23.11.10

O GLOBO CONTRA O RIO

Não é novidade para ninguém que o jornal O GLOBO não gosta de pobre, não gosta do povo, não gosta da idéia de ver a cidade do jeito que ela é, cercada de morros por todos os lados, os morros e suas favelas, os do asfalto e os de lá de cima convivendo em harmonia, nada disso agrada ao jornalão carioca e a seu público-alvo, a classe média mais abjeta e rancorosa e a elite que, na contramão do Brasil, deu seus votos, em enxurradas, para o candidato não eleito da oposição.

Vamos por partes para que eu seja claro.

Não tenho, ainda, idéia 100% formada sobre as UPPs (unidades de polícia pacificadora) e seus efeitos, mas é inegável que para os moradores dos morros já atendidos pela política de segurança do Estado do Rio de Janeiro o troço é bilhete premiado. Com a chegada da polícia, e conseqüentemente do Estado, a vida dessa gente - como diz o samba do Guineto em parceria com Magalha - "aposto que está um colosso" (guardadas as devidas proporções, é claro, e se levarmos em conta como eram as coisas antes da chegada do Estado). Não convivem mais com o crime-organizado, com os traficantes, não transitam mais entre metralhadoras e fuzis. Isso é ponto pacífico.

Acontece que a cada ação, uma reação, embora especialistas em segurança pública, neste específico caso, ainda não afirmem que os últimos casos de violência na cidade estejam diretamente ligados à instalação das UPPs. É o que penso, mas não posso, por razões evidentes, dizer que se trata de uma verdade absoluta.

A bandidagem, posta pra correr das favelas, pode (eu disse pode) estar buscando alternativas, claro que pelo viés do crime (são bandidos, pô!) no asfalto. E que ninguém tenha, pelo amor de todos os deuses, a ilusão de que as UPPs (ou qualquer outra medida!) irão acabar com o tráfico (e nem é esse o objetivo de tal política). Se alguém me apontar um lugar no mundo onde não haja a possibilidade de se adquirir qualquer produto traficado, seja droga ou seja arma, eu repenso isso. Mas vamos em frente.

A que se deve, então - e por que tanta revolta esse troço me causa! - mais uma campanha sórdida do jornal O GLOBO contra o Rio de Janeiro? Volto ao primeiro parágrafo: ao ódio que têm de pobre, de favela, de povo na mais estrita acepção da palavra. Quem tem a idade que eu tenho bem lembra e sabe: Leonel de Moura Brizola tentou resolver o problema da educação no Estado com os CIEPs, passou a oferecer escola de qualidade para centenas de milhares de crianças pobres e deu-se o rebu. A classe média tinha nojo só de pensar que o filho de sua empregada doméstica estudava numa escola pública em tempo integral, com piscina, com dentistas, com alimentação adequada. O jornal O GLOBO foi a voz da escória e enquanto não viu fracassado o projeto educacional de Brizola - graças à ação criminosa de Carlos Alberto Direito, Secretário de Educação de Moreira Franco que fechou não-sei-quantas escolas - não sossegou (falei sobre isso, aqui).

A título de ilustração - não custa lembrar... - O GLOBO foi também contra a construção do Sambódromo, negando-se a transmitir o primeiro desfile da Passarela do Samba, outra monumental obra do velho caudilho, que precisou recorrer à Justiça para responder à altura no horário nobre do Jornal Nacional, reestabelecendo a verdade dos fatos, pois além da campanha sórdida contra o Sambódromo O GLOBO atribuiu a ele e às suas políticas um arrastão fabricado nas areias de Ipanema.

Pequena pausa: recomendo vivamente a leitura do trabalho ARRASTÃO MEDIÁTICO E RACISMO NO RIO DE JANEIRO, de autoria do Professor-Doutor Dalmir Francisco - aqui. Enfaticamente. Vamos em frente.

Daí O GLOBO recomeça sua campanha...    


As matérias que dão conta dos últimos casos de violência no Rio de Janeiro usam e abusam das mesmíssimas expressões de sempre, repetidas pelas estagiárias-de-redação (apud Nelson Rodrigues): "onda de violência", "ações terroristas", "arrastões em cadeia" e por aí. Os números que evidenciam, há muitos meses, queda nos números de crimes praticados no Estado não ganham nem nota de rodapé.

O faraó César Maia, rejeitado pela população do Estado para o cargo de Senador da República, traveste-se de Carlos Lacerda e, como um corvo, replica, todos os dias pela manhã, no twitter, as manchetes sensacionalistas do jornalão carioca.

A classe média e seus insuportáveis "pagadores de impostos" se descabelam, aumentam a dose dos psicotrópicos e os membros da elite, como aqueles primeiros, escrevem cartas indignadas para os jornais, pressionam os jornais dos quais são público-alvo e estamos aí diante de notícias mais-que-sensacionalistas a pespegar o medo na cabeça da população.

