco de vômito nas mãos - ao vídeo abaixo, feito e publicado por uma senhora que atende pelo nome de Luciana Fróes, "uma gastromaníaca" - a definição é dela e a gargalhada que vocês ouvem é minha. A dita senhora ainda escreve, às sextas-feiras, na revista RIOSHOW que vem encartada no jornalão, críticas a restaurantes espalhados pela cidade. Não vou me ater a isso - às tais críticas - hoje, mas gostaria de lhes dizer uma meia-dúzia de palavras sobre o papel que esta senhora cumpre na imprensa meia-boca do jornalão.

Atenção ao vídeo.


Que tal, meus poucos mas fiéis leitores? Que tal o deslumbre de Luciana Fróes ao nos apresentar a "chámmelier" do restaurante LAGUIOLE? Palavrinha inventada pela criativa gastromaníaca - seguramente por conta de "sommelier", dos vinhos - "chammelier", pelo que pude apurar, é o sujeito que trata dos camelos durante a travessia do deserto, quando feita no lombo de um deles. Mas isso também não interessa, posto que o que dá prazer a essa gente da imprensa da Irineu Marinho é inventar moda, incutir hábitos supostamente refinados nos leitores, destruir, pisotear como uma espanhola louca sapateando os tacos dos palcos, cuspir na cidade e nos seus hábitos, na sua rotina, na sua gente. O tal filminho, não satisfeito em trazer pra cena mais uma "especialidade" - a dos tais "chámmeliers" - ensina que chá precisa de tempo certo para a infusão... e para isso - oh! - nada melhor do que uma ampulheta ("essa ampulhetazinha é o máximo", diz Luciana Fróes) "especializada" em chás, específica para o preparo dos chás, e daí vemos o proprietário do restaurante ("a ampulheta é o máximo, né?") deslumbrando a jornalista (pausa para uma golfada) com sua coleção de ampulhetas adquiridas ao redor do mundo.

Pro cacete, pô!

Chá pra mim - como ensina o samba cantado pelo saudoso João Nogueira - é pra curar os males que nos afetam. E chá eu aprendi a fazer foi com minha bisavó, com algumas rezadeiras que conheci, e o troço é infinitamente simples, a dispensar com veemência babaquices como essas - ampulheta, tesoura, pinça pra pegar as folhas do chá, xícara assim ou assado, pauzinho pra mexer e o escambau.

Falei "chá" e me lembrei de um troço: Ed Motta, outro que não cansa de esculhambar o Brasil e o Rio de Janeiro, disse o seguinte dia desses (leiam aqui):

"Para ficar perfeito, o chá tem de ser preparado com água mineral. Preferencialmente com spring water, ou água de montanha. A nossa água de Petrópolis também é boa."

E quando lhe dizem que a sua nova mania sai caro, ele concorda. E esnoba - segundo a matéria que publicou a tal entrevista:

"Não é para o povão, mas eu não consumo nada do povão. Felizmente! A não ser que seja o povão da Itália, o povão da França."

Ora, creio que assim fica mais fácil - mastigadíssimo - a vizualização da nojeira que é a atuação de grande parte da imprensa brasileira - e refiro-me aqui, sempre, por questões de ordem geográfica, à imprensa carioca. É uma atuação pensada, perniciosa, que luta como pode para destruir nossas mais caras tradições. Não demora muito e veremos pululando por aí um bando de néscios comprando ampulhetinha pra preparar chá diante de deus-e-o-mundo.
 
E por falar em "nossas mais caras tradições" - eu que defendo botequim como quem defende a própria casa - recomendo vivamente o texto publicado ontem por meu mano, Fernando Szegeri. BUTIQUIM QUE SE PREZA é um tratado e pode ser lido aqui.

Depois de lê-lo, os que tiverem olhos de ver bem saberão o quanto minha luta é justa. E o quanto o saldo dessa luta - com um acúmulo de detratores que só me orgulha - é extremamente positivo.

Até.      

30.11.10

SALVE O RIO DE JANEIRO!

Está no ar a entrevista que concedemos, eu e meu mano Luiz Antonio Simas, para o site oficial do Ministério do Turismo sobre a Copa do Mundo de 2014, no Brasil. O link para o vídeo (que tem também Arlindo Cruz e Joel Santana em sua melhor forma!) está aqui, com direito a um textaço do bardo tijucano, aqui.



Até.

29.11.10

EDUARDO PAES, UM JERICO

Li hoje, estarrecido, que "o prefeito Eduardo Paes anunciou que vai assinar um decreto municipal tornando o dia 28 de novembro como o de refundação da cidade do Rio de Janeiro. Segundo ele, a data é histórica para a capital fluminense, pois marca a tomada do Complexo do Alemão pelas forças do estado, bem como inaugura um novo momento para os cariocas.".

Só uma besta obtusa seria capaz de pensar num troço desses. Mais que uma boçalidade, é uma prova evidente de desequilíbrio mental e de alta concentração de vaidade. Estácio de Sá, cujos restos mortais encontram-se sob uma lápide na Igreja dos Capuchinhos, na rua Haddock Lobo, na Tijuca, onde moro, revira-se de ódio diante do troço e por isso, presumo, tremeu a terra enquanto eu bebia com meu amigo Felipe Quintans, ontem à tardinha, no RIO-BRASÍLIA.

É só mais um capítulo - de tristíssima inspiração - do espetáculo que a mídia está fazendo por conta da invasão do Complexo do Alemão pelas forças de segurança. Vamos a alguns detalhes, à moda DO DOSADOR:

* no sábado pela manhã, depois da invasão da Vila Cruzeiro, assisti à transmissão da invasão do Complexo do Alemão pela TV GLOBO. Transmissão mesmo, como se estivéssemos assistindo ao desfile das escolas de samba no Sambódromo. A mesma dupla de apresentadores deu no saco dos telespectadores: "Nesse momento o helicóptero da Polícia Civil sobrevoa a região", ou "Nesse momento os homens do BOPE se preparam para invadir o morro", ou "Nesse momento os tanques da Marinha estão sendo abastecidos", e foi impossível não lembrar do clima das entrevistas das concentrações, antes dos desfiles. Um nojo. Um nojo absoluto! Comentários, os mais babacas. Havia, inclusive, uma câmera com alguma espécie de efeito especial (não manjo nada disso, por isso me falta a palavra exata pra descrever o troço) dando um clima "guerra-do-iraque" à transmissão;

* não satisfeitos em "narrar" a operação policial, repórteres portando coletes à prova de balas estilizados (com o símbolo da emissora) tentavam entrevistar os comandantes da operação atrás de furos jornalísticos, perguntando sobre as estratégias etc. Gostei quando um dos repórteres tomou um safanão de um caboclo fardado, vingando a assistência que a tudo assistia irritadíssima com a papagaiada global;

* achei inacreditável a entrevista concedida ao vivo pelo Chefe da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, pelo telefone. Depois de um bom número de minutos de entrevista, disse o repórter com aquela arrogância que só os repórteres globais têm: "Vá trabalhar, Delegado, obrigado por sua entrevista.";

* o jornal O GLOBO hoje publicou uma matéria patética sobre os cariocas que, depois de dois dias de terror - nas palavras do jornalão - retomaram suas rotinas. É inacreditável! Entrevistaram moradores da zona sul da cidade que, oh!, passaram dois dias encastelados em seus apartamentos para só então, no domingo, descerem para as ruas. Pro cacete, pô! Depois de tomar meu café da manhã no BAR DO MARRECO, às 6h, no sábado, na Tijuca, rumei pro CADEG, em Benfica, onde fiz compras. Às 8h30min já estava no ALMARA na companhia de queridos amigos que formaram uma roda de altíssima qualidade, de novo na Tijuca. Rasguei o bairro e subi o Alto da Boa Vista às 13h para almoçar no BAR DA PRACINHA com meus pais. Desci de volta pra Tijuca e encontrei os mesmos e outros amigos no GALETO REX, portento na rua do Matoso. Andei mais uns poucos quilômetros e encontrei com outros tantos no BOTECO DO AMÉRICA, na praça Afonso Pena. Depois ainda dei uma passada no RIO-BRASÍLIA para encontrar outros camaradas, e às 20h estava eu nas pedras do Arpoador fazendo pequenique, fechando o sábado, já quase domingo, num pé-sujo na esquina da Santa Clara com a Domingos Ferreira em Copacabana. O medo, o pânico, só existem na cabeça de quem se rende. É evidente que isso não inclui, nestes dias específicos, os moradores das áreas nas quais a cuíca roncava entre traficantes e policiais. Agora... ler que morador do Leblon, de Ipanema e adjacências se encagaçou e só relaxou ontem à tarde é demais pra minha (cada vez mais curta) paciência.

Até.   

26.11.10

MARACANÃ, MEU RIO, CORRE E ME SOCORRE

Em tempos de Rio de Janeiro massacrado por uma imprensa sensacionalista, minha humílima homenagem à minha aldeia - permanentemente em paz.



Até.

24.11.10

A SITUAÇÃO NO RIO DE JANEIRO

Publiquei ontem o texto O GLOBO CONTRA O RIO (aqui), até o momento com 11 comentários, um deles de um rapaz que dá seu testemunho sobre as UPPs, ele que tem família morando na favela Cidade de Deus, na zona oeste do Rio de Janeiro. É comovente e só uma besta-fera, incapaz de olhar para além de seu próprio umbigo, não reconhece que o Governo do Estado está, ao menos na questão da segurança pública, agindo com uma seriedade que não tínhamos há muitos anos.