Essa gente quer o morro longe - o que é, evidentemente, impossível. Sendo impossível, quer o morro cercado, ainda que lá dentro exploda a violência e que a morte bata à porta de mães e pais trabalhadores, vítimas dos traficantes armados até os dentes. Querem, do morro, a empregada doméstica e o eletricista. O tocador da bateria que irá proporcionar-lhes o espetáculo do Carnaval, assistido dos camarotes regados a champagne e cocaína.

Essa gente tem pressa e não admite aguardar o médio e o longo prazo que medidas como as UPPs exige.

Essa gente é nojenta.

É asquerosa.

E jornais como O GLOBO, nojento e asqueroso, cumprem perfeitamente o papel de porta-voz dessa escória.

Risco de ser vítima de um ato de violência sofremos todos em todos os lugares do mundo: no Rio, em Nova Iorque, em Roma, em Paris, em Buenos Aires. O problema é que O GLOBO fica aqui. E O GLOBO odeia pobre. Odeia política em prol dos pobres. O que O GLOBO gosta é de incitar o ódio na população carioca, vide a nova empreitada do jornal, o canal de delação, o @ILEGALeDAI, no twitter.

Se você não é do Rio - e como recebi ligações de amigos de fora me perguntando sobre isso... - tenha uma certeza: o Rio de Janeiro está vivíssimo. E seguirá arrancando as flechas do peito do padroeiro, essas flechas cheias de veneno que insistem em cravar no peito da gente.

Até.

13 comentários:

mari disse...

Sem tirar nem pôr.

Christine disse...

Se alma gêmea existe, vc é a minha politicamente falando.
Sem tirar nem pôr. (2)

Diego Midlej disse...

Sem tirar nem pôr³
Excelente.
abços

Alexandre Porto disse...

Segundo Rodrigo Pimentel, um dos autores do livro Tropa de Elite, é misto de reação às UPPs e transferência de lideranças para presídios federais (promessa de Lula cumprida);

Completo comentário seu citando Cândido Mendes: "A impaciência de resultados é retórica privativa das elites de poder".

Acrescento. Principalmente daquelas que nada fizeram quando tiveram sua chance.

Blog do Pian disse...

Você é sempre muito bom com as palavras.

Só peço, sempre, o cuidado de não nos tornarmos tão intolerantes e apressados quanto aqueles que criticamos.

É preciso ser empático com a elite e dela cobrar mais paciência e, principalmente, consciência.

Viva o Rio e seu povo!

R.Pian

Unknown disse...

PHA disse a mesma coisa e publicou uma ótima entrevista com um sociólogo da UERJ:
http://www.conversaafiada.com.br/pig/2010/11/23/uma-analise-da-violencia-no-rio-antes-que-a-globo-destrua-o-rio/

"Na verdade, o que acontece na cidade é muito mais amplo e muito mais grave, mas as políticas públicas são desenvolvidas em função desses grandes eventos, que estão sempre vinculados à classe média alta ou às áreas mais nobres. A atenção depende basicamente do perfil das vítimas."

O Globo é a cloaca do Rio de Janeiro, é um jornaleco que presta um grande desserviço à população. Odeio esse grupo com todas as minhas forças. Eles é quem são ilegais!

implacavel disse...

Sem tirar nem pôr°

Bezerra disse...

Sempre que preciso renovar meu orgulho em ser carioca - em ser tijucano, sobretudo (afinal, porra, tive a honra de nascer na São Francisco Xavier, cacete!) -, é neste balcão em que me debruço.

Portanto, Edu, continue aguerrido, na luta contra os detratores de plantão, que eu tô contigo e não abro.

Por enquanto é só, camarada, que eu, cheio de Brahma na mente, preciso repor minhas energias para a próxima batalha!

Forte abraço!

AOS QUARENTA A MIL disse...

É uma luta árdua, fazer os esclarecimentos dos fatos e para isto serve a internet, agora realmente as Organizações Globo sempre prestaram um péssimo serviço a população, principalmente ao Rio de Janeiro.

Agora, é só conversar com qualquer trabalhador ou estudante de qualquer comunidade pacificada para ouvir em uma só voz, "o morro está uma maravilha!" Quantos amigos já dormiram em minha casa em Botafogo por não poder voltar para o morro depois da aula e quantos trabalhadores amigos meus, me pediram para avisar ao patrão que não podiam descer, pois o morro estava em guerra.

Em relação ao tráfico, a guerra é outra, ainda existem as esticas nos asfaltos que intensificaram com a perda de território, portanto é um trabalho de inteligência e não geográfico e social, muito menos de responsabilidade só do Rio de Janeiro. Não podemos ignorar que junto à polícia está subindo também a cidadania com serviços de qualidade, como luz, internet e outros e a cobrança de impostos está sendo feito igualmente a qualquer morador de outro canto da cidade.

É impressionante como um grupo de criminosos apoiado por alguns setores da imprensa, tenta desestabilizar as ações do Governo e de fato existem um bando de alienados preconceituosos falando merda, mas concordo com o Pian que se trata apenas de um grupo e não representa toda a classe média, tem muita gente com grana, engajada, sonhando com um país melhor e consciente que miséria não é bom para ninguém.

Precisamos como sociedade apoiar sempre e denunciar os boicotes destes, como você chama Edu, grupelhos.