Não sou, antes que me acusem de ser chapa-branca, exatamente um entusiasta do governo Sérgio Cabral, eis que carecemos da mão forte do Estado em inúmeras áreas, como na educação, na saúde, nos transportes públicos (estes em estado caótico). Mas os números que me foram fornecidos pelo Governo do Estado egressos da área da Segurança Pública são bastante evidentes no apontar para um acerto de mão quanto a tão tormentoso tema.

Vamos lá: há dois anos, o Governo do Estado do Rio de Janeiro iniciou o processo de implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) - um novo modelo de Segurança Pública e de policiamento que promove a aproximação entre a população e a polícia, aliada ao fortalecimento de políticas sociais nas comunidades. As UPPs representam uma importante arma do Governo do Estado do Rio para recuperar territórios perdidos para o crime organizado e levar a inclusão social à parcela mais carente da população. Hoje, já são 12 UPPs, que beneficiam cerca de 200 mil pessoas em 36 comunidades das zonas Norte, Sul e Oeste da cidade e no seu entorno. Até o final de 2014, o Governo do Estado vai pacificar todas as comunidades onde houver o controle de bandidos armados.

Criadas em dezembro de 2008 pela Secretaria de Segurança Pública (e o Beltrame, Secretário de Segurança do Estado, me parece um homem muitíssimo bem intencionado), as UPPs trabalham com os princípios da Polícia Comunitária - um conceito e uma estratégia fundamentada na parceria entre a população e as instituições da área de segurança pública. O governo do Rio está investindo R$ 15 milhões na qualificação da Academia de Polícia para que, até 2016, sejam formados cerca de 60 mil policiais no Estado. Até o fim de 2010, 3,5 mil novos policiais serão destinados às Unidades Pacificadoras.

Ao recuperar territórios ocupados há décadas por traficantes e, recentemente, por milicianos, as UPPs levam a paz às comunidades do Morro Santa Marta (Botafogo – Zona Sul); Cidade de Deus (Jacarepaguá – Zona Oeste), Jardim Batam (Realengo – Zona Oeste); Babilônia e Chapéu Mangueira (Leme – Zona Sul); Pavão-Pavãozinho e Cantagalo (Copacabana e Ipanema – Zona Sul); Tabajaras e Cabritos (Copacabana – Zona Sul); Providência, Pedra Lisa e Moreira Pinto (Centro); Borel, Indiana, Catrambi, Formiga, Morro da Cruz, Bananal, Casa Branca e Chácara do Céu (Tijuca – Zona Norte); Andaraí, Nova Divinéia, João Paulo II, Juscelino Kubitschek, Jamelão, Morro Santo Agostinho, Borda do Mato, Rodo e Arrelia (Andaraí – Zona Norte); Salgueiro (Tijuca); Turano, Chacrinha, Matinha, 117, Liberdade, Pedacinho do Céu, Paula Ramos, Rodo e Sumaré (Tijuca).

Agora vamos aos números, para que depois eu sente a borduna em quem merece.

Ações integradas de segurança - como a criação das Regiões Integradas de Segurança Pública (RISPs), das UPPs e do Sistema de Gerenciamento de Metas para Indicadores Estratégicos de Criminalidade - foram fundamentais para a queda dos principais índices de criminalidade do estado do Rio de Janeiro. Em agosto de 2010, o Instituto de Segurança Pública (ISP) registrou o menor número de homicídios desde 1991: 344 casos no estado.

O objetivo do Governo é impor ao Rio taxas civilizadas de criminalidade, que no estado sempre estiveram em patamares elevados. E isso tem sido possível graças à metodologia de combate ao crime, que alia gestão e acompanhamento.

Ações como a criação das RISPs, a consolidação das Áreas Integradas de Segurança Pública (Aisp) e outras medidas, com foco em indicadores estratégicos, como os de homicídios, roubos de rua, roubos de veículos e latrocínios, foram fundamentais para a melhoria dos números.

No primeiro semestre de 2010, em comparação com o mesmo período de 2009, o número de homicídios caiu 20,2% (menos 107 casos); o de latrocínio (roubo seguido de morte) teve uma redução de 33% (menos 38 casos) e o de mortes por auto de resistência (em confronto com a polícia) registrou uma queda de 10% (menos 56 casos).

Os casos de balas perdidas também registraram redução: menos 18,4% (menos 19 atingidos) que no semestre do ano passado. Assim como foi registrada redução de 68,8% (menos 11 casos) no número de policiais militares mortos em serviço, e de 57% (menos 4 casos) no número de policiais civis mortos também em serviço.

Já os índices de roubo de veículos caíram 23,1% (menos 3.266 casos); roubo a transeunte, 13,5% (menos 5.160 casos); e roubo em coletivo, 17,8% (menos 873 casos). Ao mesmo tempo em que houve aumento no número de prisões: 10,7% a mais (mais 948 prisões).

Os dados abaixo são do Instituto de Segurança Pública (ISP), e vocês não os verão nos jornalões:

• Homicídio Doloso: redução de 20,4% (menos 88 vítimas) - 344 casos em 2010, 432 casos em 2009.

• Mortes por Auto de Resistência: redução de 60% (menos 45 casos) - 30 casos em 2010, 75 casos em 2009.

• Roubo de Veículo: redução de 19,1% (menos 369 casos) - 1.559 casos em 2010, 1.928 casos em 2009.

• Roubo a Transeunte: redução de 7,0% (menos 390 casos) - 5.167 casos em 2010, 5.557 casos em 2009

• Roubo em Coletivo: redução de 6,7% (menos 50 casos) - 695 casos em 2010, 745 casos em 2009.

• Latrocínio (Roubo seguido de morte): sem alteração - 12 casos em 2010, 12 casos em 2009

Agora vamos ao que quero lhes dizer.

O GLOBO continua sua campanha sórdida denegrindo a imagem do Rio de Janeiro. A ele, o mais nojento jornal carioca, não interessam os números que apontam para um acerto do trajeto traçado pelo Governo do Estado no setor da Segurança Pública. A ele interessa fazer ecoar a voz abjeta da abjeta classe média e da elite preconceituosa que NUNCA (com a ênfase szegeriana) se preocuparam com os altíssimos índices de violência que tornavam um inferno a vida dos mais pobres, dos favelados, dos que vivem à margem da zona sul, o único Rio de Janeiro que interessa ao jornal O GLOBO.

"Cuidado com o que este jornal publica!", já nos alertava Leonel Brizola (vejam aqui) há exatos 21 anos. E hoje vemos, uma vez mais, gente com alguma expressão nos mais diversos segmentos da sociedade gemendo "ohs" e "ahs" a cada carro queimado no asfalto, nítida expressão da reação da bandidagem que vem perdendo terreno com a implementação da política do Governo do Estado.

Essa escória NUNCA reclamou da violência com a veemência de hoje porque a violência estava praticamente restrita aos morros, às favelas, e fodam-se os pobres, os pobres que fiquem lá, que morram lá, que nos deixem em paz - assim pensa essa parcela da sociedade.

Quantas crianças eram impedidas de freqüentar a escola por conta do aparelhamento do tráfico nas favelas? Quantos pais e quantas mães temiam pela vida de seus filhos, entregues à própria sorte nas mãos sedutoras do dinheiro fácil oferecido pelo tráfico organizado? Quantos trabalhadores e quantas trabalhadoras passavam noites em claro em meio a tiroteios nas favelas? Quantos cadáveres eram desovados bem longe da terra dessa gente - Baixada Fluminense, para ficar num só exemplo - sem causar um suspiro de indignação?

Pois quero lhes dizer uma coisa: o projeto de segurança ora implantado terá efeitos a longo prazo. E mais...

O projeto de EDUCAÇÃO que Leonel Brizola implantou no Rio em 1982 - com 500 CIEPs espalhados pelo Estado - estaria surtindo efeitos agora, mais de 20 anos depois, com uma massa impressionante de crianças bem formadas e aptas ao ingresso no mercado formal de trabalho.

Foi essa mesma escumalha, essa mesma escória, essa mesma célula podre da sociedade que bradou contra os CIEPs.

Hoje, 28 anos depois, a medida é mais radical, infinitamente mais radical, para combater a violência que grassava onde os olhos dessa gente escrota não enxergava. As conseqüências? Infinitamente mais duras.

Mas é preciso progredir, ir em frente, não ceder nem à pressão da bandidagem e nem à pressão dessa classe média egoísta e dessa elite podre que infecta o Rio de Janeiro. Tampouco ceder à pressão da imprensa golpista que, não satisfeita com o que fez no curso das eleições, continua a fazer das suas para desestablizar o status quo de uma cidade que teima em reinventar seus caminhos em prol de uma vida de paz.

Os que têm medo, que procurem os psicotrópicos ou o psiquiatra, que leiam O GLOBO e escrevam suas cartas-de-merda destilando ódio.

Eu, neste específico ponto, apóio integralmente a política de segurança pública do Rio de Janeiro. E quero mais é ver o circo pegar fogo. Depois, como Fênix, e como sempre, renasceremos das cinzas, infinitamente melhores.

Até.