Abração!

Dudu Santos disse...

Caro xará Edu,

Sou leitor assíduo desse botequim virtual, mas só hoje faço questão de comentar. Tô contigo e não abro.

Chega a ser indecente o que estão tentando fazer com a imagem da nossa cidade.

Não morro de amores pelo Sérgio Cabral. Muito pelo contrário. A política do caveirão chegou a ser criminosa em muitos momentos, e assim como você, não tenho opinião formada sobre a política das UPP´s . Apesar de achar que ela no mínimo tem que ser revista. Afinal, existem relatos de privação de direitos nas comunidades, como toque de recolher e proibição de bailes funk.

Porém não existe esse clima de guerra civil, terrorismo ou algo que o valha. Moro no Rocha, trabalho no Centro, vou e volto do trabalho, vou a feira no Meier, visito minha mãe em Campo Grande, vou beber na Tijuca, em Vila Isabel. Passo pelo Jacaré para ir fazer compras (a contragosto) com a esposa no Nova América. E não vejo esse clima de medo, não vejo pessoas assustadas. Vejo gente animada e bonita circulando por aí. Será que minha cidade é diferente da cidade do Globo. Na verdade é. Só que eles não tem coragem de dizer.

Abraços.

Unknown disse...

Caro Edu,
Sem tirar nem por tb!!!
Nunca morei em favela, mais tenho parentes proximos(avós, tios e primos) que são moradores da famosa Cidade de Deus, uma das primeiras a a ganharem a UPP. Por experiência própria posso dizer que a vida dessas pessoas mudou muito, e para melhor. Meu avô, portugues e dono do primeiro bar da região, sempre fica esperando os filhos e netos para o almoço de domingo. Infelizmente a 3, 4 anos atrás estava impossível visitar meus parentes devido a enorme presença de bandidos armados e aquela coisa absurda que acontece dentro da favela. A coisa chegou a um nível que tivemos que gradear o terraço da casa do meu Avô, pois ele estava sendo constantemente invadido por bandidos para se esconder, almoçar(usando a nossa mesa de ceia de natal!!!), dormir...
Com a Upp isso acabou, e a caso do Vô voltou a ser bastante frequentada pela família e não por bandidos...
É claro que alguma hora iria acontecer esses ataques que estão ocorrendo hj, mais como maneira de assustar, do que crimes bárbaros e tal...Mais para quem vivia aquela realidade, a coisa melhorou e muito!

Diogo Barros

ione disse...

Edu,
Pensamos exatamente igual em relação a determinadas coisas.
Mutatis mutandis, o meu exemplo é "mulherzinha": duas semanas atrás, a C&A lançou uma coleção em parceria com a marca carioca 'Maria Bonita Extra', com o relançamento de várias peças que fizeram muito sucesso na tal grife (de onde na década de 90 eu até comprava alguma coisa, mas depois passei a só olhar a vitrine), só que por um preço muito mais acessível - C&A! Pois bem, eu comprei algumas peças, entre elas uma estampada, que era do verão de dois ou três anos atrás, quando custava uns R$400, contra os R$89 que paguei na semana passada (na época eu gostei, mas não rolou pagar essa fortuna). Daí lendo uns blogues de moda que frequento, vi alguns comentários vomitivos do tipo 'a C&A matou a MBE', ou 'agora qualquer empregada doméstica vai usar a mesma estampa'. Caraca, Edu, que coisa mais repugnante! Eu usarei o meu e não terei nenhum problema em ver dezenas de pessoas com ele, porque afinal de contas é lindo, me vestiu bem, e mais do que tudo, não me obrigou a vender um rim pra pagar! E a propósito, que ótimo que mais pessoas tenham acesso a ele. Veja como pensam as elites, ou as que se acham elites, o pobre não pode ter acesso a bens de consumo legais, com estilo bacana, porque senão vulgarizam... É o mesmo raciocínio daquele camarada ao dizer que o $ gasto nos CIEPs era mal-empregado - onde já se viu, edicação integral, piscina, dentista com o $ do meu imposto? Como se o $ do imposto dele não retornasse na forma de despesas médicas e despesas com instrução, que ele abate do IRPF! E mais, as pessoas que criticam as cotas, muitas delas se beneficiaram de uma ajuda semelhante - eu, por exemplo, cursei Direito na UFRJ sem nenhuma contrapartida para o contribuinte, que pagou pela minha Universidade e pelos meus professores por cinco anos.
Bem, voltando ao assunto da C&A, de minha parte eu prefiro usar uma peça de roupa igual à da minha empregada do que igual à desse tipo de gente daqui de Brasília:
http://limobag.blogspot.com/2010/09/o-casamento-dos-20-milhoes-de-reais.html
Pelo menos a origem do meu $ e do $ da minha empregada eu conheço e sei que é líicita - nunca fomos mencionadas em operações 'Caixa de Pandora' e quetais!
Bjs

Claudia disse...

De uma carioca Brizolista para outro:

O artigo está perfeito!

Nosso grupo é grande, o Rio é maior do que essa gente e o bem há de triunfar mais uma vez.

C.